quarta-feira, 16 de maio de 2012

UNICIDADE CONTRATUAL: O princípio da primazia da realidade não se compatibiliza com qualquer gesto capaz de dar prevalência ao documento formal

                                              Foto: Juiz Grijalbo Courinho

O Juiz do Trabalho da 19ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, Dr. Grijalbo Coutinho afastou a alegação do Banco Safra de existência de dois contratos distintos, em razão da qual o banco pleiteava a aplicação do instituto da prescrição no primeiro contrato de trabalho. O Juiz Grijalbo Coutinho examina também a questão da terceirização fraudulenta que se praticou, visando o afastamento dos direitos bancários pleiteados.  

Do conjunto probatório produzido nos autos, o magistrado Grijalbo Courinho desconsiderou as alegações da defesa e com base no princípio da realidade, reconhecendo a unicidade contratual, a ilegalidade da intermediação e afastou a prescrição pretendida pelo banco  e deu provimento ao pedido da reclamante como empregada bancária condenando o banco aos créditos trabalhistas bancários e seus consequentes.

Leia a íntegra da sentença:

  

PROCESSO:0001275-40.2011.5.10.0019-

RECLAMANTE: PATRÍCIA CRUZ DA SILVA    

RECLAMADOS: BANCO SAFRA S.A, PROMO 7 RECURSOS E PATRIMÔNIO HUMANO LTDA e S&A PERSONNALITE MARKETING LTDA











S E N T E N Ç A





RELATÓRIO



PATRÍCIA CRUZ DA SILVA  ajuizou ação trabalhista em desfavor de BANCO SAFRA S.A, PROMO 7 RECURSOS E PATRIMÔNIO HUMANO LTDA e S&A PERSONNALITE MARKETING LTDA, postulando a nulidade dos contratos formais celebrados com as duas últimas reclamadas e consequente reconhecimento do vínculo de emprego único com o banco(1º reclamado),no período de 05 de maio de 2008 a 11 de dezembro de 2009, além das pertinentes retificações de registros lançados em sua CTPS. Pretende a obreira ser enquadrada como bancária durante todo o pacto laboral para assim obter o pagamento  das horas extras além da sexta diária e reflexos sobre o RSR,auxilio alimentação,cesta alimentação,Participação nos Lucros e Resultados-PLR, intervalo intrajornada, indenização proveniente da manutenção do veículo, indenização por perdas e danos pela utilização de seu veículo no desenvolvimento das atividades laborais,multas convencionais e concessão dos benefícios da justiça gratuita, nos termos da petição inicial(fls.02/22), que veio acompanhada dos documentos de fls. 25/155.

À causa foi atribuído o valor de R$100.000,00(cem mil reais).

Defendendo-se(fls.174/193), o primeiro reclamado requer a decretação da prescrição total concernente ao primeiro contrato de trabalho mantido entre 04 de setembro e 30 de outubro de 2008. No mérito, o banco sustenta a legalidade da terceirização promovida e a impossibilidade do enquadramento da autora como bancária nos períodos em que ela manteve vínculo formal com empresas prestadoras de serviços. Impugna, ainda, os pleitos de horas extras, reparação por utilização de veículo(indenização de combustível), PLR de 2008, multas convencionais e  concessão dos benefícios da justiça gratuita. Colacionados os documentos de fls. 199/249.

Em sua contestação(fls. 251/262), a segunda reclamada  também requer a decretação da prescrição total quanto ao contrato formal mantido com a autora de 05 de maio a 14 de julho de 2008 para, no mérito, refutar o pleito obreiro de enquadramento profissional bancário e demais consectários. Exibidos os documentos de fls. 263/279.

A terceira reclamada argui preliminar de inépcia da inicial. No mérito, impugna os pedidos de horas extras, enquadramento bancário, reparação pelo uso do veículo, multas dos artigos 467 e 477, da CLT, e concessão dos benefícios da justiça gratuita(fls.280/293). A defesa veio acompanhada dos documentos de fls. 294/308 e 312.

Réplica da autora a fls.316/332.

Produzida a prova oral(fls. 350/357) e sem outros elementos, a instrução processual foi encerrada.

Razões finais orais.

Infrutíferas as tentativas conciliatórias.

Resumidamente, é o Relatório,



FUNDAMENTOS



INÉPCIA DA INICIAL

A  terceira reclamada agita preliminar de inépcia da inicial sob o argumento de a autora, “de forma confusa”(fl.283), segundo enfatiza a defesa, formula pedido de reconhecimento de vínculo empregatício com o primeiro reclamado, Banco Safra S.A, para logo depois requerer a decretação da responsabilidade subsidiária da referida instituição financeira.

Sem razão a demandada.

Nota-se que a reclamante pretende obter o vínculo  de emprego com o primeiro reclamado(fl.17). Apenas em caráter sucessivo, equivocadamente denominado na inicial de pedido alternativo(fl.18),a obreira pede a condenação subsidiária do banco, desde que rejeitada a tese principal da existência da relação de emprego direta com o Safra.

Logo, não há a confusão descrita na defesa da terceira reclamada. Está claro o movimento empreendido pela trabalhadora para alcançar o reconhecimento da relação de trabalho única com o Banco Safra S.A. Se não for possível, pede ao menos seja decretada a sua responsabilidade subsidiária pela qualidade de tomador de serviços, o que é típico caso de pleito sucessivo, na forma assim prevista na  legislação processual civil, jamais de pedido alternativo.

A inicial preenche os requisitos do artigo 840,§1º, da CLT,sem que os demandados tenham encontrado qualquer dificuldade para impugnar as pretensões obreiras, tudo a revelar o respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Rejeita-se a prefacial.



PRESCRIÇÃO TOTAL. CONTRATO DE TRABALHO FORMAL MANTIDO ENTRE  04 DE SETEMBRO A  30 DE OUTUBRO DE 2008

Pugna a defesa da   segunda reclamada  pela decretação da prescrição total de exigibilidade das parcelas relativas ao contrato de trabalho formal  mantido entre a reclamante e a empresa  Promo 7 Recursos de Patrimônio Ltda, no período de 05 de maio a 14 de julho de 2008.

No mesmo sentido, o primeiro reclamado, Banco Safra S.A, diz que manteve dois contratos de trabalho com a autora, de 04 de setembro a 30 de outubro de 2008 e de 07 de maio a 11 de dezembro de 2009. Por isso mesmo, com o ajuizamento da ação em  17 de agosto de 2011, requer a aplicação da prescrição bienal e total no concernente a eventuais direitos do pacto vigente entre setembro e outubro de 2008. 

A reclamante, na exordial, afirma que manteve um único contrato de trabalho com o  primeiro Reclamado, Banco Safra S.A, entre  05 de maio de 2008 e 11 de dezembro de 2009, embora tenham sido feitos registros fraudulentos em sua CTPS dando conta da existência de vínculos com  empresas prestadoras de serviços para as quais efetivamente não laborou,assim como durante um determinado lapso temporal nenhuma anotação foi lançada naquele documento. As irregularidades teriam sido praticadas pelo seu verdadeiro empregador, Banco Safra S.A.

Os reclamados, evidentemente, impugnam os fatos narrados pela autora, como vimos antes.

Nesse caso, antes de aplicar ou rejeitar a prejudicial de mérito, é preciso avaliar  se de fato  houve ou não a  indicada unicidade contratual.

E assim o é porque a unicidade define o tempo de vigência do contrato ou, em caso negativo, faz prevalecer os registros postos na CTPS obreira com as interrupções ali vistas. Ademais, estamos cuidando de Direito do Trabalho cujo princípio da primazia da realidade não se compatibiliza com qualquer gesto capaz de dar prevalência ao documento formal em detrimento do que sucede no terreno dos fatos(Plá Rodriguez).

Aceitar os registros formais sem investigar  suposta  situação fática  distinta daquela presente na CTPS, para fins de incidência da prescrição, significa o absoluto desprezo ao    Direito do Trabalho  estruturado  na  gênese construída para ser nem mais nem menos do que  a expressão  da  dura e crua realidade.

Em outras palavras, somente é possível falar em prescrição após verificar qual foi de fato o período de vigência do contrato ou dos contratos de trabalho.

Percebe-se que a autora aponta o período de vigência de contrato único no período de   05 de maio de 2008 e 11 de dezembro de 2009, tendo sido ajuizada a presente ação no dia 17 de agosto de 2011(fl.02). Caso prevaleça a tese obreira, registre-se, não haverá nenhuma a prescrição a ser pronunciada.

Observando tais parâmetros, será analisada a matéria controvertida nos autos.



CONFISSÃO FICTA DA TERCEIRA RECLAMADA. PREPOSTO NÃO EMPREGADO

Ao prestar depoimento pessoal,o preposto da terceira reclamada(S&A PERSONNALITE MARKETING LTDA), Marcos Vinícius Santos Silva(fl.350),declarou que jamais manteve vínculo de emprego com a referida demandada, sendo, na verdade, empregado de empresa distinta “que funciona como uma espécie de escritório da terceira reclamada” em Brasília-DF(fl.354).

