DANO MORAL
Ambev condenada a indenizar trabalhador por práticas de
violências nas relações de trabalho
O juiz do Trabalho, Dr. Leonardo Vieira Wandelli, da 3ª Vara
do Trabalho de Paranaguá (TRT-PR) em decisão recente condenou a Companhia de
Bebidas das Américas – AMBEV, por suas reiteradas práticas de violências nas
relações de trabalho com seus empregados, objetivando a busca da maior
produtividade e lucratividade, sem respeito aos direitos à dignidade do homem
que trabalha.
Já há contra a AMBEV inúmeras decisões condenando a empresa à
indenização por dano moral pela adoção dos métodos negociais que sujeitam o
trabalhador ao cumprimento de metas de difícil e ou impossível atingimento, até
porque no mesmo mês a empresa costuma alterar as regras do jogo, estabelecendo
novas condições para a obtenção da comissão negociada, no início de cada mês,
deixando claro a sentença que mesmo sob aparente mudança comportamental mais
civilizada, o problema não foi corrigido, pelo que entende necessária a
prolação de decisões judiciais de valores indenizatórios majorados, buscando-se
efeito inibidor à continuidade das práticas altamente degradantes que diz ser de
mercado.
Leia a íntegra da sentença
TERMO DE AUDIÊNCIA
AUTOR :
Carlos Leal Nunes Neto
RÉ :
Companhia de Bebidas das Américas - AMBEV
DATA :
17.09.2012
HORÁRIO :
17h55min
JUIZ DO TRABALHO :
LEONARDO VIEIRA WANDELLI
Apregoadas as partes para a audiência de leitura e publicação
da presente, ausentes, profere o Juízo a seguinte
S E N T E N Ç A
Vistos, etc.
I – RELATÓRIO
Carlos Leal Nunes Neto propõe ação trabalhista em face de
Companhia de Bebidas das Américas - AMBEV, postulando a conversão da demissão
em dispensa e verbas rescisórias, diferenças de comissões, integração do
salário in natura, horas extras, multa convencional, indenização por danos
morais e consectários. Dá à causa o valor de R$ 25.000,00. Junta os documentos
de fls. 27/52.
A ré oferece contestação escrita, arguindo ausência de
sujeição à comissão de conciliação prévia, quitação extintiva e propugnando
pela improcedência dos pedidos da inicial. Junta, além da representação, os
documentos de fls. 157/466 e 528/532, manifestando-se o autor às fls. 468/511.
Colhe-se o depoimento das partes e de duas testemunhas (fls.
522/525). Encerrada a instrução processual, as razões são apresentadas por
memoriais pelas partes. Julgamento designado para esta data.
É o relatório. Decide-se.
II – FUNDAMENTOS
A – Ausência de sujeição à comissão de conciliação prévia
Assevera a ré que o autor deixou de cumprir as exigências da
Lei 9.958/2000. Sem razão.
O direito de ação do autor, assegurado pelo art. 5º, XXXV, da
CF, não pode ser condicionado a instância administrativa. A matéria vem de ser
objeto de recente decisão, de caráter vinculante, no âmbito do Supremo Tribunal
Federal, que deferiu liminar nas ADIs 2139 e 2160, para dar interpretação
conforme a Constituição ao art. 625-D, da CLT, no sentido de que o ajuizamento
de ação trabalhista não está condicionado à sujeição às Câmaras de Conciliação
Prévia.
Ademais, a alegação de defesa revela-se abusiva, na medida em
que o intuito da arguição da preliminar é exclusivamente de procrastinar a
demanda, uma vez que a todo momento esteve o juízo aberto e incitando à
conciliação, que não se viabilizou, inclusive porque a ré em nada se dispôs a
tanto.
Isso revela que a ré não pretende qualquer conciliação, mas
apenas utilizar a previsão legal como forma de causar obstáculo ao judiciário,
em evidente abuso, por desvio de finalidade, da prerrogativa legal, que está
teleologicamente vinculada a viabilizar a conciliação. O disposto nos arts.
625, A a H da CLT, introduzidos pela Lei 9.958/2000, tem um claro
direcionamento teleológico, de fomentar a conciliação, não se constituindo em
formalidade inútil e sem sentido, que apenas se destine a ser mais uma pedra no
caminho entre o trabalhador e o acesso ao judiciário.
