Sentença condena empresas a
indenização por dano moral e patrimonial em R$1.000,000,00, além de pensão
vitalícia e outros créditos.
(*) Luiz Salvador
A juíza do Trabalho, Dra. Cláudia
Reina, Titular da 22ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, em sentença prolatada
recentemente, em 28 dias do mês de SETEMBRO de 2012, reconhecendo a
culpabilidade empresarial pela ocorrência de gravíssimo acidente de trabalho
que vitimou trabalhador com cegueira irreversível, condena três empresas
responsáveis pelo infortúnio labora, em um milhão de reais, R$500.000,00 por
danos morais e outros R$500.000,00, por danos estéticos, além de pensão
vitalícia e outros créditos.
A Juíza do Trabalho, Dra. Cláudia
Reina, examina, ainda com propriedade a questão da diferença existente entre o
Direito Social e o Direito Comum, onde no Direito do Trabalho prevalece a
gratuidade de justiça e a prevalência dos princípios fundantes da razão de ser
do Direito do Trabalho, equilibrador das situações de desigualdades de partes,
entre o trabalhador e o empregador:
"O empregado tem a faculdade de optar pela instauração da
conciliação extrajudicial, subsistindo, portanto, o seu interesse jurídico de
ver o seu eventual direito ser reconhecido pelo Estado-Juiz, independentemente
da utilização daquela via. É que, diferentemente do direito comum, cuja
preocupação é a de preservar a igualdade jurídica entre os contratantes, o
Direito do Trabalho tem como única preocupação evitar que o contrato entre
pessoas com poder e capacidade econômica desiguais conduza a uma maior
desigualdade".
Em nosso entendimento, os
parâmetros legais utilizados pela Juíza do Trabalho, Dra. Cláudia Reina, para a
fixação da indenização repõe, com razoabilidade, os parâmetros legais que devem
ser observados pelo juízo ao fixar o valor indenizatório, para evitar-se as
costumeiras indenizações pífias que mais protegem o interesse patrimonialístico
que o dever de indenizar, pela extensão do dano ocasionado, pela
responsabilidade do agente causador do dano.
Nesse sentido, já escrevemos: “Dano moral. A indenização pífia contraria o
dever de indenizar à extensão do dano”
Leia a
íntegra da sentença.
22ª VARA
DO TRABALHO DO RIO DE JANEIRO
Aos 28 dias do mês de SETEMBRO de 2012, às 14:00 horas ,
reuniu-se a 22ª Vara do Trabalho do Rio
de Janeiro em sua
sede e sob
a presidência da MM. Juíza do Trabalho Dra.
CLAUDIA REGINA REINA PINHEIRO , para JULGAMENTO da Reclamação Trabalhista proposta
por SAMUEL LIMA DA SILVA em face de TRANSCHEMICALS
SYSTEMS LTDA. – 1ª Reclamada, SUMATEX PRODUTOS QUÍMICOS LTDA. – 2ª Reclamada, e
FERREIRA SANTOS ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA. (sucessora de BIO BRILHO
QUÍMICA LTDA.) – 3ª Reclamada.
Prejudicada a tentativa final de conciliação .
DECISÃO
I - RELATÓRIO
SAMUEL LIMA DA SILVA, qualificado às fls. 02
ajuíza ação trabalhista em
face de TRANSCHEMICALS SYSTEMS LTDA. –
1ª Reclamada, SUMATEX PRODUTOS QUÍMICOS LTDA. – 2ª Reclamada, e BIO BRILHO
QUÍMICA LTDA. – 3ª Reclamada em razão de o autor, motorista da 1ª reclamada - TRANSCHEMICALS SYSTEMS LTDA. – ter sofrido
acidente de trabalho que culminou com a perda total de sua visão enquanto fazia
entrega de carga de hidróxido de sódio, fornecido pela 2ª reclamada - SUMATEX
PRODUTOS QUÍMICOS LTDA..
Ressalte-se que o informante afirma ter
avisado a ré que o tanque que armazenava a soda cáustica não ensejava aos
trabalhadores que o manuseavam o isolamento necessário para com a substância de
alto grau de periculosidade, soda cáustica. Em resumo: havia insegurança da
atividade realizada.
Requer o autor pelos
fatos e fundamentos
expostos na exordial, as seguintes parcelas :
indenização por acidente
de trabalho , dano moral e outras.
Conciliação inicial
rejeitada.
Contestações das Rés, às fls. 165 e
seguintes, suscitando ilegitimidade passiva e requerendo a improcedência
dos pedidos , tendo em
vista os fatos
impeditivos, extintivos e modificativos que sustentam.
Na audiência
de instrução , fls. 227/228, foi colhido
depoimento pessoal do reclamante.
Produzida prova técnica, laudo nas fls.
397/405.
Produziram as partes
razões finais
orais , permanecendo inconciliáveis .
Relatados,
vistos e examinados.
II
- FUNDAMENTAÇÃO
I)
DAS
QUESTÕES PROCESSUAIS
1)
MISSÃO DE CONCILIAÇÃO
PRÉVIA
O instituto da
conciliação prévia não pode impedir o acesso ao judiciário, bem como não pode
traduzir em condição indispensável da futura apreciação pelo Poder Judiciário. Sobretudo
se for considerado o caráter tuitivo das normas de proteção ao trabalho.
O empregado tem a
faculdade de optar pela instauração da conciliação extrajudicial, subsistindo,
portanto, o seu interesse jurídico de ver o seu eventual direito ser
reconhecido pelo Estado-Juiz, independentemente da utilização daquela via. É que, diferentemente do direito comum, cuja
preocupação é a de preservar a igualdade jurídica entre os contratantes, o
Direito do Trabalho tem como única preocupação evitar que o contrato entre pessoas
com poder e capacidade econômica desiguais conduza a uma maior desigualdade.
A realidade tem
demonstrado que esse propósito só tem sido alcançado mediante a atuação efetiva
dos órgãos jurisdicionais. A conciliação
prévia, pelo menos no estágio atual em que o País se encontra, não pode ser
considerada como condição da ação trabalhista. Ao se tornar a conciliação um
requisito do exercício do direito de ação, é desfavorecer a quem se pretende
proteger e atender a finalidade do capital, entregando o trabalhador brasileiro
à sua própria sorte.
O
credor (autor da demanda) precisa ter a vontade de se submeter a uma tentativa
de solução conciliatória. Ele não está obrigado a fazer o acordo (CF, 5º,
II, da CFRB/88), nem mesmo a negociá-lo. O credor tem o direito subjetivo de
tentar impor ao devedor a integralidade de sua pretensão.
Não foi, pois, sem
motivo, que o legislador não cominou a falta de tentativa de conciliação
prévia. O legislador disse que qualquer demanda será submetida à Comissão, mas
não especificou a consequência material de não sê-la. Isto se explica não como
um defeito da lei, mas como uma fórmula que possibilitou a aprovação da lei. Se
o legislador tivesse grafado a obrigatoriedade, estaria, evidentemente,
encurralado pelo vício de inconstitucionalidade (CF, 5º, XXXV).
Como não existe
cominação expressa na lei — e nenhuma cominação poderá ser presumida pelo
intérprete! —, é lícito concluir que o credor trabalhista pode encaminhar a sua
demanda à Comissão de Conciliação ou ajuizar ação trabalhista na forma do
artigo 5º, XXXV, da CFRB/88.
Ademais a
possibilidade do termo de conciliação conter cláusulas que importem em renúncia
dos direitos contemplados pela CFRB/88 é um dos motivos pelo qual o instituto
da conciliação prévia não pode impedir o acesso ao Poder Judiciário, bem como
não pode traduzir em condição indispensável da futura apreciação pelo Poder
Judiciário. Sobretudo se for considerado o caráter tuitivo das normas de proteção
ao trabalho.
O parágrafo único
do art. 625-E, da CLT, também fez um imbróglio, misturando várias matérias em
uma mesma disposição legal. Destaco, em primeiro lugar, que a lei atribui “a esse termo de conciliação” eficácia
liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas.
Contudo, ele (o termo) só valerá como quitação apenas em relação àquilo que foi
postulado pelo empregado ou pelo empregador, conforme art. 940 do Código Civil
e §2º do art. 477 da CLT e, não geral, como pretende o legislador.
Consequentemente,
ainda que não haja a ressalva, todo e qualquer direito que não tenha sido abrangido
pela conciliação subsistirá.
Data vênia, não
tem qualquer valor uma quitação geral em relação ao contrato de trabalho
extinto, “para mais nada reclamar, seja a que título for”, como se vê por
aí. Além do mais, a lei é clara ao
estabelecer que há uma correspondência entre o pedido e a competência
conciliadora da Comissão, conforme se depreende da leitura do art. 625-D, §3º
da CLT.