Requereu a autora a decretação da confissão ficta da terceira reclamada pelo fato de  se fazer ela representar em audiência por preposto não empregado(fl.354).

Tem razão a reclamante.

Sem a existência de qualquer vínculo entre o preposto e a representada, tem-se como ausente à audiência de instrução a terceira reclamada, o que lhe acarreta a aplicação da confissão ficta a ser sopesada e relativizada diante dos demais elementos existentes nos autos, considerando que a confissão de uma das  acionadas não atinge em absolutamente nada  as demais empresas  regularmente representadas.



VÍNCULO DE EMPREGO COM O BANCO. PERÍODO. TERCEIRIZAÇÃO. FRAUDE. NULIDADE DE CONTRATOS FORMAIS MANTIDOS COM AS EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS. UNICIDADE CONTRATUAL. REGISTROS E RETIFICAÇÕES NA CTPS. ENQUADRAMENTO BANCÁRIO

A reclamante alega que manteve vínculo de emprego com o primeiro reclamado, Banco Safra S.A, no período de 05 de maio de 2008 a 11 de dezembro de 2009, onde exerceu a função de Promotora de Venda de Crédito Consignado, cujo último salário importou em R$1.716,43(um mil,setecentos e dezesseis reais e quarenta e três centavos).

Afirma a autora que não obstante ter trabalhado exclusivamente para o primeiro reclamado, com quem mantinha relação de emprego direta, o Banco Safra S.A praticou irregularidades trabalhistas diversas para negar a realidade. Em primeiro lugar, promoveu o  banco   anotações fraudulentas em sua CTPS como se tivesse  sido ela  empregada da segunda reclamada, Promo 7 Recursos e Patrimônio Ltda, de 05 de maio a 14 de julho de 2008, e da terceira demandada, Personnalite Marketing Ltda, de 16 de julho a 03 de setembro de 2008. Depois, ao anotar a CTPS, o Banco Safra S.A somente o fez  quanto aos períodos de  04 de setembro a 30 de outubro de 2008 e de 07 de maio a 11 de dezembro de 2009, ignorando, assim, o lapso temporal compreendido entre 31 de outubro de 2008 e 06 de maio de 2009.

Enfatiza a autora que trabalhou para o Banco Safra S.A, sem solução de continuidade, no período de 05 de maio de 2008 a 11 de dezembro de 2009, na qualidade de bancária.

Defendendo-se, o primeiro reclamado,  Banco Safra S.A, sustenta que a reclamante foi sua empregada em dois períodos distintos, quais sejam: 04.09.2008 a 30.10.2008 e de 07.05.2009 a 11.12.2009. Nos demais períodos anotados em sua CTPS,a prestação laboral se deu por intermédio do processo de terceirização de mão de obra junto às demais reclamadas.

As outras demandadas,Promo 7 Recursos e Patrimônio Ltda e Personnalite Marketing Ltda,nas peças contestatórias respectivas, também impugnam as assertivas obreiras em nome da regularidade da atuação como empresas terceirizantes, prestadoras de serviços do Banco Safra S.A, conforme períodos registrados na CTPS da reclamante.

Destaca-se, inicialmente, o inteiro teor da prova oral produzida nos autos: 



Depoimento pessoal da reclamante: “que foi entrevistada pelo primeiro reclamado, por intermédio da gerente Carla Menezes, mas depois a depoente verificou que a sua CTPS foi anotada pela segunda reclamada, cujo período respectivo encontra-se anotado em sua CTPS (fls 14), de 05 de maio a 14 de julho de 2008; que todas as suas atividades foram desenvolvidas nas dependências do primeiro reclamado, Banco Safra S/A, época em que comercializava para o banco crédito consignado; que recebia orientações e determinações dos representantes do primeiro reclamado; que trabalhava das 09h às 19h/19h30, com 30 minutos de intervalo, de segunda a sexta-feira; que iniciava e encerrava a sua jornada nas dependências do banco; que deixava a agência diariamente a fim de comercializar o denominado crédito consignado; que mesmo após o registro do término do contrato, em 14/07/2008, a depoente continuou trabalhando normalmente para o primeiro reclamado, até 11/12/2009; que a CTPS da depoente era solicitada pela gerente do primeiro reclamado para fazer anotações; que a depoente perguntava à gerente Carla Menezes o motivo pelo qual a sua CTPS não estava anotada pelo primeiro reclamado, dizendo ela que se tratava de problema meramente formal; que embora sua CTPS tenha sido anotada pelas outras reclamadas, o seu labor sempre foi prestado, na mesma rotina, para o banco reclamado, na jornada compreendida entre 09h e 19h/19h30, com 30 minutos de intervalo, de segunda a sexta-feira; que não se recorda do dia exato em que a sua CTPS foi anotada pelo primeiro reclamado; que a depoente tinha a expectativa de sua CTPS ser anotada pelo Banco Safra toda vez que o documento era solicitado pela gerente daquele banco; que o registro de término do contrato pelo banco foi feito, na CTPS, no final do ano de 2009; que não houve rescisão contratual antes do efetivo término do contrato de trabalho; que assinou alguns documentos apresentados pelos gerentes do primeiro reclamado, Carla Menezes e Marcelo, entre os quais pode estar incluído o de fls. 205; que nem sempre lia os documentos apresentados pela Sra Carla para sua assinatura; que não se recorda de ter usufruído de Seguro Desemprego antes da data efetiva do término do contrato de trabalho; que não houve interrupção na prestação laboral para o primeiro reclamado entre maio/2008 e dezembro/2009, embora existam registros na CTPS revelando alguma interrupção na prestação de serviços; que mesmo no período sem registro na CTPS, a depoente continuou executando as mesmas tarefas desenvolvidas ao longo do contrato, cuja rotina era a seguinte: a depoente ingressava na agência bancária às 09 horas, depois recebia determinação da Sra Carla ou do Sr. Marcelo, com a indicação dos locais que deveria se dirigir (órgãos a serem procurados); que a depoente, ao chegar nos locais indicados, panfletava de sala em sala a fim de prospectar clientes; que os clientes depois ligavam para a depoente ou naquele momento já pediam para que fosse feita a simulação de contrato de consignação; que a depoente retornava à agência bancária a fim de digitar o contrato de empréstimo, imprimindo o documento e o levando ao cliente para a respectiva assinatura; que digitava o contrato a ser celebrado com o cliente mediante uso de sistema do primeiro reclamado (intranet), tudo com a utilização de senha fornecida pela gerente Carla Menezes; que recebeu a referida senha desde o momento em que foi contratada, no ano de 2008, ou seja, antes da contratação formal pelo banco; que tinha autorização para conceder empréstimos, conforme tabelas disponíveis no sistema; que para não perder clientes, a depoente, via sistema, entrava em contato com a matriz do banco a fim de conseguir taxas menores no contrato de financiamento pela modalidade consignação; que diante das tarefas executadas e da necessidade de retornar à agência bancária diversas vezes por dia, a depoente tinha de usar o seu próprio veículo para se deslocar ao trabalho e retornar à residência; que não era possível trabalhar para o banco, no exercício da função desempenhada, sem que o empregado tivesse veículo próprio; que chegou a solicitar o fornecimento de vale transporte, tendo recebido, durante três ou quatro meses, cartão (tíquete) de vale gasolina; que à época da prestação laboral residia em Samambaia Sul, encontrando-se, naquela época, vinculada à agência bancária do primeiro reclamado situada no Setor Comercial Sul, Quadra 6, Bloco H; que geralmente trabalhava em dupla, cada empregada fazendo uso de seu próprio veículo; que geralmente o primeiro reclamado designava uma dupla para cada órgão a ser visitado; que cada integrante da dupla pegava um andar para ser visitado nos diversos órgãos, cujo atendimento de cada cliente era feito de forma isolada; que cada integrante da dupla acompanhava a rotina da outra colega de trabalho; que na maioria das vezes a depoente não trabalhava em dupla, o que dependia sempre do tamanho do órgão a ser atendido; a depoente esclarece que por atender mais de um órgão durante o dia, trabalhava diariamente em dupla e outras vezes de forma isolada; a depoente esclarece que apenas quando se dirigia à Justiça Federal, o que ocorria diariamente por volta das 17h às 17h30 trabalhava sem a companhia de outra colega; que durante os demais horários e perante outros órgãos a depoente trabalhava em dupla; que trabalhava em dupla no TJDFT, diariamente, no horário das 12h às 13h30; que no restante do expediente, a depoente permanecia nas dependências do banco, como também se dirigia à KPMG, empresa que mantinha convênio com o Banco Safra, na área de empréstimo consignado para os seus empregados; que se dirigia sozinha à KPMG três ou quatro vezes por mês, geralmente no início do mês; que as duplas de trabalho não eram sempre as mesmas; que as duplas de trabalho eram definidas pelos gerentes do Banco Safra, Marcelo e Carla; que trabalhavam nas mesmas condições da depoente entre dez e onze pessoas; que não participou de nenhum treinamento promovido pela segunda reclamada; que apenas ouviu falar no nome da preposta da segunda reclamada, jamais tendo mantido contato direto com ela; que fez a solicitação de fls. 263 seguindo orientação da gerente Carla Menezes, época em que sua CTPS já estava anotada pela segunda reclamada; que não tinha autonomia para analisar a ficha cadastral de cliente, tarefa própria do banco demandado; que a depoente tinha carteira de clientes, cuja senha pessoal que lhe foi fornecida dava acesso ao sistema SERASA; que o seu horário de trabalho era controlado, inclusive no que se refere ao tempo destinado para almoço; que entre os dias 17 e 30 de cada mês, quando eram averbados os contratos dos tribunais, a depoente realizava a maior parte de suas tarefas em caráter externo; que não recebeu nenhum depósito bancário a título de pagamento de rescisão contratual antes da data efetiva da extinção do contrato, no ano de 2009; que já teve a conta bancária identificada na transferência de fls. 274, embora não tenha, de fato, efetuado qualquer rescisão contratual antes de dezembro/2009; que constantemente a gerente Carla pedia a CTPS da depoente; que assim como os demais documentos assinados, também o de fls. 267 restou firmado a partir de solicitação da gerente Carla; que fazia relatórios de vendas e planilhas, os quais eram entregues ao sub gerente Marcelo, do Banco Safra; que não se recorda de ter mantido qualquer contato com preposto ou representante da segunda e terceira reclamadas”.



