"É impossível retirar todos os rejeitos", diz presidente do Ibama
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Apesar da vinda do período de chuvas e de
drenagens feitas na bacia do rio Doce, a remoção total dos rejeitos de
mineração da empresa Samarco é "impossível", de acordo com a
presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), Marilene Ramos.
Em
entrevista exclusiva à DW Brasil, ela explica que não há meios tecnológicos
viáveis para fazer uma filtragem completa. O rio foi atingido por 34 milhões de
metros cúbicos de rejeitos, que exterminaram boa parte do ecossistema aquático.
O Ibama
prevê um período de dez anos para a recuperação da bacia, embora ainda não seja
possível dimensionar o impacto da lama no litoral do Espírito Santo.
"Temos
que atuar sobre outras fontes de poluição, que hoje também sobrecarregam o rio,
para compensar parte do dano provocado pelos rejeitos que não conseguimos
remover de forma completa", diz Ramos, que defende ações de tratamento de
esgoto lançado no rio e reflorestamento das margens.
O órgão multou a subsidiária da Vale e da BHP
em 250 milhões de reais pelo desastre, a maior penalidade já aplicada pelo
Ibama.
DW:
Especialistas dão previsões diferentes para a recuperação do rio Doce, que
variam de 5 meses a 20 anos. Por que o cálculo do Ibama é de dez anos?
Marilene
Ramos: Não existe um cálculo
preciso. Esses cinco meses se referem à lavagem da água que hoje está com
elevadíssima turbidez. Com os períodos de chuva forte, a tendência é que haja
um escoamento. Já nós estimamos a recuperação em dez anos com base em duas
perspectivas. Um lado é a restauração dos processos ecológicos do rio e de suas
áreas marginais. Vai demorar até que as áreas impactadas sejam reflorestadas e
haja uma multiplicidade de espécies. Até que o rio possa ter condições de
receber as matrizes que foram capturadas e que estão agora em centros para
reprodução é preciso um prazo. Além disso, na área estuarina e costeira, o
desastre ainda está em andamento. Ainda não temos uma ideia completa do nível
do impacto que será atingido ali. O segundo aspecto é que, apesar de a chuva
levar parte desse material e a empresa fazer a drenagem e retirada dos rejeitos
que estão depositados, sabemos que é tecnologicamente impossível retirar tudo e
promover uma verdadeira filtragem do rio. Temos, então, que atuar sobre outras
fontes de poluição, que hoje também sobrecarregam o rio, para compensar parte
do dano provocado pelos rejeitos.
Quais são
as outras fontes de poluição no rio Doce?
Na Bacia
do rio Doce, 90% do esgoto é jogado nos rios sem nenhum tratamento. Ainda que
esteja inserida no bioma da Mata Atlântica, o remanescente florestal é
baixíssimo, o que intensifica os processos erosivos. Teríamos que atuar também
no reflorestamento para reduzir a carga de sedimentos dentro do rio e implantar
um sistema de tratamento de esgoto. Como não é possível tirar toda a poluição
causada pela onda de rejeitos no rio, nossa proposta é usar tecnologias
disponíveis para atuar sobre essas outras fontes. São prazos que chegam a pelo
menos dez anos.
A cargo de
quem ficará a revitalização?
A
proposta do governo federal e dos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo
é que a própria empresa, juntamente com suas controladoras, crie uma entidade
de direito privado que invista nesse plano de restauração do rio Doce, a partir
de um fundo com recursos dessas empresas.
Qual é a
sua avaliação geral sobre os impactos ambientais do desastre? Para você, foi o
maior desastre ambiental do país?
Eu não
diria que é o maior desastre ambiental do país, porque há outros que não são de
natureza comparável. O tipo de impacto não é similar. Eu diria que é o maior
desastre ambiental na área de mineração do mundo. O segundo maior, que foi no
Canadá, mobilizou cerca de 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Em Minas
Gerais, estamos falando em 34 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Então, é
realmente grande. Além disso, esses rejeitos percorreram 663 quilômetros de
corpos hídricos, onde o ecossistema aquático foi totalmente exterminado, e
grande parte dele soterrado. É difícil comparar, porque outros desastres, como
o derramamento de óleo na Baía de Guanabara, tem outros efeitos muito
persistentes também. Ainda que contenham metais, os rejeitos do rio Doce não
contêm resíduos tóxicos.
A
quantidade de 34 milhões de metros cúbicos ainda pode aumentar?
A
barragem de Fundão continha algo em torno de 50 milhões de metros cúbicos de
rejeitos. Ao se romper, a onda de lama arrastou cerca de 34 milhões. Mas há
outros 16 milhões de metros cúbicos, de um rejeito mais consolidado, que está
depositado numa bacia de acumulação que existia atrás da barragem do Fundão.
Esse material hoje está exposto. Com qualquer chuva forte, ele pode ser
arrastado para o rio, realimentando o processo de elevada turbidez. A empresa
[Samarco] já está notificada para a construção de diques drenantes e de novas
bacias de acumulação, onde essa água com resíduos deve ser previamente tratada
para que chegue ao rio limpa, livre de rejeitos. A empresa tem o compromisso de
executar esses sistemas num prazo de 90 dias. Nas próximas duas semanas, a
empresa deve apresentar uma proposta das ações de curto prazo para reduzir esse
aporte de sedimentos e iniciar a recuperação das áreas mais degradadas.
Autor:
Érica Kokay
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