Neste sentido, a
jurisprudência do STF:
“Decisão:
Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por maioria e nos termos do voto do
Senhor Ministro Marco Aurélio, que redigirá o acórdão, deferiu parcialmente a
cautelar para dar interpretação conforme a Constituição Federal relativamente
ao art. 625-D, introduzido pelo art. 1º da Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de
2000, vencidos os Senhores Ministros Relator e Cezar Peluso. Não participaram
da votação o Senhor Ministro Menezes Direito e a Senhora Ministra Ellen Gracie
por sucederem aos Senhores Ministros Sepúlveda Pertence e Octavio Gallotti.
Ausentes o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente), em representação do
Tribunal no exterior, e o Senhor Ministro Celso de Mello, licenciado (art. 72,
inciso II, da Lei Complementar nº 35/1979 – LOMAN). Presidiu o julgamento o
Senhor Ministro Cezar Peluso (Vice-Presidente). Plenário, 13.05.2009.” (ADI
2139 e 2160).
2)
LEGITIMIDADE AD
CAUSAM PASSIVA
A legitimidade
para agir é a
titularidade do direito de ação que não se confunde com
a titularidade da pretensão material ,
nem com
a titularidade da pretensão processual, nem com a legitimação para contestar , e também não se confunde com
a efetiva existência das razões de fato
e de direito produzidas em juízo pelos litigantes .
“Coisa totalmente
diferente da legitimação
passiva é a legitimação
para contestar , isto é, para defender-se,
da qual dispõe o réu
pelo simples fato de ter sido chamado
a juízo .
A
legitimação para
agir é, pois, em
resumo , a pertinência
subjetiva da ação ,
isto é, a identidade
entre quem
propôs a ação e aquele
que , relativamente
à lesão de um
direito próprio
(que afirma existente), poderá pretender para si o provimento
de tutela jurisdicional pedido com referência àquele
que foi chamado em
juízo ” (Enrico
Tullio Liebman - Manual de Direito Processual Civil
- Forense ). Destarte, a legitimação para agir deve ser avaliada no plano lógico e
abstrato (teoria do direito
abstrato de agir ).
In casu, não há que se falar em ilegitimidade ad
causam passiva , uma vez que as 1ª, 2ª e 3ª reclamadas foram incluídas na presente ação através do instituto
da terceirização, sendo que este fato basta para legitimá‑las a
figurarem no polo passivo da relação jurídica
processual, não importando se são ou não as
verdadeiras devedoras, pois esta é matéria
ligada ao mérito
e com ele
será decidido .
Rejeita-se a preliminar .
3)
INÉPCIA
DA PETIÇAO INICIAL
Reputa-se inepta a inicial quando
a mesma não
preenche os supostos legais exigíveis
pelo art. 840, §1º, da CLT, ou
quando lhe
falte pedido ou
causa de pedir ; da narração dos fatos
não decorrer logicamente a conclusão ; quando o pedido
for juridicamente impossível ou quando
contiver pedidos incompatíveis
entre si
- artigo 295, parágrafo
único do CPC.
In
casu, a petição inicial preenche os requisitos
dos artigos 840 §1º da CLT e 295, parágrafo único do
CPC.
Rejeita-se. Reporto-me
ao decidido na ata de fl. 102, pelo ilustre Magistrado, outrora Titular deste
Juízo, Dr. Marcel Bispo, pois vai ao encontro do entendimento desta Magistrada.
II)
MÉRITO
1)
PRECRIÇÃO - PRAZO PRESCRICIONAL NAS AÇÕES
POR INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS APÓS A EC/45/04.
Não
se pode resolver de forma simplista a questão da prescrição em razão de mais de
um entendimento adotado.
Registre-se
que em recente decisão da segunda turma do C. TST nos autos do Processo
RR-424/2001-069-09-00.5 em caso de empregado acometido de Lesão por Esforço
Repetitivo (LER), que ficou afastado do trabalho por diversas ocasiões, o tempo
de afastamento suspende a prescrição conforme decisão prolatada.
Consoante o ministro
José Simpliciano Fernandes a doença profissional, equiparada a acidente de
trabalho, é causa de suspensão da eficácia do contrato de emprego. O artigo 476
da CLT estabelece que, em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o
empregado é considerado em licença não remunerada durante o prazo desse
benefício. A mesma regra é encontrada na legislação previdenciária, nos artigos
63 da Lei 8.213/91 e 3º do Decreto 3.048/99. Portanto, durante o afastamento do
empregado, os 15 primeiros dias classificam-se como interrupção do contrato de
trabalho e são remunerados pelo empregador. A partir de então, a interrupção
transforma-se em suspensão, e o ônus passa a ser da Previdência Social:
"Estando suspenso o contrato
de trabalho, em virtude de o empregado haver sido acometido de doença
profissional, com percepção de auxílio - doença, opera-se igualmente a
suspensão do fluxo do prazo prescricional”. (Fonte – Noticias do C. TST.
27/06/2006 – 2ª Turma – Relator Ministro José Simpliciano Fernandes -
RR-424/2001-069-09-00.5 -CEF)
Há mais de um entendimento
sobre a prescrição. Dentre eles, o entendimento respaldado pela doutrina de que
são imprescritíveis os direitos da personalidade. Francisco das Chagas Lima
Filho defende em síntese:
"... A ação seria imprescritível dado ao
fato de tratar-se de ação de reparação de danos a direitos da personalidade
que, por irrenunciáveis, o seu exercício não está sujeito a prescrição, face
aos termos do que disposto no art. 11 do Código Civil e pela natureza do bem
envolvido, ou seja, a personalidade, a dignidade do ser humano. A ação de reparação
de danos morais decorrentes de acidente do trabalho ou de doença profissional –
equiparada a acidente de trabalho por força de expressa disposição legal – tem
por objetivo indenizar o trabalhador pelos danos à saúde, à vida, à integridade
física ou mental, enfim direitos ligados à personalidade e à dignidade do ser
humano. Essa categoria de direitos fundamentais constitucionalmente é garantida
ao ser humano enquanto pessoa e não porque ostenta a condição de cidadão
trabalhador ou empregado. Por conseguinte de natureza indisponível, não podendo
o seu titular a eles renunciar e sendo irrenunciáveis o são por conseqüência,
imprescritíveis (...) não se trata, pois, de direito de natureza trabalhista,
nem tampouco civil, mas de direito de índole fundamental que diz respeito à
dignidade humana. Portanto, imprescritível, pois a dignidade humana sendo "aquela
qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do
mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando,
neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a
pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como
venham a lhe garantir condições existenciais mínimas para uma vida saudável,
além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos
destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.
Não é subtraída da tutela constitucional apenas porque aquele que sofreu a
violação não reclamou, muitas vezes por circunstâncias alheias à sua vontade,
dentro de certo espaço de tempo. Não se perde a dignidade em razão do decurso
do tempo, evidentemente”. (sic – Prescrição da Ação de Reparação de Danos
Morais decorrentes de Acidentes do Trabalho)
Os direitos da personalidade são
imprescritíveis para esta corrente.
Portanto, ainda que inerte o titular, este pode reivindicar a
efetivação. A possibilidade de exercício
dos direitos da personalidade não prescreve. Contudo, conforme entendimento,
depois de determinado lapso temporal a legislação prescreve a pretensão à
reparação dos danos causados a esses direitos. É o caso do pedido de reparação
por danos morais em razão de comprovado acidente do trabalho.
Em
relação ao prazo prescricional das pretensões relativas aos pedidos de
indenização por danos moral, material e estético decorrentes de acidentes de
trabalho na Justiça do Trabalho em razão da EC 45/04 a questão é controvertida.
Alguns defendem que o prazo é o referente aos créditos trabalhistas, ou seja,
de cinco anos durante o contrato de trabalho, até dois após a extinção deste
(CF, art. 7º, inciso XXIX). Outros sustentam a aplicação do prazo previsto no
Código Civil de vinte anos na vigência do Código de 1916 (art. 177) e de três
ou de dez anos na vigência do Código de 2002 (arts. 205 e 206, § 3º, inciso V).
Neste
diapasão, temos aqueles que sustentam em relação aos processos transferidos
para a Justiça do Trabalho, sem sentença de mérito antes da EC 45/04 emitida
pela Justiça Comum e transferida para Justiça do Trabalho, a prescrição aplicada
é a do Código Civil. Porém, quando a ação é ajuizada após a Emenda
Constitucional n. 45/04, seja na Justiça Comum ou do Trabalho, a prescrição é a
prevista no artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição Federa l/1988.
Data
vênia, a prescrição é um instituto de direito material, enquanto que a
competência pertence ao direito processual. Consequentemente não se confundem. Portanto, o reconhecimento da competência da
Justiça do Trabalho para apreciar e julgar pedidos de reparação decorrentes de
acidente do trabalho não tem o condão de afastar o prazo prescricional previsto
no Código Civil. Com todo respeito aos entendimentos contrários, mas não é a
competência que define o prazo prescricional a ser aplicado e sim a natureza da
pretensão pleiteada em juízo, ou seja, a natureza do direito material,
independente do órgão do Poder Judiciário competente para apreciá-lo. Ao se pensar de outra forma estaríamos
mudando a natureza do direito material postulado em juízo em razão da mudança
de competência.