Depoimento pessoal da preposta do primeiro reclamado: “que a reclamante trabalhou para o primeiro reclamado de setembro a outubro de 2008 e de maio a dezembro de 2009, onde exerceu a função de operadora de crédito consignado; que no primeiro contrato a reclamante cumpria jornada diária de seis horas, das 09:00 às 16:00 horas, com intervalo de uma hora, de segunda a sexta-feira, horários esses que também foram cumpridos durante os primeiros três meses de vigência do segundo contrato; que depois a reclamante passou a cumprir jornada diária de oito horas, das 09:00 às 18:00 horas, com uma hora de intervalo para almoço, com a percepção de duas horas extras; que na condição de trabalhadora em caráter externo, embora a jornada contratual fosse aquela declarada anteriormente, a reclamante poderia escolher o horário de trabalho de sua conveniência; que a reclamante trabalhou para as duas últimas reclamadas no ano de 2008, cujo período a depoente não pode precisar, também na função de promotora de crédito consignado, empresas as quais mantinham contratos de prestação de serviço com o primeiro reclamado; que embora comercializasse produto final do banco (crédito consignado), a reclamante não frequentava a agência bancária no período em que trabalhou para as prestadoras de serviços; que não sabe precisar desde quando o Banco Safra, primeiro reclamado, mantém contratos de prestação de serviços com as outras reclamadas, mas é certo que tais pactos existem desde o ano de 2008; a depoente reitera que no período em que a reclamante trabalhou para a segunda e terceira reclamadas, o fez sempre na venda de produtos do primeiro reclamado; que não trabalhou diretamente com a reclamante; que antes do contrato formal celebrado com primeiro reclamado, a reclamante, para o desempenho de suas funções, fazia uso de material fornecido pelas prestadoras de serviços; que não havia nenhum preposto das reclamadas prestadoras de serviços no período em que a reclamante manteve vínculo com tais empresas; que o primeiro reclamado não controlava o horário de trabalho da reclamante quando ela trabalhava para as prestadoras de serviços, daí porque não tem como indicar o horário cumprido pela autora naquela época; que o primeiro contato que a reclamante manteve com o representante do primeiro reclamado se deu em setembro de 2008, não sabendo informar o nome da pessoa que em nome do banco conversou com a reclamante; a depoente reitera que na época em que a reclamante era empregada das reclamadas prestadoras de serviços, comercializava ela produto do primeiro reclamado, qual seja, crédito consignado, sem que comparecesse à agência bancária; que a reclamante não manteve qualquer vínculo com o banco entre outubro de 2008 e maio de 2009; que a reclamante, no período em que trabalhou para as prestadoras de serviços, tinha a senha fornecida pelas referidas empresas, sem nenhuma relação com o banco, a não ser para cadastro de clientes; que a Sra. Carla Menezes foi empregada do primeiro reclamado, tendo exercido, salvo engano, a função de gerente de crédito consignado, cujo período a depoente não pode precisar; que não conhece o Sr. Marcelo Farias; que não sabe indicar os endereços das reclamadas prestadoras de serviços; que a reclamante, no período em que foi empregada das prestadoras de serviços, se reportava aos representantes dessas empresas; que nesse período, a carteira de clientes também era controlada pelas prestadoras de serviços; que o primeiro reclamado fornece vale-transporte a todos os operadores de crédito consignado, desde que assim haja solicitação por parte dos empregados; que a reclamante não era obrigada a utilizar veículo próprio para o desempenho de suas funções; que não pode precisar se a reclamante fazia uso de veículo próprio para esse fim".



Depoimento pessoal da preposta da segunda  reclamada: “que a segunda reclamada manteve contrato de prestação de serviços com o primeiro reclamado (Banco Safra) no período de abril a agosto de 2008, para executar as mais diversas atividades, incluindo a venda de crédito consignado; que a reclamante foi empregada da segunda reclamada no período de 05 de maio a 14 de julho de 2008, onde exerceu a função de Promotora de Crédito Consignado, crédito consignado o qual era oferecido pelo primeiro reclamado; que nessa época a reclamante trabalhava das 09h às 18h, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira; que a reclamante visitava órgãos os quais mantinham convênio com o Banco Safra para oferecimento de crédito consignado, não tendo que necessariamente passar em algum estabelecimento para iniciar e findar a sua jornada; que quando precisava pegar algum panfleto para fazer divulgação, a reclamante se dirigia ao Banco Safra, no SCS; que a reclamante se dirigia ao escritório da segunda reclamada, em Taguatinga/DF, quando era convocada para participar de reuniões; que a depoente é empregada da segunda reclamada; que não havia nenhum preposto da segunda reclamada trabalhando nas dependências da agência bancária do primeiro reclamado; que a partir de reunião convocada pela depoente, a gerente do primeiro reclamado, Sra Carla Menezes, passava a relação de clientes a serem visitados pelos promotores de vendas, bem como entregava material de expediente, encontros os quais normalmente aconteciam em hotéis; que deu treinamento à reclamante mais de uma vez, em hotéis, os quais a depoente não pode precisar; que a segunda reclamada administrava todo o trabalho prestado pelos seus promotores; que entre maio e julho de 2008 a reclamante comercializou apenas produto do primeiro reclamado; que a reclamante fazia a fiscalização do seu horário de trabalho; que cerca de dez empregados da segunda reclamada comercializavam produtos do primeiro reclamado entre maio e julho de 2008, incluindo a reclamante; que a reclamante não precisava comparecer à agência do primeiro reclamado de forma diária; que a reclamante somente comparecia à agência bancária quando precisava fechar algum contrato de crédito consignado; que a reclamante não conseguia fechar contratos de forma diária; que a finalização do contrato de crédito consignado era feito sempre na agência bancária do primeiro reclamado, no SCS, o que dependia sempre da análise por parte dos representantes do primeiro reclamado”.



Depoimento pessoal do preposto da terceira reclamada: “que o terceiro reclamado manteve contrato de prestação de serviços com o primeiro reclamado, para comercialização de crédito consignado, no ano de 2008, durante quatro meses, aproximadamente; que a reclamante foi empregada da terceira reclamada durante 60 dias, aproximadamente, de 16 de julho a 03 de setembro de 2008, onde exerceu a função de Promotora de Consignação de Crédito, quando trabalhou das 09h às 18h, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira; que a reclamante não realizou horas extras; que nessa época a terceira reclamada encontrava-se estabelecida na cidade de São Paulo/SP, com escritório em Brasília/DF, em Taguatinga Norte; que na época oito pessoas trabalhavam no escritório de Taguatinga; que não sabe se a reclamante tinha um local para iniciar e terminar a jornada, no período antes declinado; que a reclamante esteve no escritório de Taguatinga apenas para formalizar a sua contratação; que o depoente é empregado da prestadora de serviços denominada "Vínculos Promoções de Eventos", empresa a qual é coligada da terceira reclamada; que a sua empregadora funciona em Brasília como um espécie de escritório da terceira reclamada; que não há identidade de sócios entre a terceira reclamada e a empregadora do depoente; que as informações aqui prestadas decorrem de relatos repassados pela terceira reclamada à empregadora do depoente”.



