Sorocaba:
"Terceirização é precarização, mente quem diz o contrário"
A afirmação é do desembargador João Batista Martins César, do TRT
da 15ª Região
Desembargador-
foto: Foguinho/Smetal
Munido
de estatísticas, pesquisas e amplo conhecimento da legislação brasileira, o
desembargador João Batista Martins César, do Tribunal Regional do Trabalho
(TRT) da 15ª Região (Campinas), afirmou, durante debate na Câmara Municipal de
Sorocaba na quarta-feira (6) que a terceirização é sinônimo de precarização do
trabalho, "em todos os sentidos". De acordo com ele, "mente quem
diz o contrário".
O
debate, que durou mais de três horas, foi coordenado pelo vereador Izídio de
Brito (PT) e fez parte da programação da 11ª Semana Municipal de Prevenção a
Acidentes de Trabalho, que começou no dia 3 e segue até sábado, dia 7.
Segundo
o desembargador, os trabalhadores terceirizados sofrem cinco vezes mais
acidentes de trabalho do que o funcionário direto. O Brasil, por sua vez, tem
um dos maiores índices de mortes por acidente de trabalho do mundo, perdendo
apenas para a Índia, Coréia do Sul e El Salvador.
Todo
ano, 700 mil trabalhadores sofrem acidentes de trabalho, com 14 mil
incapacitações físicas e 2.800 mortes. "São mais vidas perdidas no trabalho
no Brasil do que os Estados Unidos perdem nas guerras", comparou João
Batista. "O Estado de São Paulo, o mais rico da federação, é o responsável
por 50% desses índices absurdos", informou.
Baixos salários e outros
problemas
Além
do elevado número de acidentes, o desembargador relacionou vários outros
problemas trabalhistas típicos da terceirização, como baixos salários
(terceirizados ganham, em média, um terço a menos que o trabalhador direto),
jornadas de trabalho maiores, falta de condições de trabalho, falta de
investimento em treinamento de pessoal, falta de plano de carreira, perda de
benefícios (como plano de saúde) e falta de registro em carteira.
Antes
de ser desembargador, João Batista foi Procurador do Ministério Público do
Trabalho. Pela experiência dele, não é verdade que o PL 4330, aprovado na
Câmara e que agora tramita no Senado (com o nome de PLC 30/2015), vai
regulamentar o trabalho terceirizado e trazer benefícios para os trabalhadores.
"A regulamentação já existe. Está na CLT [Consolidação das Leis do
Trabalho].
O
que falta é fiscalização". Para ele, existe muita terceirização para pouca
fiscalização. "E isso, o projeto de lei não vai resolver", explicou.
Experiência negativa em
vários países
No
Brasil, 27% do mercado de trabalho é terceirizado atualmente. Esse número
deverá aumentar muito se o projeto de lei for aprovado. Anos atrás, o Japão
resolveu abrir sua legislação para as prestadoras de serviço. A terceirização
chegou a 30% no país. No entanto, o impacto dessa mudança foi negativo para a
economia, pois reduziu a massa salarial. "O governo japonês pediu um
estudo ministerial, que recomendou não apenas a redução, mas a extinção da
terceirização", afirmou o desembargador.
Ainda
de acordo com João Batista, a intensa terceirização no Brasil virou sinônimo de
precarização do Trabalho na Europa. "Nos países europeus, a terceirização
é chamada de brasileirização das relações de trabalho", explicou.
Na
Argentina, a ampliação da prestação de serviços terceirizados também prejudicou
a economia, "pois há menos dinheiro circulando na economia, menos consumo,
devido à queda na renda dos trabalhadores" exemplificou.
Trabalho escravo e evasão
fiscal
Do
total de casos de trabalho escravo no Brasil, 90% envolvem empresas terceirizadas.
Outro aspecto negativo da terceirização, explicou João Batista, é o aumento da
rotatividade. "O funcionário direto trabalha, em média 6 anos na mesma
empresa. Quando se trata de terceirizada, o tempo de serviço cai para 3
anos".
"Tem
que acabar com a terceirização no Brasil, pra acabar com esses números
vergonhosos, e não ampliar essa precarização, como querem os que apóiam o
projeto de lei que está no Congresso", defendeu o desembargador.
Os
prejuízos da terceirização apontados no debate desta quarta foram muitos. De
acordo com Batista, esse modelo de trabalho cria insegurança ao trabalhador até
na rescisão de contrato. "A empresa terceirizada muitas vezes não têm
capital, não tem patrimônio. É uma salinha com secretária. Quando a prestadora de
serviços fecha, os trabalhadores ficam sem receber as verbas rescisórias".
O
palestrante também prevê evasão fiscal com o aumento do número de
terceirizadas, pois muitas prestadoras de serviço, devido a pouca estrutura, se
cadastram na modalidade de imposto Simples.
Negociações sindicais mais
fracas
Outro
problema grave da terceirização é a perda de capacidade de organização dos
trabalhadores, pois esse tipo de contratação implica em divisão da
representação sindical no ambiente de trabalho. "O sindicato do
terceirizado pode ser diferente do sindicato do trabalhador direto. Com isso,
os trabalhadores perdem poder de negociação com o empregador", explica o
desembargador.
"Com
a fragmentação sindical, os trabalhadores perdem a capacidade de combate
sindical, perdem direitos de convenção coletiva, o acordo coletivo da tomadora
de serviços pode ser diferente do acordo das terceirizadas", alerta João
Batista.
Representantes
de 15 sindicatos e associações da região de Sorocaba participaram do debate na
Câmara nesta quarta, além de funcionários públicos e trabalhadores de diversas
outras categorias profissionais.
Eduardo
Ercolin, tecnólogo e corretor de imóveis, um dos munícipes presentes, utilizou
o microfone para externar sua indignação com a pouca mobilização que o tema
ainda provoca na sociedade. "Pelo que vimos aqui, a legislação trabalhista
brasileira demorou décadas para ser construída e agora está ameaçada. No
entanto, a população sai fácil às ruas tirar presidente da República, que pode
ser mudado a cada quatro anos pelo voto, mas não se mobiliza para proteger um
conjunto de leis permanentes", desabafou.
Além
de Izídio e João Batista, formaram a mesa Daniela Valentim, representando a
Secretaria Municipal de Saúde; e André Salvador, da Secretaria do Meio
Ambiente.
Sobre o palestrante
João
Batista Martins César é Mestre em Direito pela Unimep e foi o primeiro
procurador do trabalho de Sorocaba, de 2008 a 2009. Em seguida, ele foi
transferido para a sede regional do Ministério Público do Trabalho, (MPT), em
Campinas, onde também atuou como procurador. Em abril de 2013, João Batista
tomou posse do desembargador (equivalente a juiz de 2ª instância) no Tribunal
Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, em Campinas, órgão que também é
responsável pela região de Sorocaba.
Link: http://fem.org.br/noticia/13244/sorocaba-terceirizacao-e-precarizacao-mente-quem-diz-o-contrario
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