Ainda
se não bastasse, no Direito do Trabalho, aplica-se o princípio da norma mais
favorável ao trabalhador.
No
mesmo sentido, o C. TST reconheceu a prescrição vintenária do Código Civil de
1916, pois o prazo prescricional é o do direito civil, porque o direito
pleiteado não tem natureza trabalhista:
"INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PRESCRIÇÃO. Observada a natureza civil do pedido de reparação por danos morais,
pode-se concluir que a indenização deferida a tal título em lide cujo trâmite
se deu na Justiça do Trabalho, não constitui crédito trabalhista, mas crédito
de natureza civil resultante de ato praticado no curso da relação de trabalho.
Assim, ainda que justificada a competência desta Especializada para processar a
lide não resulta daí, automaticamente, a incidência da prescrição trabalhista.
A circunstância de o fato gerador do crédito de natureza civil ter ocorrido na
vigência do contrato de trabalho, e decorrer da prática de ato calunioso ou
desonroso praticado por empregador contra trabalhador não transmuda a natureza
do direito, uma vez que o dano moral se caracteriza pela projeção de um gravame
na esfera da honra e da imagem do indivíduo, transcendendo os limites da
condição de trabalhador do ofendido. Dessa forma, aplica-se, na hipótese, o
prazo prescricional de 20 anos previsto no artigo 177 do Código Civil, em
observância ao art. 2028 do novo Código Civil Brasileiro, e não o previsto no
ordenamento jurídico-trabalhista, consagrado no artigo 7º, XXIX, da
Constituição Federal. Embargos conhecidos e providos" (PROC. TST-E-RR -
08871/2002-900-02-00.4; SDI-I, Relator Ministro Lélio Bentes Corrêa, DJU de
05/03/2004).
Conclui-se
que se o acidente de trabalho é anterior, ocorrido em 27/06/2000, ao Código
Civil de 2.002, o prazo prescricional é de 20 anos. Se o acidente de trabalho é posterior ao
Código Civil de 2.002, a
prescrição será vintenária se tiver ocorrido mais da metade do tempo previsto
para a prescrição anterior, ou seja, se quando da lesão e ajuizamento da ação
já tiver transcorrido mais de dez anos do lapso temporal que fixava a
prescrição anterior. Trata-se da regra
de transição prevista no artigo 2.028 do CCB/2002. Se inexistir a fluência de mais
da metade do prazo previsto no regime civil anterior, a prescrição civil será a
decenal ou trienal, pois também existe a controvérsia quanto ao prazo
prescricional a ser aplicado, ou seja, se é de três ou de dez anos após a vigência
do Código Civil de 2002 (arts. 205 e 206, § 3º, inciso V).
Com
a alteração nos prazos de prescrição pelo Código Civil de 2002 para dez anos
quando a lei não haja fixado prazo menor (art. 205) e de três anos para as
pretensões de reparação civil (art. 206, § 3º, inciso V), a situação torna-se
controvertida. Para aqueles que adotam a tese de que estamos tratando de
direitos fundamentais constitucionalizados decorrentes da violação dos direitos
da personalidade a prescrição é decenal. Para aqueles que defendem que se trata
de mera reparação de natureza civil a prescrição é trienal.
Neste
sentido adoto o entendimento de Raimundo Simão de Melo
“Com efeito, o prazo
prescricional a ser aplicado, no caso, deve ser o do Código Civil, de vinte
anos durante a vigência do Código Civil de 1916. Na vigência do atual Código,
surge, então, uma indagação: se o prazo é de 10 anos (art. 205) ou de 3 (art.
206, § 3º, inciso V). Este último prazo refere-se expressamente à pretensão de
reparação civil e o primeiro à reparação de danos quando a lei não haja fixado
prazo menor ou, de outra forma, quando inexistente previsão legal expressa
sobre o assunto. É exatamente a hipótese vertente. Como já aludimos, não se
está a tratar de um ‘crédito trabalhista’. Igualmente não se cuida de uma
pretensão de reparação civil stricto sensu, envolvendo dano patrimonial
material. Estamos a falar de direitos humanos fundamentais decorrentes da
violação dos direitos da personalidade (integridade física e psíquica,
intimidade, vida privada, dor, vergonha, honra, imagem das pessoas etc.), a
quem a Constituição Federal, pela primeira vez, assegurou o direito à
indenização pelo dano material ou moral pertinente. Como é certo, os direitos
da personalidade têm como uma de suas características a imprescritibilidade.
Não se trata de meros direitos trabalhistas ou civis, no sentido estrito, mas
de direitos de índole constitucional-fundamental, considerados como cláusulas
pétreas protegidas até mesmo contra o legislador constituinte (CF, art. 60, §
4º, inciso IV). Os danos decorrentes, no caso, são pessoais, não se lhe
aplicando, por isso, o prazo de 3 anos (CC, art. 206, § 3º, inciso V), o qual
se refere às reparações civis inerentes aos danos causados ao patrimônio
material. O dano pessoal, ao contrário, atinge a pessoa humana nas suas diversas
facetas.
No
caso dos acidentes de trabalho, por exemplo, os danos causados (materiais,
morais e estéticos) são pessoais, com prejuízo à vida, à saúde física e/ou
psíquica, à imagem, à intimidade etc. do cidadão trabalhador, porquanto assegura
a Constituição Federal, como fundamentos da República Federativa do Brasil e da
livre iniciativa, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho,
o trabalho com qualidade e o respeito ao meio ambiente (arts. 1º e 170), além
de assegurar a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de
saúde, higiene e segurança (art. 7º, inciso XXIII).
Portanto,
se não se trata de direito de natureza trabalhista e nem civil e, como não
existe qualquer dispositivo legal regulando de outra forma o prazo de
prescrição para as pretensões decorrentes dos danos à pessoa (moral, material e
estético), por exclusão aplica-se o prazo geral de 10 anos, como previsto no
artigo 205 do Código Civil. A norma civil está sendo aplicada, repita-se, não
porque se trate de uma pretensão de reparação civil no sentido estrito, mas
porque é a lei civil que socorre nos casos de omissão regulatória sobre a
prescrição no Direito brasileiro, ou seja, quando não há prazo expresso de
prescrição sobre determinado dano, aplica-se o geral, de 10, previsto no artigo
205 do CC. (...).
Do
quanto exposto conclui-se que a reparação por danos pessoais (moral, material e
estético) constitui direito humano fundamental de índole constitucional e não
mero direito de natureza trabalhista ou civil. Desse modo, por inexistir norma
expressa sobre o prazo de prescrição das respectivas pretensões, aplicam-se
subsidiariamente os prazos previstos na lei civil: vinte anos para as ofensas
ocorridas até 09/01/2003 (CC de 1916, art. 177) e 10 para aquelas perpetradas a
partir de 10/01/2003 (CC de 2002, art. 205). (sic – Prescrição do dano moral no
Direito do Trabalho – Um novo enfoque -grifei)”
Tendo
em vista que o acidente do trabalho ocorreu em 27/06/2000 (anterior ao
CCB/2002), fato incontroverso, a prescrição é vintenária.
Rejeito a prescrição.
2) DO ACIDENTE
DO TRABALHO
O
autor relata que era motorista da 1ª reclamada - TRANSCHEMICALS SYSTEMS LTDA.– e por tal motivo em 27/06/2000, dia do
acidente, fazia entrega de carga de hidróxido de sódio, fornecido pela 2ª
reclamada - SUMATEX PRODUTOS QUÍMICOS LTDA. – tendo como destinatária a 3ª
reclamada - FERREIRA SANTOS ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA. (sucessora de
BIO BRILHO QUÍMICA LTDA.) -.
Narra, outrossim, que o tanque que armazenava
a soda cáustica não ensejava aos trabalhadores que o manuseavam o isolamento
necessário para com a substância de alto grau de periculosidade.
Ressalte-se que o autor informa ter avisado à
ré quanto à insegurança da atividade realizada.
O
autor ao realizar a atividade descrita alhures fora vítima de acidente do
trabalho INCONTROVERSO no bojo dos autos, que consistiu na descarga do produto
em sua vista, não sendo, portanto, eficaz o EPI – óculos – utilizado, ocasionando
assim a perda total definitiva da visão dos dois olhos, consoante laudo de fl. 397/405.
A
primeira reclamada - TRANSCHEMICALS SYSTEMS LTDA. - contesta a partir de fl. 165 do presente feito, sustentando ter havido
negligência do obreiro no manuseio do hidróxido de sódio.
A segunda reclamada - SUMATEX PRODUTOS
QUÍMICOS LTDA. – defende a tese de ter ocorrido culpa exclusiva da vítima (fl.
168-180).
FERREIRA SANTOS ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES
LTDA. (sucessora de BIO BRILHO QUÍMICA LTDA.) – 3ª reclamada – contesta, a
partir de fl. 350 do presente feito, sustentando ter havido negligência do
obreiro no manuseio do hidróxido de sódio. Sustenta, outrossim, a tese de culpa
exclusiva da vítima e o consequente enquadramento do caso em tela como de
responsabilidade civil subjetiva.