Nessas condições, ainda que fosse exigível a apresentação do
objeto da demanda perante a comissão, tal exigência pode ser dispensada pelo
juízo, na forma do art. 625-D, § 3º. E assim deve fazê-lo quando restar
inviabilizada a conciliação e a sujeição da questão à comissão de conciliação
se revelar tão só um ritual vazio e sem sentido, destinado a onerar as partes e
a alimentar fonte indevida de recursos mediante a cobrança de taxas abusivas,
como reiteradamente vem sendo denunciado por toda a imprensa e mesmo já
afirmado pelo Excelentíssimo Juiz Presidente do TST.
Conclui-se, dado o desinteresse revelado quanto à efetiva
disponibilidade de conciliação, que a alegação defensória é gratuita e apenas
revela o quanto a importante iniciativa legal de promoção da conciliação acaba
sendo deturpada em instrumento do mero afã de obstaculizar o acesso ao Poder
Judiciário. O tratamento do disposto na Lei 9.958/2000 em desconexão com
objetivos materiais concretos de conciliação, leva a transformar-se o instituto
em pura formalidade que se antepõe entre o jurisdicionado e o Judiciário, a alimentar
a esperança vil de que, com mais um percalço, aumentem as chances do objeto da
demanda não vir a ser apreciado.
Por tais motivos, rejeita-se a preliminar.
B – Quitação extintiva - súmula 330 do c. TST
O TRCT de fls. 347/348 não dá quitação de qualquer das verbas
ora postuladas, sendo pagas apenas as rescisórias e verbas do último mês
laborado. Ademais, o TRCT em questão sequer encontra-se assinado pelo autor.
Deste modo, o TRCT não tem o condão de suprimir o direito de
ação, constitucionalmente assegurado inclusive contra o legislador (art. 5º,
XXXV, da CFR), afastando o exercício da jurisdição na aplicação da lei, nem
tampouco de alterar fatos e tornar pago o que não o foi. Trata-se de requisitos
do estado democrático de direito, patamar civilizatório do qual não se pode
retroagir. Ademais, sequer a redação pouco feliz da súmula 330 do c. TST, a
despeito das sucessivas alterações, tem a amplitude desejada pela ré. Esse
também é o posicionamento da jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da
9ª Região, conforme ementa in verbis:
TRT-PR-27-02-2009 SÚMULA 330, DO C. TST - QUITAÇÃO COM
EFICÁCIA LIBERATÓRIA APENAS EM RELAÇÃO ÀS PARCELAS EXPRESSAMENTE CONSIGNADAS NO
TRCT. Não há que se falar em efeito liberatório amplo e total das verbas
postuladas, uma vez que a Súmula 330, do C. TST, atribui tal eficácia somente à
quitação contida no Termo de Rescisão Contratual referindo-se às parcelas ali
discriminadas e até o montante dos valores pagos, nos termos do § 2° do artigo
477, da CLT. Ademais, mesmo sem ressalvas, a quitação geral não se constitui,
por outro lado, em um instrumento que impeça qualquer postulação em relação às
verbas rescisórias, principalmente porque deve ser respeitado o direito
subjetivo de ação constitucionalmente protegido. Por óbvio, o sentido da Súmula
330 não se alarga para alcançar a regularidade da rescisão contratual, valores
não quitados, verbas não discriminadas e reflexos em outras parcelas, mesmo que
constantes do recibo. (TRT-PR-14359-2007-016-09-00-5-ACO-06350-2009 - 4A.
TURMA. Relator: SUELI GIL EL-RAFIHI. Publicado no DJPR em 27-02-2009)
Diante disto, rejeita-se a alegada prejudicial de mérito.
C – Diferenças salariais - comissões
Aduz, a parte autora, que a ré alterava unilateralmente as
regras e as tabelas para o recebimento de comissões, o que resultava em
prejuízos ao obreiro. Sustenta que não recebia as comissões em razão das
alterações impostas pela ré, e que havia o desconto de comissões creditadas.
Pleiteia a nulidade das alterações impostas pela ré e recebimento de diferenças
salariais, bem como a devolução das comissões descontadas.