 Depoimento da Primeira testemunha do reclamante: DANIELA FERNANDES RIBEIRO: "que trabalhou para o primeiro reclamado no período de maio/2008 a fevereiro/2011, onde exerceu as funções de Operadora de Crédito Consignado (até outubro ou novembro de 2010, aproximadamente) e de Assistente de Gerente (durante os nove últimos meses de vigência do contrato); que apesar de ter sido entrevistada e contratada pelo primeiro reclamado, a depoente, ao receber a sua CTPS, percebeu que o documento havia sido anotado pela segunda reclamada, com quem jamais manteve qualquer tipo de contato; a depoente esclarece que a sua CTPS foi anotada pela segunda reclamada durante os primeiros três meses de vigência do contrato, com o registro seguinte feito pelo Banco Safra (primeiro reclamado); que logo depois da contratação da depoente, a reclamante passou a trabalhar para o primeiro reclamado, laborando ao lado da depoente, também na função de Operadora de Crédito Consignado; que a reclamante não tinha contato com a segunda reclamada; que a depoente e a reclamante, desde o início da contratação, laboravam nas dependências do primeiro reclamado, mais especificamente no subsolo da agência bancária, no SCS, onde havia espaço destinado ao crédito consignado; que a rotina de trabalho da reclamante e da depoente era a mesma, época em que se reportavam ao supervisor Marcelo e à gerente Carla Menezes, ambos empregados do Banco Safra; que a segunda reclamada era uma desconhecida no ambiente de trabalho; que a rotina também era idêntica em relação à jornada de trabalho, pois o que alternava era apenas os órgãos atendidos; a depoente acredita que a reclamante foi dispensada depois da crise financeira de 2009, crise a qual teve início em setembro de 2009, quando começou o desligamento de empregados do primeiro reclamado; que a reclamante não se afastou do trabalho entre maio/2008 e dezembro/2009, com a prestação ininterrupta de serviço naquele lapso temporal; a depoente acredita que a CTPS da reclamante depois foi anotada pelo primeiro reclamado, pois foi esse o procedimento adotado em relação aos empregados ocupantes da função de Operador de Crédito Consignado; que na qualidade de Operador de Crédito Consignado, a depoente e a reclamante trabalhavam das 09h às 18h30/19h e até às 20 horas nos dias de pico (primeiros dez dias do mês), com intervalo de 30 minutos para almoço, tempo esse que praticamente não existia nos dias de pico; que normalmente a reclamante trabalhava em jornada mais elastecida do que aquela cumprida pela depoente, no que se refere ao término; que tinham obrigação de comparecer à agência bancária no início e final da jornada diária; que a depoente foi entrevistada pela gerente Carla Menezes para ser contratada em maio/2008, tendo presenciado outras entrevistas realizadas pela mesma pessoa; que a depoente não foi informada, no ato da entrevista, de que a contratação formal se daria pela segunda reclamada; a depoente acredita que a reclamante também não foi informada de sua contratação por empresa prestadora de serviços; que até o ano de 2010 não havia registro dos horários laborados em qualquer folha ou cartão de ponto; que desde o início da prestação laboral, todo o material de expediente utilizado pelos Operadores de Crédito Consignado pertencia ao primeiro reclamado; que desde o início da prestação laboral, a depoente e a reclamante tinham acesso a dados cadastrais dos clientes do primeiro reclamado (saldo, aplicações, número de telefone e outros); que sempre tiveram senhas para abrir o sistema eletrônico, inclusive para digitar e imprimir contratos, senhas pessoais que foram fornecidas pela gerente Carla Menezes; que no início estavam subordinadas diretamente ao supervisor Marcelo, que repassava todas as informações à gerente Carla; que depois da saída do Sr. Marcelo, passaram a se reportar diretamente à gerente Carla; que a segunda reclamada jamais teve qualquer tipo de ingerência nas atividades desenvolvidas pela depoente e também pela reclamante; que jamais manteve qualquer contato com a preposta da segunda reclamada, Sr. Girlaine, tendo conhecido a referida pessoa apenas no momento da realização de sua audiência na Justiça do Trabalho; que jamais tomou conhecimento de ter a Sr. Girlaine dado qualquer curso de treinamento aos empregados dos reclamados; que a depoente trabalhava no oferecimento de crédito consignado a empregados da Rede Globo e a funcionários do TJDFT, isto até o ano de 2009; que a reclamante trabalhava mais com órgãos públicos, entre outros, no TJDFT e TRT-10; que na qualidade de Operadora de Crédito Consignado, a depoente passava na agência bancária diariamente, no início do expediente, para levantamento de dados e realização de projeções sobre possíveis contratos; que de posse dos dados necessários, a depoente se dirigia aos órgãos e empresas a fim de abordar clientes; que alcançando êxito nas tentativas, a depoente retornava à agência a fim de formalizar os respectivos contratos; que os contratos eram enviados por meio eletrônico ao cliente ou impressos para a respectiva assinatura; que depois de assinados os contratos retornavam à agência para a respectiva digitalização e liberação do crédito ao cliente; que essa rotina também era seguida pela reclamante e pelos demais Operadores; que normalmente a depoente trabalhava sozinha; que em algumas ocasiões a depoente se fazia acompanhar de outro empregado; que não pode precisar os horários em que a reclamante trabalhava em caráter externo, até porque, além da variação existente, a depoente atendia outros clientes; a depoente reitera que a rotina de todos os operadores era a mesma, inclusive quanto ao horário de trabalho; que não acompanhava o horário de almoço da reclamante, mas é certo que todos os Operadores de Crédito Consignado seguiam uma mesma rotina; que quando foi promovida ao cargo de Assistente de Gerente, em 2010, a depoente passou a trabalhar em espaço físico diferente, na mesma agência, no térreo da agência bancária; a depoente esclarece que desde o início da prestação de serviços tinha acesso ao saldo de conta corrente do cliente e também ao saldo devedor de contrato de empréstimo consignado existente; que a segunda reclamada não promoveu o registro do término do contrato em sua CTPS".



A reclamante, em depoimento pessoal, ratificou os termos da inicial, nominando a  empregada do Banco Safra S.A responsável pela sua contratação, a quem também estava subordinada, além do outro superior hierárquico, sem que fosse possível, pois, alcançar a sua confissão.

Admitiu a preposta do primeiro reclamado que a prestação laboral obreira foi desenvolvida em prol do banco, ora na qualidade de empregada, ora na condição de terceirizada, no exercício da função de Operadora de Crédito. Mesmo que não exista uma confissão contundente, chama atenção  o aproveitamento da mão de obra sob as  duas formas antes anunciadas.

A preposta da segunda reclamada informa que a reclamante foi sua empregada no período de abril a agosto de 2008, quando manteve  contrato de prestação de serviços com  Banco Safra S.A voltado para comercialização de  crédito consignado e outros produtos bancários. Confessou a representante empresarial quer a finalização dos contratos  de crédito consignado se dava exclusivamente nas dependências do primeiro reclamado, Banco Safra S.A, no Setor Comercial Sul, para onde a reclamante se dirigia a fim de  obter a aprovação ou não das propostas.

A terceira reclamada foi declarada confessa. O preposto presente à audiência de instrução não manteve, nem mantém qualquer vínculo com a referida empresa. Essa confissão ficta porém é relativizada, considerando que o primeiro reclamado sustenta a regularidade do processo de terceirização promovido por intermédio de  Personnalite Marketing Ltda.

Se os indícios eram fortes no sentido de referendar a tese da intermediação ilícita de mão de obra, conforme observações antes feitas, a única testemunha ouvida, Daniela Fernandes Ribeiro, numa firmeza impressionante e muito convincente em todas as suas declarações, atestou a prática de escancarada fraude trabalhista contra a reclamante.

Disse a testemunha, sem titubear em  momento algum  sobre qualquer pergunta a ela dirigida, que a reclamante trabalhou para o Banco Safra S.A de maio de 2008 a dezembro de 2009, sem que jamais tenha se afastado de suas funções laborais durante esse lapso temporal. A reclamante, durante todo o  período, de maio de 2008 a dezembro de 2009, esteve subordinada diretamente aos representantes do Banco, Supervisor Marcelo e Gerente Carla Menezes, tendo sido entrevistada e contratada por esta última pessoa. A auxiliar do juízo  foi ainda  mais longe, ao declarar que também foi vítima da mesma fraude trabalhista, pois contratada pelo Banco Real S.A, depois percebeu que a sua CTPS foi anotada durante algum tempo pela segunda reclamada, empresa que jamais conheceu, nem mesmo alguma representante da prestadora de serviços. A ação irregular do banco, ao forjar terceirizações inexistentes, estaria fundada na lógica da redução de custos numa época de crise financeira(2008 e 2009).



Não faltam detalhes da operação promovida pelo Banco Real S.A para sonegar direitos trabalhistas aos seus empregados. O depoimento testemunhal é incisivo e poderia inclusive, numa nação que zelasse efetivamente pelos direitos humanos dos trabalhadores, trazer maiores consequências políticas para uma entidade financeira que não satisfeita com os lucros exorbitantes obtidos na sua atuação autorizada pelo Banco Central,comete desatinos sociais contra os setores mais frágeis da sociedade brasileira, a ponto de não apenas terceirizar para diminuir custos, mas de fraudar os próprios  contratos de terceirização.



Normalmente, em casos como esse, faço uma abordagem a respeito da terceirização bancária e das resoluções do Banco Central que cuidam da matéria, revelando não ser possível terceirizar na atividade-fim bancária, como é a da comercialização de crédito consignado.