Sem razão as reclamadas o laudo da ilustre expert do Juízo de folha 398 e seguintes
é elucidativo.
O acidente com hidróxido de sódio que
ocasionou a perda total da visão do reclamante foi em serviço.
O laudo em nada se coaduna com a tese das
reclamadas, afirmando por diversas vezes em respostas aos quesitos 2, 3 e 4,
que não se pode falar em culpa exclusiva e concorrente da vítima.
Comprovado por meio do laudo de fl. 403 e
seguintes que o autor no momento do acidente usava EPI, no entanto, o EPI não
foi suficiente para evitar tamanho prejuízo ante os riscos inegáveis do contato
da soda cáustica com o corpo humano. Na hipótese, verifica-se que não existiram quaisquer medidas efetivas de
proteção ao trabalho de alto risco.
In casu, não houve sequer a
valorização do trabalho humano.
O caput
do art. 170 da CRFB/88 dispõe in verbis:
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização
do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios: ...”
Infere-se que a proteção do
trabalhador na vertente – “valorização do
trabalho humano” - tem matiz constitucional, com escopo de não permitir
jamais a “coisificação” do ser humano por meio de sua submissão irrestrita aos
ditames do empregador, pois de maneira oblíqua se estaria afastando a
observância do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, norma central de nossa
Carta Magna.
O contrato de trabalho já contém a cláusula
de garantia de segurança, uma vez que o ordenamento jurídico constitucional
determina como direito fundamental o direito à vida e a integridade física e
mental.
Portanto é dever constitucional do empregador
zelar pela vida, saúde física e mental, higiene e ambiente de trabalho saudável
dos seus trabalhadores com total diligência, para que o empregado possa desfrutar
das mesmas condições de saúde de quando fora admitido.
Neste sentido também o preceituado no art. 19
§1º da Lei 8.213/91, in verbis:
“Art. 19. Acidente
do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou
pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11
desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte
ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
§ 1º A
empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de
proteção e segurança da saúde do trabalhador.
§
2º Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de
cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.
§ 3º É
dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação
a executar e do produto a manipular.
§ 4º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social fiscalizará e
os sindicatos e entidades representativas de classe acompanharão o fiel
cumprimento do disposto nos parágrafos anteriores, conforme dispuser o
Regulamento”.
Não houve qualquer indício de que o acidente
ocorreu por fato exclusivo ou concorrente da vítima, o que faria desaparecer a
relação de causa e efeito entre o ato do agente causador do dano e o enorme
prejuízo na capacidade laboral sofrido pelo autor.
As atitudes negligentes das empresas afastam
as alegações das rés de qualquer neutralização das responsabilidades.
As atividades perigosas, como o transporte de
carga de notável potencialidade danosa, em especial, no caso em análise, dano
irreparável à saúde do obreiro que lhes presta serviços, hoje completamente cego
ante o acidente do trabalho envolvendo a soda cáustica, atraem para si a
responsabilidade objetiva.
Neste sentido, as lições do magistrado
Claudio Brandão em sua obra Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do
Empregador, 4ª ed. pág. 252, afirmando que:
“Trata-se, sem dúvida, de cláusula geral
colocada propositadamente pelo legislador para tornar desnecessária a edição de
regras especiais e casuísticas para abarcar cada hipótese em que pudesse restar
evidenciado risco em função da atividade realizada, dando o Código Civil um
largo passo para atender ao anseio pela reparação dos danos, que tem
sobrepujado às resistências à teoria objetiva. Reconheceu espectro próprio de
incidência à teoria objetiva da responsabilidade civil.”
Afastada resta a aplicação da tese da
Responsabilidade Civil Subjetiva, ao caso concreto.
Não é demais salientar
algumas características da soda cáustica e seus efeitos sobre a saúde humana,
consoante explicita René Mendes em sua obra Patologia do Trabalho, 2ª edição,
2005:
“...O hidróxido de sódio é
altamente corrosivo, irrita fortemente: pele, olhos e membranas mucosas. Um dos
maiores riscos da exposição ao hidróxido de sódio na forma sólida ou na forma de soluções concentradas
é a destruição, por corrosão, de tecidos.
No que tange ao contato com os olhos pode
causar desintegração e feridas no epitélio corneano e conjuntival, opacificação
de córnea, edema importante e ulcerações. O
contato com a pele com soluções a
25% e 50% provoca sensação de irritação em 3 min, o que não ocorre com solução
a 4% depois de várias horas.
Ademais, soluções mais
concentradas em contato com a pele provocam queimaduras que podem evoluir para
ulcerações, se não removidas rapidamente. A
exposição a poeiras ou névoas pode causar queimaduras de pele com perda
temporária de pêlos. A inalação de poeiras ou névoas, dependendo da intensidade
da exposição, pode causar desde irritação das narinas (em níveis de Zmg/m3) até
pneumonite grave.
Além disso, pode causar doença obstrutiva
de vias aéreas em trabalhadores com exposição crônica a névoas de hidróxido de
sódio. A ingestão produz corrosão do trato digestivo alto (lábios, boca,
língua, faringe, esôfago e estômago), dor
abdominal intensa, náuseas e vômitos.
Os casos não fatais de ingestão podem
desenvolver carcinoma de células escamosas do esôfago após de um período de
latência de 12 a
42 anos após a ingestão. Estes cânceres são considerados
seqüelas da destruição
tecidual e não são por efeito carcinogênico direto do hidróxido de sódio. O TLV-C
da ACGIH de 200 I é de Zmg/m3. ...”
Afirma ainda o referido
autor em sua mesma obra sobre as conseqüências da queimadura com soda cáustica
sobre o corpo humano tal qual é o caso dos autos, in verbis:
“...
QUEIMADURAS
Por ácidos e álcalis são geralmente
profundas e sua gravidade é diretamente proporcional à
concentração, toxicidade e tempo de contato
com o agente. Alguns agentes causadores de
queimaduras ocupacionais em nosso meio: concreto, cimento úmido
mais atrito, hidróxido de sódio (NaOH), ácido
sulfúrico (H2SO 4), ácido fluorídrico (HF), fenóis e
sais quaternários de amônio. A eletricidade
pode causar queimaduras leves, moderadas e graves. A gravidade irá depender de
vários fatores tais como voltagem e intensidade
da corrente, tempo de contato, espessura e
umidade da pele. Os locais de entrada e saída da
corrente são geralmente os mais afetados. O tratamento das queimaduras pode
variar de acordo com o agente que a produziu, todavia
as queimaduras extensas e mais graves devem ser tratadas em serviços
especializados. As queimaduras podem ser medidas através da regra dos nove ou
regra de Pulasky e Tenisson (Ali, 1999). É uma regra muito útil em dermatologia
ocupacional, pois nos permite quantificar a área de pele comprometida, seja
pela queimadura, ou discromia ou área eczematizada ou qualquer outro
comprometimento da pele. Através desse método podemos
conhecer a extensão da superfície corporal comprometida. Em relatórios, ou
laudos periciais isto é muito útil, pois permite expressar a extensão da área
comprometida. O trabalho em ambiente quente pode causar em trabalhadores
suscetíveis várias dermatoses, tais como: miliária, eritema ab-igne, intertrigo, urticária pelo
calor (DiBeneditto e Worobec, 1985)...”
Verifica-se,
portanto, o efeito extremamente prejudicial à saúde causado pelo hidróxido de
sódio, que pode ser inclusive fatal.
Tendo
em vista o alto grau de periculosidade da substância transportada cujo acidente
pode ser fatal, cabe às empresas rés tomarem todas as precauções quanto às normas
de segurança no transporte, movimentação e manuseio da carga. In casu, o efeito causado no autor foi a
cegueira irreversível, infortúnio inquantificável.
A
perda da visão inelutavelmente ocasiona o fim de muitos prazeres ao autor, tais
quais, apenas para exemplificar: ver o por do sol, ver a face de um neto, o
crescimento de um filho, um jogo de futebol na televisão. Não há como enumerar,
além das limitações físicas e muitas vezes psicológicas, conforme o próprio
laudo pericial (fl. 397 e seguintes) indica que o reclamante ainda possui
dificuldade significativa a se adaptar à sua nova condição, a saber, a de
deficiente visual completo.
Neste
sentido a Jurisprudência sedimentada há tempos, in verbis:
“ACIDENTE
DO TRABALHO. CEGUEIRA TOTAL. NECESSIDADE DO ACOMPANHAMENTO DE OUTRA PESSOA.
PERCENTUAL DE 25% (VINTE E CINCO POR CENTO) PREVISTO NO PAR.3o., DO ART.
5o., DA LEI ACIDENTÁRIA. OS VALORES A SEREM PAGOS NÃO PODEM SER
INFERIORES AO MÍNIMO LEGAL. APLICAÇÃO DO PAR.7o., DO ART. 5o., DA LAT.
RECOMPOSIÇÃO DO BENEFÍCIO DETERMINADO, RESPEITA A PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL.