A defesa admite a alteração das metas e índices para o
recebimento das comissões, denominadas prêmio objetivo. Contudo, sustenta que
não havia o intuito de prejudicar os trabalhadores e que as metas e índices de
performance sempre foram estipulados de acordo com o mercado de vendas. Afirma,
ainda, que as comissões eram lançadas em duplicidade nos recibos de pagamento,
e que, por isso, era feito o lançamento meramente nominal de descontos de
comissões.
A parte autora não impugna a alegação da defesa acerca dos
descontos de comissões apontados na inicial. Além disso, as fichas financeiras
de fls. 174/178 confirmam que as comissões eram creditadas em duplicidade, sob
as rubricas 02710 – prêmio obj quinzenal, 02715 – DSR prêmio obj quinzenal,
00475 – prêmio por objetivo, 00480 – DSR prêmio por objetivo, e descontadas uma
única vez, sob a rubrica 07520 – desc prem obj/DSD pg.
Desse modo, não há comissões a serem devolvidas ao autor em
decorrência de descontos efetuados pela ré.
Já a modificação dos critérios para recebimento de comissões
constitui alteração objetiva relevante das condições contratuais. Afinal,
trata-se de alteração da própria contraprestação contratada, o que não pode se
submeter ao arbítrio de um dos contratantes. Não se confunda a alteração do
próprio critério de apuração das comissões com a variação do seu valor em
função das variações na produção alcançada, o que é inerente a essa forma de
pagamento e é legal, uma vez preservado o critério de aferição. Sendo
incontroversas as alterações contratuais alegadas pela parte autora quanto ao
critério de aferição das comissões, cumpre à defesa demonstrar o mútuo
consentimento e a inexistência de prejuízo, nos termos do art. 468 da CLT. No
entanto, não há nos autos prova do atendimento de nenhuma das duas exigências
legais para a alteração das condições do contrato de trabalho do autor.
Os extratos de vendas juntados pela ré demonstram o prejuízo
provocado pelas alterações constantes nas metas e valores das comissões, mesmo
quando houve aumento de produtividade. Observa-se, por exemplo, que, em
maio/2009, o autor recebeu R$ 652,28, tendo cumprido 92% da meta de vendas da
cerveja pilsen, 57% da meta de vendas da cerveja super, e 74% da meta de vendas
de refrigerantes nacionais (fl. 300). Já em abril/2010, o obreiro alcançou
melhor desempenho, com 91% e 142% da meta da cerveja pilsen, 96% da meta da
cerveja super e 76% da meta dos refrigerantes nacionais (fl. 314), nada
obstante, o valor da comissão foi reduzido para R$ 605,99 (fl. 315).
Assim, por todos os ângulos, confirma-se a ocorrência de
alterações contratuais prejudiciais ao autor, o que é vedado pelo art. 468 da
CLT.
A par disso, a parte autora limita-se a postular: “a
condenação da ré no pagamento de 30% do valor máximo da comissão nos meses em
que a ré deixou de pagar a comissão ao autor”. Assim, tendo em conta que as
fichas financeiras de fls. 174/179 demonstram o pagamento de comissões em todos
os meses trabalhados, nada há a deferir à parte autora.
Por fim, verifica-se que as comissões foram devidamente
integradas ao salário do autor, conforme se observa pelas rubricas 03975 – md
premio obj 13 sal, 02870 – med premio/obj férias, e 00760 – h. extra s/ premio.
Rejeita-se.
D – Alimentação – Salário in natura
Postula, a parte autora, a integração dos valores recebidos a
título de vale alimentação, no valor mensal de R$ 250,00.
Tais parcelas teriam natureza salarial, por força da letra do
art. 458, caput, da CLT. Contudo, os ACTs da categoria, que estipulam a
obrigação de fornecimento da alimentação, expressamente afastam a natureza
salarial da parcela (cláusula 7, fls. 427 e 450). Em se tratando de parcela
cujo pagamento não estava obrigado, é lícito aos ACTs instituir o benefício com
repercussões limitadas, afastando a sua incidência sobre outras verbas.
Sendo válida a limitação, rejeita-se o pedido de integração
do salário in natura.
E – Jornada de trabalho
O autor pretende o pagamento das horas extras excedentes da
8ª diária e da 44ª semanal, horas extras pelas violações intervalares e
domingos e feriados trabalhados.
A defesa contesta a jornada indicada pela parte autora,
afirmando o autor laborava inserido no sistema de banco de horas. Junta os
cartões de ponto de fls. 180/218.
