domingo, 21 de agosto de 2011
Degradação Ambiental e o dever reparatório do agente poluidor
Seara Alimentos condenada por crime ambiental
Promotor Eduardo Sens ingressou a ação civil pública
A Justiça de Seara reconheceu a responsabilidade civil e condenou a Seara Alimentos por danos ambientais causados por suinocultor, seu integrado. Na ação civil pública, movida pela Promotoria de Justiça de Seara, comprovou-se que um suinocultor de Arvoredo havia despejado dejetos suínos no Lageado Leão, através de uma mangueira. Com a conduta, o nível de coliformes fecais no local aumentou 260 vezes, ultrapassando em quase mil vezes o limite permitido pela legislação sanitária para considerar o rio balneável.
Na sentença, o juiz de Seara afirmou que a empresa é responsável pelos danos causados pelo agricultor, porque o "integrado não possui autonomia nenhuma para decidir sobre a forma em que o alojamento dos cerdos em fase terminal se dará, bem como as instalações necessária para que possa abrigar o lote de suínos. Logo, era obrigação da requerida aferir se a esterqueira que se conectava as duas pocilgas existente na propriedade rural do Sr. Rogério Dedonatti possuía condições técnicas de armazenar com eficiência dejetos de uma vara composta de 960 (novecentos e sessenta) porcos".
Constou também na sentença que "É muito cômodo para a empresa entregar um lote de animais para um colono, pelo sistema de parceria agrícola, e permanecer indiferente às questões ambientais, diante do exercício de uma atividade considerada altamente degradante ao meio ambiente, sem exigir de seus integrados pelo menos instalações condizentes com a legislação e com o número de animais alojados".
Atendendo ao pedido do Ministério Público, a empresa foi condenada a pagar multa de R$ 50.000,00, a soltar 30 mil alevinos no local e a plantar mil árvores nativas, sendo metade delas araucárias, tudo no prazo de 45 dias, sob pena de multa de R$ 5 mil por dia. Da sentença cabe recurso.
Link: http://www.radioalianca.com.br/arquivos_internos/index.php?abrir=noticias&acao=conteudo&cat=1&id=21423
Leia a íntegra da incial da ACP
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE
SEARA
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por seu Promotor de Justiça ao final assinado, com fundamento nos arts. 127 e 129, III, da Constituição da República,bem como no art. 82, I, do Código de Defesa do Consumidor, no art.5º da Lei nº 7.347/85 e no art. 3º e 14, §1º, da Lei nº 6.938/81,propõe AÇÃO CIVIL PÚBLICA (com pedido de antecipação de tutela), em defesa do direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, em face de:
SEARA ALIMENTOS S.A., pessoa jurídica de direito
privado, inscrita no CNPJ sob o nº 02.914.460/0001-50, domiciliada na Avenida Paludo, 155, Bairro Industrial, Seara, Santa Catarina.
1. Objetivo da ação
Esta ação civil pública tem por objetivo obter provimentojurisdicional que determine à Seara Alimentos S.A. a adoção de providências para pôr fim à degradação ambiental que vem incentivando e da qual vem se beneficiando no Município de Seara, mais precisamente na propriedade de Clair Simoni, na Linha Bernardi.
Tem por objetivo também obter provimento que determine a completarecup eração ambiental,também por parte da Seara Alimentos S.A., bem como a indenização do dano ambiental até o momento causado, mediantecompensação financeiradestinada ao Fundo de Recuperação de Bens Lesados do Estado deSanta Catarina.
Para tanto, como se verá, será necessária inclusive antecipação de tutela, para que o meio ambiente não fique desprotegido durante a longa tramitação desta ação.
2. Legitimidade passiva
Como está comprovado pelos documentos que seguem, a Seara Alimentos S.A. tem por finalidade a industrialização da produção de agricultores em regime de parceria, como é o caso de
Clair Simoni.