O acidentado que sofre cegueira total faz jus
ao acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) nos proventos, considerando
necessitar permanentemente da assistência de outra pessoa, a teor do disposto
no art. 5o., par.3o., da Lei Acidentária. Por outro lado, não pode perceber o
beneficiário proventos inferiores ao mínimo legal. As parcelas vencidas deverão
ser pagas, a partir da verificação da prescrição qüinqüenal. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. Sendo a sentença, em ação acidentária, condenatória, os
honorários devem ser fixados conforme disposto no art. 20, par.3o., do CPC,
no caso em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a sentença, mais
12 (doze) vincendas. Sentença confirmada.
Processo:
AC 514101 SC 1988.051410-1 Relator (a): Claudio Marques Julgamento: 22/10/1992
Órgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Comercial Publicação: DJJ: 8.623.
DATA: 16/11/92. PAG: 08. Parte(s): Apelante: Instituto Nacional do Seguro
Social - INSS
Apelado: Manoel Rocha)”.
Apelado: Manoel Rocha)”.
Ainda
se não bastasse, aplica-se na hipótese o art. 927, parágrafo único do Código Civil
de 2002, uma vez se que trata de responsabilidade objetiva no caso em tela, uma
vez que a atividade empresarial exercida pelas três reclamadas importa em risco
inerente, conforme leciona o ilustre doutrinador Sérgio Cavalieri Filho:
“...
Temos indicado como critério identificador da atividade
de risco a distinção que se
faz na doutrina entre risco inerente e risco criado. O
primeiro, risco inerente, é
aquele intrinsicamente atado à própria
natureza da atividade, à sua qualidade ou
modo de realização, de tal forma que não se pode exercer essa atividade sem arrostar
certos riscos. Embora o perigo ou risco seja elemento
ligado a certas atividades, a lei não proíbe a sua realização, pelo contrário, até as estimula por serem necessárias à sociedade, como, por exemplo, os transportes de qualquer natureza, serviços públicos em geral- fornecimento de luz, gás, água, telefone, serviços médico-hospitalares e outros tantos. Fala-se em risco adquirido quando a atividade normalmente não oferece perigo a alguém, mas pode
se tornar perigosa (eventualmente) em razão da falta de cuidado de quem a exerce. São atividades que, sem
defeito, não são perigosas; não apresentam riscos superiores àqueles legitimamente esperados...”
O
mesmo autor defende que toda a atividade que
contenha risco
inerente, excepcional ou não, desde que intrínseco à sua
própria natureza
deve ser enquadrada no parágrafo único do art. 927 do CCB/02. Tal situação seria decorrência da
teoria do risco criado, que em apertadíssima síntese consiste: todo aquele que exerce atividade empresarial ou
profissional tem a obrigação de responder pelos riscos que ela possa expor à
segurança e à incolumidade de terceiros, independentemente de
culpa. A obrigação em tela diz respeito à observância de normas técnicas e de segurança, assim como
critérios de lealdade, perante todos os personagens com os quais a empresa se relaciona
o que obviamente, inclui o seu cliente interno, a saber, o seu obreiro.
A
seguir vejamos parte interessante da doutrina de Sergio Cavalieri Filho –
Programa de Responsabilidade Civil, pág. 189, fazendo um resumo de sua tese
defendida e nesta sentença adotada, in
verbis:
“Em conclusão, há no
parágrafo único do art. 927 do Código Civil uma norma de
responsabilidade objetiva, que transfere para
a doutrina e jurisprudência
a conceituação de
atividade de risco no
caso concreto. Não há, a priori, como
especificar, exaustivamente, quais
são as atividades de risco, mas pode-se adotar, em face da teoria do
risco criado, o critério do risco inerente como
elemento orientador. A natureza
da atividade é que irá determinar, no caso
concreto, a sua propensão à
criação de riscos. Uma empresa que comercializa flores, peças
de vestuário ou
comestíveis, por exemplo, normalmente
não oferece risco inerente,
mas a atividade pode se tornar perigosa
à medida que se expandir e colocar veículos nas ruas para fazer entregas,
transporte de mercadorias etc.”
É
cristalino que a natureza da atividade implica grande risco por ser
extremamente perigosa e que as reclamadas não cumpriram com o dever de
segurança, o dever jurídico que se contrapõe ao
risco.
Neste
sentir, outrossim, as lições de Sérgio Cavalieri Filho:
“... quem se
dispõe a exercer alguma atividade perigosa terá que fazê-lo com
segurança, de modo a não causar dano a outrem, sob
pena de ter que por ele
responder independentemente de culpa. Aí está, em
nosso entender a síntese da responsabilidade
objetiva. Se, de um
lado, a ordem jurídica permite e até garante a
liberdade de ação, a livre
iniciativa etc., de outro, garante também a plena e
absoluta proteção do ser humano. Há um direito
subjetivo à segurança cuja violação justifica a obrigação
de reparar o dano
sem nenhum exame psíquico ou
mental da conduta do seu autor. Na responsabilidade objetiva,
portanto, a obrigação
de indenizar parte da idéia de violação do dever de
segurança ...”
Por
sua vez, adentremos a noção de fato de serviço – ou seja – quem desenvolve
atividade perigosa terá a obrigação de indenizar quando violar o dever de
segurança esta noção é extraída do art. 14 do CDC. O que significa que fato do
serviço é o acidente causado pelo serviço que não oferece a segurança
legitimamente esperada. Deve haver um dever especial de segurança para todos
aqueles que exercem atividades perigosas.
O
transporte em geral (terrestre) envolve atividade de risco; no caso as
reclamadas estavam envolvidas com transporte de hidróxido de sódio, substância
inflamável.
O
ilustre Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,
Sérgio Cavalieri Filho na obra supracitada, explicita:
“A
noção de segurança tem também
uma certa relatividade; depende do casamento de dois elementos: a
desconformidade com a expectativa legítima e a intensidade do risco criado pela
atividade, isto é, a probabilidade que ela tem de causar
dano. Caberá ao aplicador da norma aferir, em cada caso concreto, o grau dessa periculosidade
e a exigência de segurança legitimamente esperada. O que se quer é uma
segurança dentro dos padrões da legítima expectativa da coletividade. Os
serviços que geram obrigação de resultado, por exemplo, terão que ser prestados
com tal segurança que o resultado alvejado seja efetivamente alcançado - o
passageiro terá que ser levado são e
salvo ao seu destino. Nos serviços que geram obrigação de meio não haverá que
se falar em defeito do serviço, ainda que o
resultado não tenha sido alcançado, desde que a atividade tenha sido desenvolvida
com a segurança esperada.”
É mister ressaltar que o Tribunal Superior do Trabalho vem entendendo que o
artigo 7º da CF não se limita a assegurar garantias mínimas ao trabalhador, o que não impossibilita
a instituição de novos direitos - ou a melhoria dos já existentes - pelo
legislador ordinário, com base em um juízo de oportunidade, com escopo de manter
a eficácia social da norma através do tempo.
Fato é que há decisões admitindo
a possibilidade de ampliação dos direitos contidos no art. 7º da
CRFB/88, por conseguinte estendendo o alcance do art. 927,
parágrafo único, do CC/02 - que prevê responsabilidade objetiva quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua
natureza, risco para terceiros - aos acidentes de trabalho dos seus
empregados, obviamente.
Registre-se
que não se há de olvidar que os institutos pensionamento vitalício e
aposentadoria não se confundem, vez que possuem origens distintas. Note-se que
o critério para a obtenção da aposentadoria é o tempo de contribuição ou idade,
o que se chama de fator previdenciário, conquanto que a perda da capacidade
laborativa possui relação direta com o ato ilícito praticado pelas reclamadas
que agiram com negligência, imperícia, descaso, imprudência e culpa in vigilando e elegendo.
A
pensão mensal é devida desde a época dos fatos até a sua morte, não devendo ser
suspensa por eventual recebimento de aposentadoria, pois esta decorre da
contribuição de empregado e empregador. Já o pensionamento tem natureza
reparatória, em razão da redução da capacidade laborativa da vítima. Portanto,
o retorno no futuro ainda que parcial em atividades distintas não obsta o pagamento da pensão.
Se
a vitima padece de sequelas que implicam redução da capacidade laborativa de
forma permanente, o dano, logicamente, deve ser reparado por meio de pensão
mensal proporcional ao dano sofrido.
Portanto,
comprovada a incapacidade laborativa decorrente do sinistro, há que se
reconhecer o direito do autor ao recebimento de pensão mensal vitalícia.
A
redução da capacidade laborativa enseja não só as limitações óbvias, mas também
a impossibilidade de buscar melhores condições no mercado de trabalho, motivos
pelos quais é devida a pensão mesmo sem a comprovação cabal dos rendimentos
auferidos na data do acidente.
No
caso, o autor está incapaz de forma permanente e desempregado.