Os cartões de ponto são impugnados pela parte autora em
relação ao horário de saída e intervalo intrajornada.
Em depoimento, o autor esclarece que (fl. 522):
"que sempre trabalhou como vendedor em sistema de
pré-venda; que anotava corretamente o horário de entrada no cartão de ponto;
que quanto ao horário de saída, anotava no cartão de ponto depois que retornava
para a empresa, descarregava o palmtop com as vendas e depois batia o ponto,
mas tinha que permanecer porque diariamente cada vendedor tinha que relatar as
suas vendas e aguardar a manifestação final do supervisor ou do gerente; que
isso era feito depois da anotação no cartão de ponto; que ocorria de permanecer
após a anotação do ponto quatro a cinco vezes por semana; que somente quando
chegava muito tarde na empresa é que o supervisor liberava para ir embora e só
no dia seguinte que seriam repassadas as vendas; que no sábado o movimento era
fraco e normalmente a anotação está correta; que normalmente fazia 20 a 30
minutos de intervalo; (...) que após a anotação da saída do cartão de ponto
permanecia no trabalho por mais 1h/1h30; que quando trabalhava em domingos e
feriados a anotação do cartão de ponto está correta; que não tinha papeleta de
serviço externo.”
As incorreções apontadas pelo autor são confirmadas pelas
testemunhas Márcio e Daniel (fls. 523/524):
“que a anotação do cartão de ponto ocorria após a reunião de
fim de tarde; no entanto, por vezes continuava trabalhando após a anotação do
cartão de ponto quando tinha que fazer ainda algum fechamento de venda ou
resolver o problema de alguma devolução; que isso ocorria para não gerar horas
extras no banco de horas; que trabalhava após a anotação do ponto por em média
mais 1 hora e em média 3 vezes por semana; que no verão fazia 20 minutos de
intervalo e que no inverno podia fazer uma hora de intervalo, mas tinha vezes
que não era possível, considerando o verão de dezembro a fevereiro; (...) que
quem determinou que o depoente batesse o cartão de ponto e voltasse a trabalhar
foram os supervisores Celso e também Délcio.”
“que não ocorria de anotarem a saída no cartão de ponto e
continuarem trabalhando para fazerem fechamento de venda, mas ocorria por
exemplo de bater o cartão de ponto e depois ser acionado para resolver algum
problema de devolução da mercadoria; que já aconteceu com o depoente de bater o
cartão de ponto e continuar na empresa para resolver algum problema de
devolução de mercadoria; que às vezes ocorria depois de bater o cartão de ponto
de surgir um problema como esse e ter de resolver; isso ocorria porque o
pessoal da logística ficava entre o cartão de ponto e a saída e poderia pedir
ao depoente para resolver alguma coisa; que no verão isso ocorre bastante, em
torno de duas vezes por semana; que em outros períodos a frequência é menor
porque o número de pedidos é menor; que ocorria uma ou duas vezes por mês; que
estima que esse trabalho posterior à anotação do ponto levasse mais 15 ou 20
minutos; que esse trabalho não era anotado no sistema de ponto, que já havia
sido batido; que por vezes resolvia o problema no próprio pátio da empresa;
(...) que era possível usufruir de uma hora de intervalo durante a rota de
vendas; que no verão tinha que ser um pouco mais acelerado, fazendo 30 a 40
minutos de intervalo; que isso é a média; que em feriados também fazia
intervalo reduzido.”
Uma vez que obstruída pela ré a prova legal da jornada de
trabalho, por sua indesculpável negligência, já que ambas as testemunhas
atestam que não eram corretamente anotadas as reduções do intervalo
intrajornada e o labor após a anotação da saída, deve prevalecer a jornada
afirmada na inicial, com os balizamentos postos nos depoimentos colhidos.
Deste modo, considerando-se a média dos depoimentos de ambas
as testemunhas, sopesando a dúvida em favor do autor, fixa-se, para apuração
das horas extras, que o autor laborava por 40min além da jornada registrada nos
cartões de ponto, em três vezes por semana durante os meses de dezembro,
janeiro e fevereiro e, nos demais meses, em 7 dias distribuídos ao longo de
cada mês. Considera-se, ainda, que nos meses de dezembro a fevereiro, de
segunda a sexta, havia 25min de intervalo. Nos demais meses, o intervalo, de
segunda a sexta-feira, era de 1h em metade dos dias e de 25min na outra metade.