Por sua vez, o produtor rural Clair Simoni é parceiro formal da Seara Alimentos S.A. O dano causado pelo produtor,porque no caso específico dos autos incentivado, admitido e explorado pela Seara Alimentos, deve ser imputado objetivamente a ela, residindo aqui a legitimidade passiva para a causa.
3. Fatos
3.1. Conduta de Clair Simoni
Em abril de 2008 a Polícia Militar de Proteção Ambientalvistoriou a propriedade rural de Clair Simoni, situada na LinhaBernardi, em Seara, nesta Comarca.
Constatou-se, na ocasião, que o produtor rural descumpria diversos itens da Licença Ambiental de Operação nº236/2005/TAC, dentre eles os seguintes: não-correção de vazamentos da pocilga e canaletas coletoras de dejetos, falta de cercas no sistema de armazenamento, falta de controle de odores e vetores, transbordamento de uma esterqueira, vazamento de dejetos próximo a uma estrada, depósito de animais mortos sem cobertura adequada, incineração indevida de animais mortos.
Deve-se registrar que o produtor rural tem plantel de aproximadamente 4.500 suínos em fase de terminação (adultos), oque pode ser considerado um dos maiores plantéis da região.
Por esses fatos, lavrou-se termo circunstanciado ambiental contra Clair Simoni e Seara Alimentos S.A. O produtor reconheceu o erro e aceitou a proposta de transação penal. A empresa requerida, apesar de seu potencial econômico e da ínfima proposta, negou-se a transacionar, sendo então denunciada oralmente em audiência.
3.2. Conduta da Seara Alimentos S.A.
Evidentemente, por um princípio básico de Economia, ninguém exerce atividade produtiva se não visar à obtenção de alguma vantagem pessoal, que na maior parte das vezes é financeira.
É o caso dos autos. Como se apurou nesta Promotoria de Justiça, o produtor, com contrato escrito, tem toda a sua produção de suínos adquirida normalmente pela Seara Alimentos S.A., que por sua vez a industrializa em suas unidades.
No entanto, mesmo visitando semanalmente a propriedade rural, os técnicos da empresa requerida nada fizerampara evitar os danos ambientais e o desrespeito à licença, em nítida omissão para com o Direito Ambiental. Tinha a requerida em mãos,durante todo o período, a licença ambiental e suas exigências mas, mesmo assim, preferiu fechar os olhos para este aspecto e se concentrar na maximização dos lucros, focando sua atuação apenas na engorda rápida dos animais.
Note-se que a Seara Alimentos fornece a ração, presta assistência técnica, “especialmente no que diz respeito àsinstalações, manejo e condições sanitárias”, presta orientação veterinária, define o cronograma de entrega de suínos e arca com as despesas de transporte, tudo com exclusividade (Cláusula 3ª do contrato).
Assim, na verdade, se observa que a Seara Alimentos S.A. explora juntamente com o produtor rural a produção de suínos para abate, atividade que, no caso dos autos, causou poluição
ambiental intolerável.
Sobre esse assunto, esta Promotoria de Justiça já colheu em outra ocasião o depoimento de Wolmir de Souza, presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos, ocasião em que foi informado o seguinte:
Em todos os sistemas de produção de suínos conhecidos pelo declarante não há qualquer autonomia por parte dos produtores rurais; os animais são alimentados com a ração fornecida pelas integradoras, na periodicidade determinada pelas integradoras; são também as integradoras que determinam a freqüência das raspagens (limpezas das pocilgas); a entrada e a saída dos animais são determinadas pelas integradoras, inclusive com horário definido, o quefreqüentemente pode ocorrer à noite e de madrugada; a integradora também exige número mínimo de funcionários; as integradoras vêm aos poucos exigindo também dos produtores rurais a disponibilização de botas e roupas especiais para os funcionários e para quem quer que venha a ingressar na área de produção, inclusive os próprios técnicos das integradoras; as integradoras também vem exigindo o “arco de desinfeção” que são lugares onde os caminhões com ração ou animais são desinfectados; aproximadamente 70% dos produtores já foram obrigados a instalar este sistema; não sabe o declarante se o custo do arco de desinfecção é suportado exclusivamente pelo produtor ou se há apoio da integradora; o preço do animal não é negociado entre a integradora e o produtor; o preço é definido por um cálculo realizado pela integradora, que leva em conta o peso do animal na entrada e o peso de saída e aquantidade de ração consumida (sistema de conversão alimentar); os produtores rurais, ainda que estejam deposse de todos estes dados, não conseguem calcular o preço do animal; a integradora, de qualquer forma, não permite negociação do preço (doc. anexo).