Para não criar nenhuma confusão em torno dos fundamentos da  sentença e também  porque a situação aqui é diferente das demais, limito-me a reiterar que  a terceirização jamais foi implementada. Segundo depoimento  testemunhal convincente, as prestadoras de serviços não existiam na prática. Apenas emprestaram os seus nomes para que o próprio Banco Safra S.A promovesse as irregularidades trabalhistas, a ponto de jamais ter sido mantido qualquer contato entre a reclamante e os representantes das empresas terceirizantes, bem como a contratação e subordinação obreira  estarem vinculadas diretamente à entidade financeira.

Em outras palavras,  é desnecessário aqui investigar a possibilidade  ou não de haver terceirização na atividade profissional desenvolvida pela reclamante em prol do banco, diante da prova da ausência de intermediação de mão de obra, a não ser que se considere a possibilidade de haver  intermediação  a partir do  mero empréstimo do nome de determinada  empresa para figurar como tal. As empresas prestadoras de serviços eram nobres desconhecidas dos  empregados terceirizados do Banco Safra S.A, ocupantes da função de Operador de Crédito, segundo revelou a prova testemunhal colhida nos autos.

A  reclamante jamais deixou de trabalhar de forma pessoal, com subordinação jurídica, em caráter não eventual e mediante remuneração mensal, para o primeiro reclamado, muito embora tenha sido  utilizado apenas no papel o   instituto da  terceirização para mascarar a relação empregatícia. Se não fosse suficiente o desmoronamento da situação artificial criada pelo banco, que não se sustenta quando observamos o princípio da primazia realidade, a natural indisponibilidade dos direitos trabalhistas milita contra  a iniciativa patronal. Estamos tratando de normas de ordem pública, cogentes, portanto, as quais  não podem ser derrogadas pela simples assinatura de um documento. O vício do ato é evidente, atentatório contra o princípio da irrenunciabilidade de direitos e ofensivo à primazia da realidade que marca o Direito do Trabalho como ramo autônomo do direito.

O Ministério Público do Trabalho deve ser comunicado para eventual investigação a respeito  do procedimento adotado pelos reclamados, BANCO SAFRA S.A, PROMO 7 RECURSOS E PATRIMÔNIO HUMANO LTDA e S&A PERSONNALITE MARKETING LTDA,aqui compreendido como fraudulento e  lesivo aos direitos sociais da reclamante e de outros trabalhadores ocupantes da função de Operador de Crédito Consignado, com cópias da petição inicial, das contestações, da ata de audiência de instrução(fls.350/357) e da presente sentença. Expedir a Secretaria da Vara o respectivo  ofício. 

Como mera consequência, declaro a nulidade dos registros efetuados na CTPS obreira em nome de empregadora fictícia, bem como das rescisões contratuais trazidas aos autos e demais documentos elaborados com essa mesma tentativa, para reconhecer que o vínculo de emprego da reclamante se deu exclusivamente com o primeiro reclamado, Banco Safra S.A,  de 05 de maio de 2008 a 11 de dezembro de 2009, no   exercício da função de Promotora de Venda de Crédito Consignado.  Devem ser promovidos os pertinentes registros e retificações na CTPS obreira, pelo primeiro reclamado, no prazo de 48 horas, sob pena de assim proceder a Secretaria da Vara.

Não há, assim, nenhuma prescrição a ser pronunciada. O contrato de trabalho perdurou entre  05 de maio de 2008 a 11 de dezembro de 2009, com o ajuizamento da ação no dia 17 de agosto de 2011.

A partir do acolhimento do pleito de reconhecimento da unicidade contratual com o Banco Safra S.A,  resta inconteste a qualidade de trabalhadora bancária da reclamante, cujo enquadramento sindical toma em conta a atividade preponderante do empregador(CLT, artigos 511, 570, 224 e seguintes). Ela faz jus, portanto, a jornada diferenciada dos bancários(CLT, artigo 224, caput) e a todos os direitos de sua categoria profissional, do primeiro ao último dia de vigência do pacto laboral(05.05.2008 a 11.12.2011).

Na hipótese de eventual condenação, o primeiro reclamado, empregador de fato da reclamante,arcará com  o pagamento da  totalidade das verbas. As outras reclamadas, empresas prestadoras de serviços que apenas emprestaram os seus nomes para a prática de irregularidades trabalhistas, são condenadas solidariamente, na forma do artigo 942, do Código Civil Brasileiro(CLT, artigo 8º).

Postulações obreiras identificadas no título do tópico integralmente deferidas.

                           

JORNADA DE TRABALHO. BANCÁRIA. HORAS EXTRAS. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. DIVISOR. REFLEXOS. COMPENSAÇÃO DE VALORES.  INTERVALO

A reclamante alegou haver laborado nos seguintes horários: das 09:00 às 19:30 horas, com intervalo de 30 minutos, de segunda a sexta-feira e das 09:00 às 20:30 horas nos dias de “pico”(do 1ª ao 10º dia, às segundas-feiras e nos dois últimos dias do mês.

Refutando o contexto fático delineado na inicial, o primeiro reclamado assevera que em determinados períodos do vínculo formal mantido diretamente  com o banco(04.09.2008 a 30.10.2008 e 07.05.2009 a 31.08.2009),a autora  esteve submetida ao cumprimento da jornada diária de seis horas, na forma do caput do artigo 224, da CLT. Ainda assim, pontua o primeiro reclamado, a trabalhadora não tinha a sua jornada de trabalho controlada, uma vez que as funções eram desempenhadas em caráter externo(CLT, artigo 62,I). Somente a partir de setembro de 2009 a reclamante passou a cumprir jornada diária de oito horas, com a percepção de 2(duas) horas extras por dia. No mais, impugna a indicação da jornada excedente à 8ª diária.

A segunda reclamada afirma que a autora laborava das 08:00 às 12:00 horas e das 13:00 às 17:00 horas ou das 09:00 às 13:00 e das 14:00 às 18:00 horas.

No que se refere ao enquadramento obreiro na exceção do artigo 62, I, da CLT, não há nada, nada mesmo, capaz de ao menos dar uma aparência da presença da referida figura jurídica,   a não ser o registro formal assim realizado na CTPS obreira(fls.49/51)

O fato de o empregado  laborar em caráter externo, por si só, não atrai a aplicação do dispositivo legal invocado.

É preciso haver, de fato,  a presença de  quadro   incompatível com o controle de jornada, porque muitas vezes, embora  executado  o serviço fora do ambiente físico da empresa, a jornada é regularmente controlada, seja pelo número de atividades distribuídas ao trabalhador ou  mediante controle da rota de visitas, seja pelo início e término  do expediente sob os  atentos olhares do empregador, ou  ainda  por tantos outros meios  de fiscalização de cada passo do  vendedor externo  em tempos de revolução cibernética  capaz de  impor regime de total absorção do tempo de cada empregado.

O  controle  direto e visual  por parte do empregador  é, sem nenhuma dúvida,  menos  agressivo ao patrimônio imaterial do trabalhador, dadas as variadas formas eletrônicas  disponíveis para transformar  o  mero controle da jornada  num verdadeiro  big brother  da   relação entre o capital e o trabalho.

Nesse novo mundo o objetivo não é apenas fiscalizar a  jornada. Controla-se o trabalhador em todos os ambientes, em todas as suas  dimensões, dentro e fora da empresa, com as câmeras instaladas  no local de trabalho cujas imagens podem ser acessadas a qualquer momento(durante 24 horas por dia) pelo patrão,  da  sua confortável poltrona residencial ou da suíte do hotel  dotada do  serviço de internet. E isso não se  constitui sequer   privilégio exclusivo   dos  segmentos mais abastados do capital. É cada vez mais comum setores diversos patronais  lançarem mão da nova ferramenta para ter a sua empresa  e os empregados “na mão”, como se  houvesse  a seguinte mensagem dirigida ao  trabalhador: “sorria, você está sendo  monitorado o tempo todo” .

Para os trabalhadores externos o controle  absoluto da jornada se dá por intermédio de variados mecanismos  eletrônicos que permitem ao empregador ter a exata noção  do horário e do tempo gasto em cada visita aos clientes, não raras vezes com relatórios instantâneos e mudança de roteiro  determinada  pela empresa, de modo que a fiscalização sob tal ordem é infinitamente superior àquela “inocente” praticada nos velhos tempos do capitalismo fordista.

Na atual quadra, portanto, é razoavelmente  fácil controlar de maneira rígida a jornada e a vida do empregado sem precisar recorrer  ao contato direto  e pessoal para esse fim. Alguns aparelhinhos eletrônicos sofisticados  possuem múltiplos olhos e servem à dinâmica  do capital sedento por aumento de produtividade  e da consequente maximização de lucros.

Definitivamente, o trabalhador externo de hoje é bem  diferente daquele visto nos anos quarenta do século XX. Ele  muitas vezes se imagina livre  e moderno em comparação com o seu avô do  passado industrial pré-cibernético,  por  diversas razões, sem notar porém a quase imperceptível condição de muito mais submisso, dócil e controlado em todas as esferas de sua vida social.