Estão corretos os registros em relação ao labor em sábados, domingos e feriados,
inclusive quanto ao intervalo intrajornada pré-assinalado.
Na ausência dos
registros de ponto ou no caso de registros apócrifos ou ilegíveis, a despeito
da determinação de sua juntada sob as penas do art. 359 do CPC, não se tratando
de períodos de afastamento ou férias, deve ser considerada a maior jornada
mensal constante dos registros anexados, inclusive quanto às violações
intervalares.
Inaplicável ao autor o sistema de banco de horas pretendido
pela ré.
Note-se que os acordos coletivos que instituíram o sistema de
banco de horas estabelecem a obrigação de fixar, “com antecedência mínima de
24h, os dias em que haverá aumento do trabalho ou ausência, folgas ou redução
do trabalho, bem como a sai duração e a forma de cumprimento” (cláusula 3ª, fl.
403, 408 e 456). Contudo, não há nos autos qualquer demonstração que os
elastecimentos da jornada ocorriam da forma programa prevista nos ACTs.
Também não se observa a concessão de folgas com antecedência
e previsibilidade suficiente para tornar útil o tempo respectivo para o
trabalhador, uma vez que de nada lhe basta a compensação de sobrejornada com
liberação do trabalho sem prévio aviso. Do ponto de vista da boa-fé contratual,
é indispensável, para a regularidade da compensação, que a folga compensatória
assegure antecedência suficiente ao trabalhador e não se dê simplesmente ao
livre talante do empregador.
Sobre esta questão, colhe-se apoio jurisprudencial:
"Não há como se admitir um sistema de banco de horas em
que a prestação de horas extras durante a semana era habitual; existia labor em
sábados, incidindo também em sobrejornada nesses dias; as folgas eram eventuais
aos domingos e os dias compensados eram estabelecidos com base no livre
arbítrio do empregador. Destarte, a ausência de dias destinados à compensação
impede a aplicação da Súmula 85, do C. TST". (TRT-PR-RO 02637/2003. Ac
1915/2007. Rel Juíza Sueli Gil El Rafihi. DJPR 30.01.2007)
"HORAS EXTRAS - ACORDO DE COMPENSAÇÃO COM PRORROGAÇÃO -
Não obstante possa haver compatibilidade entre os institutos da compensação e
da prorrogação, para tanto há que haver um mínimo de observância às normas
legais. No caso, os cartões-ponto juntados aos autos demonstram uma extenuante
prática de labor extraordinário, inclusive aos sábados, domingos e até feriados,
de forma habitual. Assim, a nulidade do acordo de compensação de jornada deve
ser mantida, porque é manifesto o descumprimento do acordo celebrado,
especialmente quando a sua previsão era de labor somente de segunda a
sexta-feira. Também é inaplicável o Enunciado nº 85 do E. TST em face da
inobservância dos requisitos legais para a implantação do regime de compensação
de jornada." (TRT-PR-RO 16553/99. 5ª T. Ac. 18513/2000. Rel. Juiz Arnor
Lima Neto. DJPR 06.07.2000)
Além disso, verifica-se que o limite de 10h diárias era
frequentemente extrapolado, notadamente em razão do tempo trabalhado sem o
registro de jornada. Assim, também à luz do art. 59, § 2o, da CLT, resulta
inválida a compensação por exceder o limite ali exigido.
Ademais, o labor habitual em horas extras torna ineficaz o
acordo de compensação, seja semanal, seja por meio de banco de horas, na medida
em que ocasiona sobrecarga excessiva de trabalho ao obreiro, que trabalha horas
a mais para compensar e ainda tem a sua jornada de trabalho prorrogada, ficando
submetido a duas causas distintas de elastecimento de jornada: a compensação e
a prorrogação.
Ainda, as fichas financeiras de fls. 175/179 demonstram que o
reclamante auferiu o pagamento de horas extras em todo período contratual, o
que reforça a invalidade de suposto acordo de compensação, em razão da
incompatibilidade entre o regime de compensação e a prestação concomitante de
horas extras.
Deste modo, resulta inerte o sistema de banco de horas, eis
que inexistente durante o pacto laboral o cumprimento dos seus termos. Não se
tratando de compensação semanal, mas de banco de horas, descabem os termos da
Súmula 85, do c. TST, como, aliás, consta expressamente consignado no item V
daquele verbete.