Por isso é que está evidente a omissão da empresa, somente levada a efeito desta forma por lhe trazer notável benefício financeiro: deixa de investir em treinamento e nas instalações dos produtores e, ao mesmo tempo, continua comprando todos os animais produzidos a preços geralmente bastante baixos.
4. Direito
A água, este bem escasso de que depende a humanidade, vem sofrendo constantes degradações desde oprocesso de industrialização por que passou o mundo nos últimos séculos.
Afora o desperdício e a contaminação por agrotóxicos, apontam os estudos mais modernos a indústria como o principal agressor ambiental em se tratando de recursos hídricos. No caso doOeste de Santa Catarina, a agroindústria vem corretamente sendo responsabilizada pela intensa contaminação dos lençóis freáticos e dos cursos d´água existentes.
4.1. Lei de Crimes Ambientais
Para a Lei nº 9.605/98, é crime ambiental “fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores” [...]“contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes”.
Dentre as normas ambientais aplicadas ao caso específico estão as constantes da Licença Ambiental de Operação nº236/2005/TAC (doc. anexo), que exigem que as esterqueiras sejam capazes de acondicionar os dejetos por até 140 dias, de modo a evitar vazamentos.
Logo se vê, portanto, que a legislação brasileira proíbe a conduta da requerida, e a ela confere tamanha gravidade que chega a criminalizá-la pelo art. 60 da Lei nº 9.605/98.
4.2. Lei da Política Nacional do Meio Ambiente – Lei nº 6.938/81
Também é claramente perceptível que a legislação ambiental brasileira, com vigor, objetiva punir a ocorrência de danos ambientais sob vários aspectos, como forma de atender àquela diretriz mundial de proteção ao meio ambiente.
No caso dos autos, despontam agressões à natureza de altíssima gravidade, em que a atividade do produtor rural, incentivada e explorada pela agroindústria, prejudica diretamente a saúde e o bem-estar da população, por criar condições adversas às atividades sociais e afetar desfavoravelmente a biota.
Além disso, a poluição comprovada nos autos afeta as condições sanitárias do meio ambiente e lança matéria em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. Vale lembrar que o destino adequado a dejetos suínos é o lançamento em lavouras ou a compostagem, o que apenas parcialmente foi feito pelo produtor, com a conivência da primeira requerida, já que os dejetos escorriam para a estrada.
Há, portanto, poluição, pois o fato descrito se amolda
perfeitamente ao conceito legal: “Para os fins previstos nesta Lei, considera-se poluição a “degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a)prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b)criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c)afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”1.
5. Responsabilidade civil objetiva pelo dano ambiental
Faz-se mais do que necessária, faz-se verdadeiramente imperiosa a responsabilização civil dos poluidores pelos danos ambientais e pelo ilícito que vêm praticando.
Não apenas pela obrigatoriedade de reparação do dano e retorno ao status quo ante, mas também de modo exemplar, deforma a amoldar a conduta futura da agroindústria e buscar convencê-la (ainda que pela forma mais drástica) do necessário respeito ao Meio Ambiente.
1 Lei nº 6.938/91, art. 9º, III.
Despontam, portanto, as funções sancionatória e dissuasora da responsabilidade civil por dano ambiental, necessidade imposta pela sociedade pós-industrial, marcada pelo crescimento de riscos nos processos produtivos.