Mais do que ontem, reitere-se, trabalhar em caráter externo não significa ausência do controle de jornada do trabalhador. Ao contrário, não são poucos os vendedores externos muito mais controlados, com jornadas mais desgastantes, longas e extenuantes, em comparação à carga de trabalho dos  colegas lotados exclusivamente nos ambientes fechados empresariais.

No caso concreto, a prova dos autos sequer corrobora a tese de defesa do trabalho prestado exclusivamente em caráter externo, pela reclamante, no período ali  declinado.

Inexiste confissão  a ser extraída do  depoimento pessoal obreiro.

A preposta do primeiro reclamado declarou que a reclamante trabalhava das 09:00 às 16:00 horas, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira(nos três primeiros meses de vigência do contrato), e das 09:00 às 18:00 horas, com uma hora de intervalo e recebimento de duas horas extras(nos demais períodos).Disse a representante patronal que embora a jornada contratual fosse aquela antes declinada, como trabalhadora externa, a reclamante poderia escolher o horário de trabalho de sua conveniência.

Na qualidade de única testemunha ouvida, a Sra. Daniela Fernandes Ribeiro confirmou a existência do controle de jornada imposto aos empregados ocupantes da função de Operador de Crédito Consignado, incluindo a reclamante, os quais precisavam necessariamente iniciar e concluir a sua jornada na agência do Banco Safra S.A, com pré-agenda de visitas a clientes,  serviços  os quais eram  prestados por ela depoente das 09:00 às 18:30/19horas e até às 20:00 horas nos dias de pico(primeiros dez dias do mês), com 30(trinta) minutos de intervalo.

E o controle de jornada está demonstrado pelo  fato de o reclamado ter pago duas horas extras à reclamante a partir de 1º de setembro de 2009, mesmo não havendo nenhuma alteração nas condições de trabalho, antes e depois de tal data. A preposta do banco, aliás, confessa que laborando em caráter externo, a reclamante estava submetida ao cumprimento da jornada contratual de 8(oito) horas, com a remuneração de 2(duas) dessas  horas suplementares.

Estava a reclamante submetida ao controle de jornada que não deveria ultrapassar a sexta diária, diante de sua condição de bancária(CLT, caput do artigo 224).

É do reclamado o ônus de demonstrar a inveracidade da jornada apontada na exordial,considerando a inexistência dos respectivos controles de ponto(CLT, artigos 74,§2º, e 818; TST, Súmula nº 338).

Não há confissão expressa no depoimento pessoal obreiro. A testemunha ouvida não soube indicar com precisão os horários  da autora, pois não trabalhava  ao seu lado  no ato das visitas aos clientes. No entanto, na mesma função de Operadora de Crédito Consignado, descreve a auxiliar do juízo os seus  horários, os quais estão muito próximos daqueles apontados na exordial da reclamante, além de dizer que a jornada da reclamante, especialmente quanto ao horário de término, era mais extensa do que a sua.

Atento à distribuição do ônus da prova, do qual não se desincumbiu o primeiro reclamado quanto à jornada, e ao teor do depoimento testemunhal que indica a rotina diária dos Operadores de Crédito Consignado, declaro que a reclamante laborava  das 09:00 às 19:30 horas, jornada essa que era prorrogada até  às 20:30 horas nos dias de “pico”(do 1ª ao 10º dia, às segundas-feiras e nos dois últimos dias do mês), sempre de segunda a sexta-feira e com 30(trinta) minutos de intervalo, sendo ela credora de tantas quantas horas extras ultrapassem a jornada diária de 6(seis) horas, de segunda a sexta-feira, acrescidas de 50% e do Repouso Semanal Remunerado(incluindo sábados e feriados, conforme norma convencional dos bancários), durante todo o contrato,com observância do divisor 150, tendo como base de cálculo o somatório das seguintes verbas:salario, acordo de prorrogação,rsr sobre acordo de prorrogação, diferença de salário, total de prêmios, rsr sobre prêmios, diferença de abono pecuniário e abono. O valor das horas extras integra-se à remuneração e ocasiona diferenças de aviso prévio, férias integrais e proporcionais, abono de 1/3, gratificações natalinas integrais e fracionadas, FGTS e multa de 40%. 

Não se olvida que a Súmula n.º 113 do col. TST preceitua que o sábado do bancário é dia útil não trabalhado e não dia de repouso semanal remunerado, não cabendo, assim, a repercussão do pagamento de horas extras habituais no repouso.

Contudo, na presente hipótese,como registrado antes, verifica-se a existência de cláusula em convenção coletiva de trabalho da categoria (Cláusula Oitava, Parágrafo Primeiro) determinando que: “quando prestadas horas extras durante toda a semana anterior, os bancos pagarão, também, o valor correspondente ao repouso semanal remunerado, inclusive sábados e feriados”(fl.72).

Nesse contexto, chega-se à conclusão de que a norma coletiva em questão, ao determinar a incidência das horas extras habituais no sábado e feriados,  considerou o sábado como dia de repouso semanal remunerado.

Assim, estando a reclamante enquadrada no caput do art. 224 da CLT, e, portanto, sujeita à jornada legal de 6 horas diárias e 30 semanais, por óbvio que o divisor a ser utilizado é o 150.

Essa cláusula é sistematicamente repetida nas convenções coletivas de trabalho dos bancários.

Requereu o reclamado a compensação das duas horas extras pagas à autora no período de 1º de setembro a 11 de dezembro de 2009.

Cuida-se na espécie  de pré-contratação de horas extras, sendo inadmissível a compensação requerida, considerando que essa prorrogação somente é admitida em caráter excepcional, como estabelece o artigo 225, da CLT. Rejeito o requerimento do primeiro reclamado.

Como reconhecido antes, a reclamante usufruía de 30(trinta) minutos de intervalo.

Cabe destacar que sendo detentora do poder diretivo e de comando, deve a  reclamada  conceder, fiscalizar e fazer cumprir o descanso intrajornada regular pelos seus empregados.

A omissão patronal "burla norma que tem por objetivo proteger a saúde e a segurança do trabalho, preservando a higidez física e mental da trabalhadora  durante a prestação diária de serviços" (DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr). Ou seja, com sua conduta viola a inovação legislativa prevista no art. 71, § 4.º da CLT, que tem por escopo obstar o abuso dos empregadores ao não conceder o descanso intrajornada ao empregado, em face do caráter higiênico do descanso em análise.

Dentro desse contexto, é forçoso concluir que a ausência da concessão de intervalo intrajornada de uma hora, quando a jornada de trabalho diária é de 6 horas ou superior, atrai a aplicação da norma prevista no art. 71, §4.º da CLT.

Ao violar a regra, independentemente do tempo destinado ao intervalo, o empregador arca com a totalidade da remuneração  prevista no referido preceito consolidado.   

Defiro o pleito de pagamento do intervalo intrajornada, a título de mais uma hora extra, durante todo o pacto, a ser calculada nos mesmos moldes das demais horas extras deferidas. 

Pretensões obreiras deferidas, em parte.    



BANCÁRIA. VANTAGENS PREVISTAS EM NORMAS COLETIVAS. REAJUSTES(DIFERENÇAS SALARIAIS E BASE DE CÁLCULO DAS HORAS EXTRAS). AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO(05/05/2008 A 12/04/2009). CESTA ALIMENTAÇÃO(05/05/2008 A 12/04/2009).PLR 2008

A  reclamante pretende receber todas as vantagens concedidas aos bancários por intermédio de normas coletivas, tais como, reajustes salariais, auxílio alimentação, cesta alimentação e  PLR 2008.

O primeiro reclamado sustenta que são indevidos os benefícios da categoria bancária, em relação aos períodos da prestação laboral pela autora  na qualidade de comerciária(terceirizada).

Não era comerciária a reclamante. Ela sempre foi bancária e, por isso mesmo, à exceção dos períodos de vínculo formal bancário com o Banco Safra S.A(04.09.2008 a 30.10.2008 e de 07.05.2009 a 11.12.2009, vide CTPS fls.28/29), faz a reclamante  jus ao recebimento das seguintes verbas estabelecidas em norma coletivas: i)diferenças salariais decorrentes da aplicação do reajuste de 6%(seis por cento) devido entre 05 de maio e 03 de setembro de 2008(vide CCT 2007/2008, Cláusula Primeira, fl.69), e do reajuste de 10%(dez por cento) devido entre 31.10.2008 e 06.05.2009(vide CCT 2008/2009, Cláusula Primeira, a, fl. 93), cujos valores majorados compõem a evolução da remuneração obreira e servem também como base de cálculo das horas extras antes deferidas; ii)auxílio alimentação e cesta alimentação nos períodos de 05 de maio e 03 de setembro de 2008 e de 31.10.2008 e 06.05.2009 (Cláusulas Décima Quarta e Décima Quinta da CCT de 2007/2008, fls 73 e 74; Cláusulas Décima Quarta e Décima Quinta da CCT de 2008/2009, fls.90/91)e PLR 2008 no valor de R$1.036,80(CCT sobre participação dos empregados nos lucros e resultados 2008, Cláusula Primeira, fls 140/141). 