Ante o exposto, são
devidas as seguintes rubricas nos termos a serem especificados a seguir:
·
Defiro
a formação de um capital que reserve o pagamento de quatro salários-mínimos
vigentes, para pagamento da quantia mencionada mensalmente até os 75 anos de
idade do autor, a serem pagos no dia primeiro de cada mês. Para concretização
do comando, nos termos do art. 475-Q do CPC e Súmula. 213 do STJ. Quanto ao
montante dos valores desde já determino a liquidação deste julgado por meio de expert do Juízo, a ser nomeado no
momento oportuno;
·
Defiro
o pagamento do valor de quatro salários-mínimos vigentes para cada mês tendo
seu início em julho de 2000, com as atualizações devidas (juros e correção
monetária) e seu término no mês subseqüente a que o autor complete 74 anos de
idade, levando-se em consideração dados da tabela do IBGE – Diretoria de Pesquisas (DPE), Coordenação de População e
Indicadores Sociais (COPIS),
ou eventual morte do beneficiado, alternativamente. Repita-se que as parcelas
vencidas serão apuradas em sede de liquidação do julgado por perito deste
Juízo;
No
que tange ao pedido de ressarcimento constante no item “e” de fl. 08 do rol de
pedidos da exordial, o defiro, na forma de indenização por danos materiais, pois
no laudo de fl. 402, a perita explicita a necessidade de uma acompanhante para
o reclamante, pois ele apresenta inúmeras dificuldades decorrentes da não
reabilitação, com efeito a adaptação a nova condição física. Em assim sendo, defiro o
pagamento de dois salários mínimos mensais desde o mês de julho de 2000, para
que o reclamante utilize tal valor para contratação de profissional capacitado,
enfermeiro, por exemplo, nos termos explicitado no laudo juntado alhures.
3)
DAS VERBAS
INTERCORRENTES E RESILITÓRIAS DEVIDAS
É
incontroverso nos autos e vai ao encontro do teor da prova documental acostada
na fl. 103, que havia regular vínculo de emprego entre o reclamante e a
PRIMEIRA RECLAMADA, inclusive com a afirmação categórica da ré em sede de
contestação fl. 165.
Logo,
devidas são as parcelas intercorrentes e resilitórias requeridas, a saber:
·
13º
salário proporcional, na fração 1/12;
·
Férias
proporcionais, mais terço constitucional, na fração 1/12;
·
FGTS;
4)
SOLIDARIEDADE
No caso em tela, contatou-se que o acidente
derivou da ausência de medidas preventivas relacionadas com o planejamento
adequado e criterioso da atividade perigosa, destacando-se a ausência de análise
de risco da tarefa, falha de supervisão e logística dos setores competentes das
empresas rés.
As empresas foram negligentes, sendo que a solidariedade das rés quanto às consequências do acidente de trabalho fatal reside fundamentalmente na ausência de supervisão da execução do trabalho (tomadora prestadora e empregadora). Neste sentido a Ação Regressiva Acidentária nº 2009.71.00.027705-4.
As empresas foram negligentes, sendo que a solidariedade das rés quanto às consequências do acidente de trabalho fatal reside fundamentalmente na ausência de supervisão da execução do trabalho (tomadora prestadora e empregadora). Neste sentido a Ação Regressiva Acidentária nº 2009.71.00.027705-4.
Assim,
demonstrado O ACIDENTE deixou no AUTOR
sequelas irreparáveis e incapacitantes.
Não
há dúvidas de que as empresas deixaram de cumprir com o dever que lhes cabia - zelar pela incolumidade física do empregado.
A
conduta negligente das rés situa-se precipuamente na teoria da culpa in vigilando, sendo induvidoso que cabia
às reclamadas o controle e a fiscalização da
prestação de serviços, porquanto
quem escolhe alguém para um serviço assume essa contratação, gerando a culpa in eligendo, uma vez que aquele que
executa a atividade o faz sob a longa manus
do contratante.
Induvidoso,
portanto, que respondem todas as empresas, contratante e contratada, pela
indenização decorrente de acidente do trabalho, se constatado não terem sido
tomados os cuidados indispensáveis à realização DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EM
ATIVIDADE DE ALTO RISCO E PERIGOSA, bem como a fiscalização de sua execução,
restando configuradas as culpa in
eligendo e culpa in vigilando.
No
caso em tela, é indiscutível que houve conduta omissiva e negligente por parte
das RÉS, consistente em falta de cuidado na verificação da regularidade das
condições de trabalho, o que demonstra descuido na manutenção e fiscalização na
execução das atividades.
Restou
patente nos autos que não houve a devida VIGILÂNCIA, SEGURANÇA E FISCALIZAÇÃO
sobre a atividade exercida pelo obreiro na constância de sua jornada de
trabalho, mostrando-se imperioso o dever de indenizar imposto às rés.
Falharam
as reclamadas no dever de fiscalização
que lhes cabia.
Fora
de dúvidas que a segurança do trabalhador estava sob os cuidados das duas
requeridas, conforme se extrai do depoimento da preposto. Declara
a preposta da terceira ré na fl.484:
“ ... Interrogado disse que a SUMATEX fez investigação
para levantar a causa do acidente; que foi uma investigação extra oficial; que
ao ser questionada o motivo da investigação “extra oficial” reformulou a
resposta e disse que a investigação foi oficial; ...”
“ ... contratou uma empresa uma empresa de segurança do
trabalho para fazer análise do local e do acidente e apresentar o laudo nos
autos deste processo em que a preposta presta depoimento, mas não teve acesso
ao laudo; que o aludo foi assinado por um engenheiro de segurança do trabalho;
que o laudo somente foi realizado após a empresa ter sido acionada na Justiça
do Trabalho ...”
“ ... ao ser questionada se o reservatório em que o
material corrosivo é carregado pertence à SUMATEX, o motivo pelo qual não é
acompanhado todo o procedimento de descarregamento dada a periculosidade,
respondeu que: “quando as empresas vão fazer a coleta existe um “check list”;
que respondeu que se tiver 10 mil clientes não pode acompanhar o
descarregamento de 10 mil clientes; que se tiver 10 mil clientes não têm
condições de acompanhar 10 mil clientes; que se estiver dentro do “check list”
está liberado; que foi questionada o que ocorreu no caso do autor, eis que
houve o acidente: não soube responder. ...”
Noutro
giro, quanto à culpa do demandante, extrai-se dos depoimentos que o mesmo não
se utilizou de medidas próprias de segurança em atividade de risco, desejando
inclusive imputar a culpa de sua negligência a outrem, ora o próprio obreiro,
ora as demais empresas constantes no polo passivo.
A
declaração da preposta demonstra total falta de correta fiscalização, configurando
a negligência e ausência de mínima garantia de segurança, pois não importa o número
de clientes. Não é o número da clientela que servirá de medida de segurança. Total descalabro com a vida e saúde do
trabalhador.
No
mesmo sentido, e pela mesma razão, vejamos o depoimento do preposto da terceira
reclamada:
“... Interrogado
disse que não foi feita nenhuma perícia no local para saber o motivo do
acidente; que a BIO BRILHO não fez nenhuma investigação externa ou interna para
saber a causa do acidente; que ocidente ocorreu no pátio da BIO BRILHO; que a
TRANSCHEMICALS foi quem prestou socorro ao reclamante; que não tinha, no
momento do acidente, outro funcionário da TRANSCHEMICALS, que deve ter sido
chamado para prestar socorro; que não sabe informar quanto tempo demorou para o
autor ser socorrido; que o tanque (reservatório) pertence à BIO BRILHO; que a
2ª ré é fornecedora do material; que a 1ª ré foi contratada pela 2ª ré; que
houve uma investigação pela SUMATEX mas de forma extra oficial, para saber se
as conexões estavam perfeitas; que a investigação feita pela SUMATEX foi extra
oficial uma vez que a BIO BRILHO reclamou do ocorrido, pois a falha não era da
BIO BRILHO e a SUMATEX “viu, ficou calada e não tem nada registrado”; que na
ocasião a SUMATEX disse que impôr uma sanção contra a TRANSCHEMICALS, mas não
sabe informar se algo foi feito; que mantiveram contrato com a SUMATEX depois
do ocorrido; que depois do acidente não mais tiveram contato com a
TRANSCHEMICALS, pois a SUMATEX deve ter cortado contrato com a TRANSCHEMICALS
depois do ocorrido; que não sabe dizer se o autor usava equipamentos de
segurança; que a 1ª ré que fazia o descarregamento; que técnicos de segurança e supervisores da TRANSCHEMICALS e da SUMATEX
não visitavam o local do descarregamento; que no dia do acidente não tinha
supervisor da 1ª ou da 2ª ré presente. ...” (grifos nossos)
O
depoimento acima comprova que sequer houve investigação por parte da empresa
para saber a causa do acidente. A
preposta sequer soube informar o tempo utilizado para o autor ser atendido. Quanto
a se saber se houve investigação o silncio foi total.
Nos
dois depoimentos verifica-se que houve a intenção de livrar-se de qualquer
responsabilidade a todo custo.
O
preposto da terceira reclamada (fl. 484) inclusive declara que foi feita investigação
após ter sido acionada na Justiça do Trabalho.