Em apoio ao entendimento aqui trazido, Annelise Monteiro Steigleder, Promotora de Justiça de Porto Alegre, lembra que “a responsabilidade civil típica da ‘era tecnológica’ desempenha funções que se desenvolvem em dois âmbitos: como instrumento de regulação social e como mecanismo para a indenização da vítima”.
E, ainda segundo a autora, “no âmbito de ser instrumento de regulação social, a responsabilidade exerce a função de prevenir comportamentos anti-sociais, dentre os quais aqueles que implicam
geração de riscos; de distribuir a carga dos riscos, pelo que se torna otimizadora de justiça social; e de garantia dos direitos do cidadão”2.
Por isso é que se buscará nesta ação não apenas a reparação do dano, mas também a condenação por danos extrapatrimoniais causados ao meio ambiente, única forma de sancionar a agroindústria pelos danos ambientais e ao mesmo tempo dissuadi-la de prosseguir no fomento de atividades lesivas ao meio ambiente.
5.1. Pressupostos da responsabilidade civil
5.1.1. Fato antijurídico
Para o surgimento da obrigação de indenizar na resposabilidade civil, segundo Fernando Noronha, são necessários os seguintes pressupostos: “que haja um fato (uma ação ou omissão
2 Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro.
Porto Alegre : Livraria do Advogado, 2004. p. 178, grifou-se.
humana, ou um fato humano, mas independente da vontade, ou ainda um fato da natureza) que seja antijurídico (isto é, que não seja permitido pelo direito, em si mesmo ou nas suas conseqüências)”3.
No caso narrado nesta ação, os fatos consistiram na ação humana do produtor rural em instalar-se e produzir suínos, por um lado. Por outro lado, of a to consistiu na aquisição, pela agroindústria, dos animais produzidos em propriedade alheia às normas de direito ambiental, bem como no incentivo à produção irregular e não missão em exigir a adequação da atividade.
Tais fatos são inegavelmente antijurídicos, porque ferem a um só tempo a Lei de Crimes Ambientais e a Lei nº 6.938/86, como se observou nos itens anteriores.
5.1.2. Nexo de imputação – responsabilidade objetiva
Para o mesmo professor Fernando Noronha, ainda é pressuposto necessário à configuração da responsabilidade civil “que esse fato possa ser imputado a alguém, seja por se dever à atuação culposa da pessoa, seja por simplesmente ter acontecido no decurso de uma atividade realizada no interesse dela”4.
E, como se nota claramente pela prova produzida no curso das investigações civis levadas a efeito pelo Ministério Público, o fato narrado nesta ação deve ser imputado não apenas ao produtor rural (que por isso já foi responsabilizado criminalmente e deverá suportar a adequação de sua propriedade), mas também e prioritariamente à agroindústria, representada aqui pela Seara
Alimentos S.A. já que a conduta ocorreu no decurso de atividade realizada no interesse dela própria.
3 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. São Paulo : Saraiva, 2003, p. 468.
4 Idem, p. 468.
É preciso recordar neste ponto que a responsabilidade pelos danos ambientais é do tipo objetiva e, por esse motivo, não se traz aqui qualquer argumentação sobre culpa da agroindústria ou do produtor rural.
Novamente cita-se o autor catarinense para observar que “quem exerce profissionalmente uma atividade econômica, organizada para a produção ou distribuição de bens e serviços, deve arcar com todos os ônus resultantes de qualquer evento danoso inerente ao processo produtivo ou distributivo, inclusive os danos causados por empregados e prepostos”5.
O próprio parágrafo único do art. 927 do Código Civil já contém regra explícita a respeito: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
Assim, está presente também no caso dos autos o nexo de imputação, segundo pressuposto da responsabilização civil.
5.1.3. Dano e nexo de causalidade
Continua Fernando Noronha informando ser pressuposto da responsabilização civil “que tenham sido produzidos danos; que tais danos possam ser juridicamente considerados como causados pelo ato ou fato praticado, embora em casos excepcionais seja suficiente que o dano constitua risco próprio da atividade do responsável, sem propriamente ter sido causado por esta”6.