Pleitos obreiros deferidos, em parte.



MULTAS CONVENCIONAIS 

Descumpridas  quase todas as normas convencionais durante boa parte do contrato de trabalho, inclusive no que se refere ao horário de trabalho, fornecimento de auxílio refeição, cesta alimentação, reajustes salariais e PLR, o reclamado deve pagar à reclamante uma multa convencional pela vigência de cada instrumento, das CCTs de 2007/2008(Cláusula Quadragésima Quarta, fl.85),2008/2009(Cláusula Quadragésima Quarta, fl.102 e 2009/2010(Cláusula Quadragésima Oitava, fl.122).

Pedidos da reclamante acolhidos parcialmente.



UTILIZAÇÃO DO VEÍCULO PRÓPRIO PARA A PRESTAÇÃO LABORAL. INDENIZAÇÃO POR MANUTENÇÃO DO VEÍCULO(05.05.2008 A 12.04.2009 E DE  13.04 A 11.12.2009). PERDAS E DANOS MATERIAIS

A  reclamante afirma que utilizava o seu veículo para prestar serviços diários ao banco, até porque o empregador não fornecia outro meio de transporte para realizar visitas diárias a clientes nas mais diversas localidades do Distrito Federal, numa média de 50 a 100 quilômetros por dia. Esclarece a demandante que somente a partir de 13 de abril de 2009passou a receber a importância de R$150,00(cento e cinquenta reais) a fim de  suportar algumas das despesas.

Persegue a autora o recebimento das verbas a seguir discriminadas: i) R$500,00(quinhentos reais), por mês, com o objetivo de ressarcir as despesas  de manutenção do veículo, o que inclui gastos com óleo, pneus,IPVA, combustível e reembolso de quilometragem, de 05 de maio de 2008 a 12 de abril de 2009; ii)R$350,00(trezentos e cinquenta reais), por mês, para suportar as mesmas despesas antes discriminadas, mas no período de 13 de abril a 11 de dezembro de 2009, considerando que nessa época, como informado antes, recebia a importância de R$150,00(cento e cinquenta reais) e iii)R$800,00(oitocentos reais) por mês, a título de perdas e  danos materiais pelo desgaste do veículo, durante todo o contrato de trabalho, de 05 de maio de 2008 a 12 de abril de 2009.

Sustenta o reclamado que assim como qualquer outro empregado, a reclamante recebeu a oferta para cadastrar-se no programa de vale-transporte e não aderiu ao sistema, uma vez que trabalhava externamente. Acentua o empregador que jamais exigiu da empregada fosse ela proprietária ou possuidora de veículo para o desempenho de suas funções, não havendo prova, por outro lado, da quilometragem diária  e  do veículo  utilizado. Impugna com veemência todos os valores apontados na inicial.

Em depoimento pessoal a reclamante declarou não  ser possível trabalhar para o banco, na função por ela desempenhada, sem ter veículo próprio, época em que  tinha residência em  Samambaia Sul e o banco estava instalado no Setor Comercial Sul.

A preposta do primeiro reclamado, por seu turno, disse que o empregador fornecia vale transporte a todos os operadores de crédito, sem que a reclamante tenha sido obrigada a utilizar veículo próprio para o exercício de suas funções laborais,embora não saiba se a empregada fez uso de carro próprio para esse finalidade.

Impõe-se reconhecer que a reclamante utilizou o seu veiculo para realizar visitas a clientes e desempenhar  outras tarefas durante todo o contrato de trabalho, inclusive para se dirigir ao trabalho e retornar à sua residência, considerando a ausência de conhecimento sobre fato controvertido pela preposta patronal.

Não há dúvidas de que o demandado se beneficiou da aludida situação, obtendo lucro e vantagens na prestação dos serviços pela obreira, que se utilizava de veículo particular, como, por exemplo, para imprimir  maior rapidez nas visitas aos  clientes, tanto que se obrigou a ressarcir as despesas gastas com combustível durante algum tempo de vigência do pacto.

Utilizando a empregada veículo próprio para a prestação de serviços, faz ela jus ao ressarcimento de todas as despesas efetuadas  com o referido  meio de transporte de sua propriedade.

Nesse sentido, vale citar  jurisprudência deste Tribunal:



QUILÔMETROS RODADOS. TRAJETO RESIDÊNCIA-TRABALHO-RESIDÊNCIA. INDENIZAÇÃO. Se necessário fazia-se o veículo próprio da reclamante para que efetuasse visitas a clientes durante a rotina de trabalho, como isso seria viável, se tal veículo não estivesse no local da prestação de serviços? Obviamente que deveria a mesma conduzi- lo de sua residência até seu trabalho, não podendo o acionado beneficiar-se disso sem ressarcir a obreira. 3. Recurso ordinário patronal conhecido e desprovido. 4. Recurso ordinário obreiro conhecido e parcialmente provido.” (TRT10ªRegião; RO-01072-2005-010-10-00-0; Ac. 2ª Turma; Relator Juiz Brasilino Santos Ramos; Publicado em 28/07/2006).



INDENIZAÇÃO POR QUILOMETRAGEM RODADA. O que caracteriza a necessidade de reembolso de dispêndios do empregado com combustível gasto em proveito do empregador não é apenas os trajetos desenvolvidos a partir do local em que se encontra instalada a empresa, mas o fato de que a utilização de veículo próprio do trabalhador é indissociável da prestação laboral, a qual tem início a partir do momento em que o empregado deixa sua residência em direção às instalações do empregador, pois a prestação laboral pode se dar também ao longo desse percurso, dada a natureza da atividade desempenhada e a inexistência de delimitação territorial para o desenvolvimento da atividade laboral. 6. Recurso patronal conhecido e desprovido. Recurso obreiro conhecido e parcialmente provido.” (TRT10ªRegião; RO-00436-2005-014-10-00-0; Ac. 2ª Turma; Relator Juiz Brasilino Santos Ramos; Publicado em 24/02/2006.)



“REEMBOLSO DE QUILOMETRAGEM NO PERCURSO RESIDÊNCIA-TRABALHO-RESIDÊNCIA. A empregadora que exige a utilização de veículo próprio para o desempenho de funções em seu benefício deve reembolsar a quilometragem no percurso residência- trabalho-residência, porque a utilização do veículo no percurso referido se destina a colocá-lo à disposição do patrão durante a jornada de trabalho, para o serviço. Recurso ordinário não provido. Recurso adesivo provido.” (TRT10ªRegião; RO-00387-2005-010-10-00-0; Ac. 1ª Turma; Relatora Juíza Cilene Ferreira Amaro Santos; Publicado em 10/02/2006.)





A condição contratual relativa ao pagamento de indenização por uso do veículo próprio em serviço, pelo empregado, existia.

Ainda que fosse  diferente, a indenização é devida porque o empregador adotava prática incompatível com a possibilidade do fornecimento de vale-transporte, ao exigir que a reclamante se dirigisse ao trabalho fazendo uso de veículo próprio para atender clientes fora da agência bancária.

Competia ao reclamado, por último, provar que a quilometragem indicada pela autora não correspondia  à realidade (CLT, artigo 818), ônus do qual não se desincumbiu a contento no curso do procedimento instrutório.

Revela-se evidente o caráter da exigência patronal quanto ao uso de veículo próprio pela reclamante para o desempenho de algumas de suas funções. Se assim o era, de outra maneira não poderia a reclamante se dirigir ao trabalho que não fosse conduzindo o seu próprio veículo, salvo na hipótese  de aquisição do automóvel, pela empregada, para servir exclusivamente ao empregador, deixando o meio de transporte, por exemplo, nas imediações ou em garagem da empresa. Este ato, contudo, desafia a intangibilidade remuneratória e a natureza imanente ao contrato de trabalho que confere às partes da relação papéis bem distintos quanto às suas obrigações.

Defiro as pretensões obreiras para determinar o ressarcimento dos valores gastos com a manutenção do veículo(óleo, pneus,combustível, IPVA, reembolso de quilometragem incluindo o trajeto resdidência-trabalho-residência), nos valores de R$500,00(quinhentos reais) por mês, de 05 de maio de 2008 a 12 de abril de 2009, e de R$ 350,00(trezentos e cinquenta reais) por mês no período de 13 de abril a 11 de dezembro de 2009, com juros e atualização monetária.

No que se refere ao pagamento de  R$800,00(oitocentos reais por mês, a título de perdas e danos pelo desgaste do veículo, rejeito o pleito diante da  impossibilidade de  se verificar a real  necessidade da indenização em tela e também  a   quantia efetivamente razoável para cobrir tal tipo de ressarcimento. A autora sequer indica o modelo, o ano de fabricação e o  estado de conservação do veículo, bem como é silente a prova oral a esse respeito. Se tiver utilizado um carro novo  e de valor elevado, o ressarcimento deve ser feito tomando em conta  esse quadro, evidentemente. Mas se, ao contrário, o veículo  for daqueles com  vários anos de uso  e o modelo mais modesto, nem mesmo a sua utilização  contínua durante um ano e sete meses para a prestação laboral  é capaz de  alterar o respectivo valor de mercado do bem, cujas despesas antes acolhidas, sob a rubrica manutenção do veículo, se revelam suficientes para a finalidade ora pretendida. Pretensão inacolhida.   