No entanto, esta não foi juntada aos autos. Porque será?
Verifica-se,
portanto, que as reclamadas deixaram de seguir normas básicas e obrigatórias de
segurança contribuindo para a ocorrência do evento que o acidentou de maneira
irreparável.
Assim
sendo, comprovados o dano, a culpa e o nexo de causalidade entre um e outro, é
de se considerar procedente a pretensão reparatória, uma vez que foi formado o
trinômio informador da responsabilidade civil.
Declaro
a solidariedade da primeira, segunda e terceira reclamadas com base no artigo
927 do CCB/02.
5)
DANO MORAL -
INDENIZAÇÃO POR PERDA DA CAPACIDADE LABORATIVA e DANO ESTÉTICO
Matéria
da mais alta relevância, apesar de presente na história das civilizações, ainda
que de forma primitiva, desde o Código de Hamurabi, foi longa e árdua a
polêmica instaurada pela doutrina e jurisprudência em nosso ordenamento
jurídico pátrio sobre a questão da aceitabilidade do dano moral e da respectiva
indenização. Determinava-se a sua reparação somente nos casos excepcionais.
Contudo, notáveis juristas já defendiam com louvor a reparabilidade do dano
moral, sobressaindo-se, dentre outros, Clóvis Beviláqua, Pontes de Miranda,
Aguiar Dias e Carvalho de Mendonça.
A
Constituição federal de 1988 veio por uma pá de cal na oposição e resistência à
reparação do dano moral, consagrando como norma cogente, e a tornando
obrigatória. O artigo 5º, X, dispôs: "São invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização
pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Vale ressalvar que a
Carta Magna estabeleceu o mínimo. Não se trata de numerus clausus, ou seja, não são os únicos direitos cuja ofensa e
transgressão submetem o causador do dano a reparar, a enumeração é meramente
exemplificativa, sendo permissível à lei infraconstitucional e à jurisprudência
acrescentar outras hipóteses não discriminadas no artigo 5º, X, da CFRB/88. Leciona Caio Mário da Silva que “Não podem
ser reduzidos, por via legislativa, porque inscritos na Constituição. Podem,
contudo, ser ampliados pela legislatura ordinária, como podem ainda receber
extensão por via de interpretação, que neste teor recebe, na técnica do Direito
Norte-Americano, a designação de construction”
(Responsabilidade Civil - Forense, 5ª edição). Para o festejado autor “o fundamento da reparabilidade pelo
dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é
titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar a ordem jurídica em que sejam impunemente
atingidos. Colocando a questão em termos de maior amplitude, Savatier
oferece uma definição de dano moral como ‘qualquer sofrimento humano que não é
causado por uma perda pecuniária’, e abrange todo atentado à reputação da
vítima, à sua autoridade legítima, ao seu pudor, à sua segurança e
tranquilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de sua inteligência,
a suas afeições... (Traité de la
Responsabilité Civile, vol II, n. 05).”(grifo nosso)
O
direito à reparação dos danos morais tem origem em diversas áreas do direito
público e privado, atingindo os mais variados segmentos das relações sociais.
O direito do trabalho surge como o ramo
jurídico, de maior importância para o estudo e aplicação do conceito de dano
moral, não apenas em razão da subordinação jurídica existente entre o
trabalhador e o empregador, do estado de sujeição do assalariado dependente economicamente
de seu patrão, sendo obviamente a parte mais fraca da relação jurídica laboral,
mas também por ser o Direito do trabalho social por excelência, tendo por uma
das finalidades assegurar o respeito à dignidade do trabalhador, de sorte que
qualquer lesão em tal sentido resulta obrigatoriamente numa reparação. Ainda se
não bastasse, a CFRB/88 consagrou “a dignidade da pessoa humana e os valores
sociais do trabalho e da livre iniciativa” dentre os princípios fundamentais da
República Federativa do Brasil (artigo 1º, III e IV), além de erigir como
garantia constitucional a liberdade no “exercício de qualquer trabalho, ofício
ou profissão, atendida as qualificações profissionais que a lei estabelecer”
(artigo 5º, XIII), além de estabelecer como fundamento da ordem econômica e
financeira a valorização do trabalho humano (artigo 170, caput). Logo, é inadmissível, para não dizer absurdo, que havendo
uma Justiça do Trabalho, esta não seja competente em razão da matéria para
julgar as ofensas e lesões sofridas pelo empregado nos atributos de sua
personalidade, ou seja, na sua honra, na sua imagem, na sua integridade física
e mental.
O
maior patrimônio ideal do trabalhador é a sua capacidade de trabalho e
produtividade, é a sua reputação conquistada em um mercado tão competitivo e
muitas vezes desumano, reputação esta conquistada através de muitas horas labor
e dedicação ao empregador. Portanto, qualquer evento danoso decorrente da
relação de emprego que afete o obreiro em sua vida profissional, colocando em
descrédito a honestidade, moralidade, competência, diligência e
responsabilidade no exercício das atribuições profissionais, afetando a sua
honra, a sua integridade física e mental, e lhe causando sofrimento, e que
tenha por agente causador da lesão o empregador, é passível de reparação por
dano moral. A lesão pode ocorrer durante o contrato de trabalho, antes
(pré-contratual) ou na ruptura.
No
momento atual o entendimento consagrado acerca da teoria da reparação dos danos
morais, encaminha-se no sentido de que a responsabilidade do agente causador do
dano resulta por força da violação (damnun
in re ipsa). Portanto, verificado o acontecimento causador do dano, surge ipso facto, a necessidade de reparar a
lesão sofrida. Inclusive, já vigora a orientação de que não há que se cogitar
de prova. Logo, “não cabe ao lesado demonstrar que sofreu, realmente, o dano
moral alegado. Assim, não precisa a mãe comprovar que sentiu a morte do filho;
o agravado em sua honra não precisa demonstrar em juízo que sofreu a lesão”
(Júlio Bernardo do Carmo, “O dano moral e sua reparação no âmbito do direito
civil e do trabalho”, LTR, Vol. 60, III, pág. 295, 1996). É cabível acumular o
pedido de dano moral e patrimonial oriundos do mesmo fato (Súmula 37 do STJ).
Caio
Mário, em obra já citada, leciona que
“o problema de sua reparação deve ser posto em termos de que a reparação do
dano moral, a par do caráter punitivo imposto ao agente, tem de assumir sentido
compensatório. Sem a noção de equivalência que é própria da indenização por
dano material, corresponderá à função compensatória pelo que tiver sofrido... A
vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos
casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes do seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a
dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstancias de
cada caso... Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão
pequena que se torne inexpressiva” (grifo nosso). Porém, o valor fixado
deve servir de desestímulo a novas agressões. São conferidos poderes amplos ao
magistrado para a definição da forma e da extensão da reparação cabível, tanto é assim que as leis mais recentes se
abstêm de formular critérios ou parâmetros da reparabilidade do dano, ficando
ao prudente arbítrio do juiz a decisão sobre a matéria.
Impedir
que o empregador pratique novamente o ato com os demais empregados é o objetivo
da indenização do dano moral. Contudo, nada impede que, além desta compensação
em pecúnia, o Judiciário determine reparação in natura, de forma a obrigar uma
contrapublicação dos fatos ou uma retratação pública.
Ensina Maria Helena
Diniz, que:
"Realmente, na reparação do
dano moral o juiz deverá apelar para o que lhe parecer eqüitativo ou justo, mas
ele agirá sempre com um prudente arbítrio, ouvindo as razões das partes,
verificando os elementos probatórios, fixando moderadamente uma indenização.
Portanto, ao fixar "quantum" da indenização, o juiz não procederá a
seu bel-prazer, mas como um homem de responsabilidade, examinando as
circunstâncias de cada caso, decidindo com fundamento e moderação",
acrescentando que: "A reparação pecuniária do dano moral não pretende
refazer o patrimônio, visto que este, em certos casos, não sofreu nenhuma
diminuição, mas dar ao lesado uma compensação, que lhe é devida, pelo que
sofreu, amenizando as agruras oriundas do dano não patrimonial".
A jurisprudência tem assentado o seguinte entendimento:
"A indenização por dano
moral é arbitrável, mediante estimativa prudencial que leve em conta a
necessidade de, com a quantia, satisfazer a dor da vítima e dissuadir, de igual
e novo atentado, o autor da ofensa" (Apelação Cível n.º
198.945-1/7 - TJSP, rel. Des. Cezar Peluso, RT 706/67).
Tratando-se de dano moral, o conceito de ressarcimento abrange duas
forças: uma de caráter punitivo, visando a castigar o causador do dano, pela
ofensa que praticou; outra de caráter compensatório, que proporcionará à vítima
algum bem em contrapartida ao mal sofrido.
Esta a lição do ilustre magistrado paranaense Clayton Reis:
"O Magistrado sensível,
perspicaz e atento aos mecanismos do direito e da pessoa humana, avaliará as
circunstâncias do caso e arbitrará os valores compatíveis com cada situação.