5 Idem, p. 486.
6 Idem, p. 468-469.
Novamente aqui estão presentes os pressupostos no caso específico dos autos. Evidentemente foram produzidos danos, porque a simples operação de atividade em desacordo com a licença ambiental, ainda mais quando se trate de suinocultura (atividade de grande potencial poluidor), por si só causa dano ambiental. Além domais, como constatado pelo relatório do auto de infração ambiental,as esterqueiras existentes transbordavam constantemente, levando os dejetos diretamente à estrada próxima da propriedade.
A atividade da requerida, por sua vez, é causa dos danos, no sentido jurídico do termo. Além do evidente nexo de causalidade com a conduta do produtor rural, também a conduta da Seara
Alimentos causou o dano descrito, já que não fosse a promessa de aquisição dos suínos e a omissão na exigência do respeito às normas ambientais não haveria sequer poluição.
Vale anotar aqui, quanto ao nexo de causalidade, que para os fins da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente considera-se poluidor “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental”7.
A doutrina mais moderna, já calcada nos princípios ambientais do poluidor-pagador, da prevenção e da precaução, ensina ser necessário considerar como poluidor aquele que “tem poder de controle sobre as condições que levam à ocorrência da poluição, podendo portanto preveni-las ou tomar precauções para evitar que ocorram”8.
7 Art. 3º, IV, da Lei nº 6.938/86.
8 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Ambiental: parte geral. 2ª ed. São
Paulo : Revista dos Tribunais, 2005, p. 307, citando Maria Alexandra de Sousa Aragão.
Como é evidente, a requerida Seara Alimentos S.A. tem total controle sobre as condições que levam à poluição, pois, como visto no decorrer da instrução do procedimento investigativo, controlam todo o ciclo produtivo, fornecendo ração, vacinas, assessoria técnica ambiental e veterinária.
Assim, presentes os pressupostos da responsabilização civil (fato antijurídico, nexo de imputação, dano e nexo de causalidade), deve ser imposto à requerida o dever de recuperar a área degradada pelo dano ambiental e compensar a Natureza pelos danos causados.
A compensação é necessária, porque é evidente que a recuperação adequada levará anos e, por princípio básico de direito, não poderá haver dano sem reparação. Além disso, tem a compensação a função de sancionar e dissuadir os poluidores em suas condutas futuras.
6. Liminar obrigação de reparar o dano ambiental
A Natureza, no entanto, não pode aguardar pelo desfecho da ação para só então ver-se reparada. Os danos ambientais decorrentes penderão enquanto não se promover a recuperação ambiental.
Nessa situação, é passível de aplicação o art. 461 do Código de Processo Civil, que determina que “na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento”.
O fundamento da demanda, como se vê, é relevante, porque pautado pela infringência em uma série de dispositivos legais em vigor. Não bastasse isso, o dano ambiental está cabalmente comprovado documentalmente nos autos, como comprova o auto de infração lavrado pela Fatma.
Para tanto, requer desde já o Ministério Público do Estado de Santa Catarina que se determine à Seara Alimentos S.A. a soltura de 5.000 alevinos em curso d´água próximo ao local do dano, no dia seguinte ao da primeira chuva na região, e ao plantio de 200 mudas de árvores nativas em área próxima ao local do dano.
Assim, estão presentes o fumus boni juris e opericulum in mora, sendo caso de deferimento da liminar, inclusive sem a oitiva da parte contrária, para determinar à ré que, sob pena de multa, em 30 dias recupere a área degradada.
7. Compensação ambiental
Como é óbvio, os danos já ocorridos, causados por meses de poluição, e o desrespeito às normas de proteção ambiental, não pode ser reparado diretamente. É preciso, pois, indenização em dinheiro, decorrência natural da adoção pelo direito brasileiro do princípio poluidor-pagador.