Pleitos de ressarcimento e indenização pelo uso de veículo particular parcialmente deferidos. 



COMPENSAÇÃO DE VALORES

Não há se  falar em compensação de valores, tendo em vista que nenhuma das verbas deferidas foi paga de forma parcial pelo reclamado. Apenas é registrado  novamente que a pré-contratação de duas horas  extras impede a compensação requerida(este valor é parte integrante da remuneração, mas não a título de horas extras). E quanto à indenização por quilômetro rodado, o valor pago pelo reclamado durante parte do contrato já foi deduzido no momento da fixação do ressarcimento respectivo, conforme pedido assim formulado pela autora. O que era para ser compensado foi realmente deduzido no momento da análise do pleito principal.



DO LIMITE MÁXIMO DE CONTRIBUIÇAO PREVIDENCIÁRIA PELA RECLAMANTE. APURAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA. NÃO INCLUSÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE OS JUROS DE MORA

No cálculo das verbas ora deferidas, como tem procedido a Contadoria Judicial do TRT 10, será observado o limite máximo de contribuição para o INSS, pela empregada, incluindo nesse  cálculo  os valores dos salários recebidos durante o contrato, mês a mês. Não há incidência de imposto de renda sobre juros de mora, matéria também pacificada no âmbito do Regional. O imposto de renda devido será calculado  de acordo com os  termos  da Instrução Normativa nº 1.127/2011, da RFB.



CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRAUITA.IMPUGNAÇÃO PATRONAL 

Afirmando não poder demandar sem prejuízo do sustento próprio e de sua família, a reclamante pleiteou, na inicial, os benefícios da justiça gratuita. Para tanto, presta declaração de pobreza a fls. 17, 21 e 23.

Entendo que a presunção de hipossuficiência do empregado milita em seu favor, especialmente quando preenchidos os requisitos legais para concessão da gratuidade judiciária, cabendo ao empregador/reclamado destituir a aparente regularidade, o que não ocorreu, embora tenha impugnado a declaração obreira.

Defiro, pois, a gratuidade judiciária postulada pelo autor, nos termos da DECLARAÇÃO DE POBREZA JURÍDICA prestada  a fls. 17, 21 e 23.



III - CONCLUSÃO

Ante o exposto,julgo procedentes, em parte, os pedidos para condenar solidariamente os reclamados,BANCO SAFRA S.A, PROMO 7 RECURSOS E PATRIMÔNIO HUMANO LTDA e S&A PERSONNALITE MARKETING LTDA ,a pagar à  autora,PATRÍCIA CRUZ DA SILVA, no   prazo legal, as seguintes parcelas:

i) tantas quantas horas extras ultrapassem a jornada diária de 6(seis) horas diárias, de segunda a sexta-feira,observados os horários declinados na exordial, acrescidas do percentual  de 50% e do Repouso Semanal Remunerado(incluindo sábados e feriados, conforme norma convencional dos bancários), durante todo o contrato,com a  utilização  do divisor 150, tendo como base de cálculo o somatório das seguintes verbas:salario, acordo de prorrogação,rsr sobre acordo de prorrogação, diferença de salário, total de prêmios, rsr sobre prêmios, diferença de abono pecuniário e abono. O valor das horas extras integra-se à remuneração e ocasiona diferenças de aviso prévio, férias integrais e proporcionais, abono de 1/3, gratificações natalinas integrais e fracionadas, FGTS e multa de 40%;

ii)   intervalo intrajornada, a título de mais uma hora extra, durante todo o pacto, a ser calculada nos mesmos moldes das demais horas extras deferidas ;

iii) a)diferenças salariais decorrentes da aplicação do reajuste de 6%(seis por cento) devido entre 05 de maio e 03 de setembro de 2008(vide CCT 2007/2008, Cláusula Primeira, fl.69), e do reajuste de 10%(dez por cento) devido entre 31.10.2008 e 06.05.2009(vide CCT 2008/2009, Cláusula Primeira, a, fl. 93), cujos valores majorados compõem a evolução da remuneração obreira e servem também como base de cálculo das horas extras antes deferidas; b)auxílio alimentação e cesta alimentação nos períodos de 05 de maio e 03 de setembro de 2008 e de 31.10.2008 e 06.05.2009 (Cláusulas Décima Quarta e Décima Quinta da CCT de 2007/2008, fls 73 e 74; Cláusulas Décima Quarta e Décima Quinta da CCT de 2008/2009, fls.90/91)e  c)PLR 2008 no valor de R$1.036,80(CCT sobre participação dos empregados nos lucros e resultados 2008, Cláusula Primeira, fls 140/141);

iv)   uma multa convencional pela vigência de cada instrumento, das CCTs de 2007/2008(Cláusula Quadragésima Quarta, fl.85),2008/2009(Cláusula Quadragésima Quarta, fl.102) e 2009/2010(Cláusula Quadragésima Oitava, fl.122)e ainda

v) ressarcimento dos valores gastos com a manutenção do veículo(óleo,pneus,combustível,IPVA, reembolso de quilometragem incluindo o trajeto residência-trabalho-residência),nos valores de R$500,00(quinhentos reais) por mês, de 05 de maio de 2008 a 12 de abril de 2009, e de R$ 350,00(trezentos e cinquenta reais) por mês no período de 13 de abril a 11 de dezembro de 2009, com juros e atualização monetária.



Declarada, assim, a nulidade dos registros efetuados na CTPS obreira em nome de empregadora fictícia, bem como das rescisões contratuais trazidas aos autos e demais documentos elaborados com essa mesma tentativa, para reconhecer que o vínculo de emprego da reclamante se deu exclusivamente com o primeiro reclamado, Banco Safra S.A,  de 05 de maio de 2008 a 11 de dezembro de 2009, no   exercício da função de Promotora de Venda de Crédito Consignado.  Devem ser promovidos os pertinentes registros e retificações na CTPS obreira, pelo primeiro reclamado, no prazo de 48 horas, sob pena de assim proceder a Secretaria da Vara. O primeiro reclamado, empregador de fato da reclamante,arcará com  o pagamento da  totalidade das verbas. As outras reclamadas, empresas prestadoras de serviços que apenas emprestaram os seus nomes para a prática de irregularidades trabalhistas, são condenadas solidariamente, na forma do artigo 942, do Código Civil Brasileiro(CLT, artigo 8º),tudo nos termos da fundamentação precedente.

O Ministério Público do Trabalho deve ser comunicado para  fins de eventual investigação a respeito  do procedimento adotado pelos reclamados, BANCO SAFRA S.A, PROMO 7 RECURSOS E PATRIMÔNIO HUMANO LTDA e S&A PERSONNALITE MARKETING LTDA,aqui compreendido como fraudulento e  lesivo aos direitos sociais da reclamante e de outros trabalhadores ocupantes da função de Operador de Crédito Consignado, com cópias da petição inicial, das contestações, da ata de audiência de instrução(fls.350/357) e da presente sentença. Expedir a Secretaria da Vara o respectivo  ofício. 

Ofício ao órgão fiscalizador após o trânsito em julgado da decisão(DRT-DF), para as providências cabíveis, diante das irregularidades verificadas.

Contribuições previdenciárias sobre as seguintes verbas:    diferenças salariais,horas extras, intervalo intrajornada, e  reflexos sobre  gratificações natalinas e repouso semanal remunerado. As demais verbas possuem natureza indenizatória. Observar  o teto máximo da previdência, no caso da empregada(Súmula nº 368, do TST).

Autorizados os respectivos descontos da cota-parte da empregada, quanto às contribuições previdenciárias e ao imposto de renda sobre as parcelas salariais,  respeitados, porém,  os limites previstos  na Instrução Normativa nº 1.127/2011, da RFB.

No cálculo das verbas ora deferidas, como tem procedido a Contadoria Judicial do TRT 10, será observado o limite máximo de contribuição para o INSS, pela empregada, incluindo nesse  cálculo  os valores dos salários recebidos durante o contrato, mês a mês. Não há incidência de imposto de renda sobre juros de mora, matéria também pacificada no âmbito do Regional. O imposto de renda devido será calculado  de acordo com os  termos  da Instrução Normativa nº 1.127/2011, da RFB.

Incidem juros de 1% (um por cento) ao mês a partir do dia do ajuizamento da presente ação e atualização monetária desde a data da exigibilidade de cada uma das verbas deferidas.

Custas processuais de R$1.000,00(um mil reais),  pelos reclamados,calculadas sobre R$50.000,00(cinquenta mil reais), valor arbitrado à condenação e para esse fim aproveitado.

Intimem-se as partes.

BSB-DF, 05 de março  de 2012

 

Grijalbo Fernandes Coutinho

Juiz Titular da 19ª VTB/DF




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