Esse processo de estimação dos danos extrapatrimoniais, decorre do arbítrio do
Juiz. O arcabouço do seu raciocínio na aferição dos elementos que concorreram
para o dano, e sua repercussão na intimidade da vítima, serão semelhantes aos
critérios adotados para a fixação da dosimetria da pena criminal, constante no
art. 59 do Código Penal".(Avaliação do Dano
Moral", Forense, 1998, p. 64).
O mestre Caio Mário da Silva Pereira ensina que "a vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho
patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode
ser mesmo mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber
uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo Juiz,
atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor
e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de
enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva."
(Responsabilidade Civil, nº 49, p. 67).
Nesse diapasão, entendo que, para a fixação de indenização por dano
moral, é necessário que o julgador proceda a uma avaliação sobre a proporção da
lesão, não devendo a reparação ser fonte de enriquecimento, nem ser
inexpressiva, com o que perderia a função reparadora, ficando a correspondente
fixação a cargo do seu prudente arbítrio.
No caso dos autos, é nítida a situação de grande sofrimento que atingiu
o autor, diante do acidente de grandes proporções que o vitimou, expondo-o a
tratamento médico longo e penoso, deixando-o com sequelas permanentes.
O acidente do trabalho é fato incontroverso e a perda TOTAL da
capacidade laborativa nos termos do laudo do ilustre expert na fl. 397 e seguintes, logo comprovados nexo causal, dano
material emergente e dever de zelo e cuidado do empregador para com o obreiro
há responsabilidade civil, nos termos do art. 927 do Código Civil vigente.
Determino a indenização por danos MORAIS no valor de R$ 500.000,00
(QUINHENTOS MIL REAIS), em razão da perda TOTAL da capacidade laborativa do
obreiro.
No que pertine ao dano estético, por ser dissemelhante do dano analisado
alhures, e cumulativamente indenizável, a saber, perda da vista, como já
exaustivamente narrado, determino indenização de igual monta R$ 500.000,00
(QUINHENTOS MIL REAIS), ante o prejuízo físico-estético que em verdade é
incalculável.
Repita-se
a perda da visão inelutavelmente ocasiona o fim de muitos prazeres, tais quais,
ver o por do sol, ver a face de um neto, o crescimento de um filho, um jogo de
futebol na televisão. Não há como enumerar, além das limitações físicas e
muitas vezes psicológicas, conforme o próprio laudo pericial (fl. 397 e
seguintes) indica que o reclamante ainda possui dificuldade significativa a se
adaptar a sua nova condição, a saber, a de deficiente visual completo.
6)
GRATUIDADE
DE JUSTIÇA
A lei n° 7.115, de 29/08/83, dispôs que “a declaração destinada a fazer
prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons
antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador
bastante, e sob as penas da lei, presume-se verdadeira”.
O autor firmou declaração destinada a fazer prova de pobreza.
Presentes os requisitos exigidos pelo artigo 3° da lei 7.115/83 c/c art.
1.060/50 c/c 5.584/70, defere-se o pedido de concessão do benefício da justiça
gratuita.
7)
HONORARIOS
ADVOCATÍCIOS
Postula o autor a condenação da ré
ao pagamento de honorários advocatícios.
Modifico
entendimento anterior e passo adotar o mesmo entendimento do Juiz do Trabalho Lourival Barão Marques Filho
O
Código Civil em seu art. 404, caput
define a nova abrangência das perdas e danos, acrescendo àquela contida no
dispositivo correlato do CC/16 (art. 1.061) as custas e honorários
advocatícios.
As
perdas e danos dizem respeito ao ressarcimento do credor da obrigação exigida em juízo. No Código
Civil/2002, o ressarcimento à parte envolve o reembolso das custas e honorários
de advogado que despendeu. Não se tratam de honorários advocatícios
sucumbenciais (que pertencem ao advogado), mas sim aos honorários contratuais
despendidos pelo autor que se viu obrigado a constituir advogado, para compelir
o inadimplente à satisfação das perdas e danos decorrentes da obrigação.
A
indenização deve ser integral, não sendo lógico deferir-se o pagamento ao
credor de forma parcial. Com efeito, nenhum profissional trabalha de forma
gratuita, onde evidentemente enquadra-se o advogado. Assim, o autor foi
obrigado a constituir advogado para postular as verbas nesta ação. Não sendo
deferidos honorários advocatícios, o empregado terá que destacar parte do valor
que recebeu, para pagar o causídico. Portanto, em vez de receber a totalidade
da indenização terá que se contentar com parte dela. Isto fere o princípio da
restituição integral da indenização.
O
art. 402, do Código Civil determina: "Salvo as exceções expressamente
previstas em lei, as perdas e danos (...) - aí contidos os honorários
contratuais - (...) devidos ao credor abrangem, além do que efetivamente perdeu
o que razoavelmente deixou de lucrar."
Assim, os honorários abrangidos pelas perdas
e danos não são os sucumbenciais, devidos ao advogado, mas os contratuais,
devidos ao credor, que tem assegurado no Código Civil/2002, de modo expresso, o
direito de eles serem ressarcido.
Ademais,
aceitar que a parte litigue sem a presença do advogado, significa admitir o
massacre da mesma pelo adversário. Com efeito, a legislação trabalhista é
extremamente complexa, sendo indispensável a presença de um profissional
especializado. Somente com o advogado é que será possível atingir a dialética
jurídica. Justiça sem a presença do advogado é arremedo de Justiça.
Além
disto, é ingenuidade pensar que a parte pode formular sozinha sua pretensão. Como
poderia um trabalhador humilde interpor recurso de revista? Ingressar com ação
rescisória? Impetrar mandado de segurança? A fase administrativa da Justiça do
Trabalho já acabou há muito tempo, contudo ainda deixou um legado pernicioso.
Mesmo advogados especialistas em direito processual do trabalho, tem
dificuldades em determinados procedimentos, o que se dirá do leigo...
Somente
com a presença do advogado é que fica possível o completo exercício do direito
de ação.
Assim,
como o autor viu-se obrigado a constituir advogado para conseguir valores que
deveriam ser espontaneamente pagos pela ré, é imperioso que esta, suporte o
pagamento dos honorários advocatícios, conforme artigos 389, 402 e 404 do
Código Civil.
Por fim, destaco que basta o acolhimento de
um pedido para que a ré seja sucumbente. Destarte, condeno esta ao pagamento de
honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o total líquido devido ao
empregado.
DEDUÇÃO
Autorizada está a dedução das parcelas
comprovadamente pagas sob a mesma rubrica com as acima deferidas para que se evite o enriquecimento sem
causa.
III - DISPOSITIVO
·
pagamento
de honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o total
líquido devido ao empregado;
·
pagamento de indenização por danos
morais no valor de R$ 500.000,00;
·
pagamento
de indenização
por danos estéticos no valor de R$ 500.000,00;
·
pagamento
de 13º
salário proporcional, na fração 1/12;
·
pagamento
de férias
proporcionais, mais terço constitucional, na fração 1/12;
·
pagamento
de FGTS;
·
formação de um capital que
reserve o pagamento de quatro salários-mínimos vigentes, para pagamento da
quantia mencionada mensalmente até os 75 anos de idade do autor, a serem pagos
no dia primeiro de cada mês.
·
pagamento do valor de quatro
salários-mínimos vigentes para cada mês tendo seu início em julho de 2000, com
as atualizações devidas (juros e correção monetária) e seu término no mês
subseqüente a que o autor complete 75 anos de idade, ou eventual morte do
beneficiado, alternativamente.
·
pagamento de dois salários
mínimos mensais desde o mês de julho de 2000, para que o reclamante utilize tal
valor para contratação de profissional capacitado, enfermeiro, por exemplo, nos
termos explicitado no laudo juntado alhures.
Autorizada a dedução das parcelas pagas sob a mesma rubrica .
A época
própria para
o cômputo da correção
monetária é o mês
subsequente ao da prestação de serviços .
Intimem-se as partes .
E, para
constar , lavrou-se a presente
ata que
vai devidamente assinada e digitada por esta magistrada .
CLÁUDIA REGINA REINA PINHEIRO
(*) NB. Luiz Salvador é Ex-Presidente da ABRAT
(www.abrat.adv.br), Presidente da ALAL (www.alal.com.br),
Diretor do Depto. de Saúde do Trabalhador da JUTRA (www.jutra.org), assessor
jurídico de entidades de trabalhadores, membro integrante, do corpo técnico do
Diap, do corpo de jurados, do TILS – Tribunal Internacional de Liberdade
Sindical (México), do TMLS – Tribunal Mundial de Liberdade Sindical (Colômbia),
da Comissão Nacional de Relações internacionais do CF da OAB Nacional e da
Comissão de “juristas” responsável pela elaboração de propostas de
aprimoramento e modernização da legislação trabalhista instituídas pelas
Portarias-MJ 840, 1.787, 2.522/08 E 3105/09, E-mail: luizsalv@terra.com.br,
site: www.defesadotrabalhador.com.br
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