Cristiane Derani, dissertando sobre o princípio, sintetiza-o da seguinte forma: “durante o processo produtivo, além do produto a ser comercializado, são produzidas ‘externalidades negativas’. São chamadas externalidades porque, embora resultantes da produção, são recebidas pela coletividade, ao contrário do lucro, que é percebido pelo produtor privado. Daí a expressão ‘privatização de lucros e socialização de perdas’, quando identificadas as externalidades negativas. Com a aplicação do princípio do poluidor-pagador, procura-se corrigir este custo adicionado à sociedade, impondo-se sua internalização. Por isto, este princípio é também conhecido como o princípio daresponsabilidade”9.
Em outras palavras, o poluidor é responsável pelaindenização do custo social de sua atividade poluente, devendo por ela ser responsabilizad o.
Bem por isso – vale lembrar novamente – a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente determina que “é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade”10.
Assim, presente o dano extrapatrimonial, e presente o nexo de causalidade entre o dano e a conduta da requerida, nasce o dever de repará-lo, cabendo indenização pelos danos causados – porto dos os danos –, motivo pelo qual entende-se ser devida indenização.
Tal indenização, como é natural em sede de direitos difusos, deverá reverter ao fundo de reconstituição de bens lesados(art. 13 da Lei nº 7.347/85). Em Santa Catarina, o Fundo para Reconstituição dos Bens Lesados foi criado pelo Decreto nº 1.047, de10 de dezembro de 1987.
8. Pedidos
Ante o exposto, requer o Ministério Público:
9 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 4ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005. p.
164.
10Art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81.
a) o recebimento, registro e autuação da presente ação
civil pública;
b) a concessão de liminar para determinar que em trinta dias, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00, a requerida Seara Alimentos S.A.:
b1) solte 5.000 alevinos de espécies nativas, no Rio Caçador, em Seara, após a primeira chuva, comprovando em juízo mediante relatório subscrito por técnico ambiental;
b2) plante em local próximo ao dano (mínimo de 2km de raio de distância) 200 mudas de árvores nativas, comprovando em juízo mediante relatório subscrito por técnico ambiental;
c) a citação da requerida para, querendo, apresentar a defesa que entender pertinente;
d) a produção de todos os meios de prova admitidos, notadamente a prova pericial, depoimento pessoal, prova documental e testemunhal, se for necessário;
e) a condenação da requerida a recompor o dano ambiental causado, tornando definitiva a liminar, com a soltura de5.000 alevinos e o plantio de 200 mudas de árvores nativas;
g) a condenação da requerida ao pagamento de compensação ambiental decorrente de sua conduta poluidora, em
valor a ser arbitrado na sentença, não inferior a R$ 30.000,00, em favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina;
h) a condenação da requerida em custas, despesas processuais e honorários advocatícios (estes conforme art. 4º do Decreto Estadual nº 2.666/04, em favor do Fundo de Recuperação
de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina).
Dá-se à causa o valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil
reais).
Seara, 14 de abril de 2009
Eduardo Sens dos Santos
Promotor de Justiça
Link: http://pt.scribd.com/doc/38007489/068-09-clair-simoni-e-seara-alimentos-dano-ambiental-responsabilizacao-empresa
Postado por
Luiz Salvador, Ex-Presidente da ABRAT (www.abrat.adv.br), Presidente da ALAL (www.alal.com.br), Diretor do Depto. de Saúde do Trabalhador da JUTRA (www.jutra.org), assessor jurídico de entidades de trabalhadores, membro integrante, do corpo técnico do Diap, do corpo de jurados do TILS – Tribunal Internacional de Liberdade Sindical (México), da Comissão Nacional de Relações internacionais do CF da OAB Nacional e da Comissão de “juristas” responsável pela elaboração de propostas de aprimoramento e modernização da legislação trabalhista instituídas pelas Portarias-MJ 840, 1.787, 2.522/08 E 3105/09, E-mail: luizsalv@terra.com.br, site: www.defesadotrabalhador.com.br
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