Desta forma, são devidas como extras, as excedentes da 8ª
diária ou da 44ª semanal, o critério mais benéfico a cada semana, divisor 220.
Provada a concessão irregular do intervalo intrajornada,
consoante intervalo fixado, haja vista a realização de jornada superior a 6h
com intervalo inferior a 1h, sem a autorização do Ministério do Trabalho, faz
jus o autor ao recebimento como hora extra do tempo de intervalo não concedido.
A redução do intervalo mínimo de 15min e 1h, como previsto no art. 71 da CLT,
implica em labor não regular, devendo ser remunerado como extraordinário, nos
termos do novel § 4º do citado dispositivo de lei, que positivou o melhor
entendimento que anteriormente já vinha sendo adotado nos tribunais.
Trata-se aí, de remuneração, na expressa dicção legal, não
havendo fundamento para restringir-se apenas ao adicional legal ou limitar as
repercussões remuneratórias.
Identifica-se, ainda, a violação ao intervalo de 11h de que
trata o art. 66 da CLT, como entre os dias 29 e 30/01/2009 (fl. 187). Resulta
daí que as horas extras laboradas dentro do intervalo de 11h a contar do
término da jornada anterior devem ser remuneradas como extras, sob pena de se
tornar inócua a letra da lei.
O fato de o empregado ter realizado horas extras no dia
anterior, não desobriga o empregador a respeitar o intervalo mínimo legal para
início da jornada subseqüente. Até porque, para que haja violação ao intervalo
mínimo de onze horas entre duas jornadas com turnos fixos, considerando-se que
o intervalo intrajornada seja o máximo de duas horas, é preciso que o empregado
trabalhe mais que três horas além da oitava diária no dia anterior. Tal
elastecimento, excessivo, encontra óbice no artigo 59 da CLT que limita o
número de extras em duas. Porém, se ainda assim o empregado realiza mais de
três horas extras em um dia, o empregador está obrigado a assegurar que a
jornada somente reiniciará após onze horas da cessação do trabalho.
Quando tal intervalo é violado, o empregado fica exposto a
duplo desgaste: além de trabalhar além do máximo permitido no dia anterior, no
subseqüente inicia o labor sem o descanso mínimo, justamente quando mais dele
necessitava. Cria-se, assim, componente adicional de risco a acidentes e ao
desgaste psicossomático.
Dessarte, se o empregador exige do empregado que inicie a
jornada dentro do intervalo mínimo legal a contar da cessação do trabalho no
dia anterior, deve remunerar as horas superpostas ao lapso de proteção como
extras, independentemente de que tenha, no dia anterior, pago horas extras. Não
há bis in idem, aí, eis que são horas diferentes e lesões diferentes,
independentes entre si.
Contudo, não se verifica, e a parte autora não indica,
violações ao intervalo intersemanal de 35h. Tal violação ocorre quando há a
concessão de folga semanal de pelo menos 24h, mas com duração inferior às 35h,
decorrentes dos arts. 66 e 67 da CLT, quando serão devidas como extras com 100%
as horas laboradas antes de completadas as 35h. Situação diversa daquela em que
não há o gozo de folga semanal de ao menos 24h, mas sim o trabalho em todos os
dias da semana, hipótese em que o que é devido é o pagamento de todas as horas
trabalhadas no dia de descanso. Somente a segunda situação é verificada na
espécie.
Cita-se, por exemplo, o labor no domingo 06/09/2009 e no
feriado 07/09/2009 (fl. 194), sem a concessão de folga compensatória.
Considerando-se que as testemunhas informam que havia
atividades internas no início e no final da jornada, que não estavam dedicadas
à atividades de vendas em si, não se pode considerar que a extensão de jornada
do autor, que decorria dessas atividades ao início e ao final, resultasse em
maior volume de vendas e comissões, de modo que, na situação dos autos, não há
como se considerar já remunerada a hora base do labor extraordinário pelas
comissões recebidas. Assim, não é o caso de aplicação do critério de que trata
a súmula 340 do c. TST, devendo as horas extras ser calculadas sobre a
integralidade da remuneração, com divisor 220 e acrescidas do adicional.
Dessarte, defere-se o recebimento das horas extras
trabalhadas, obedecidos os critérios supra, assim entendidas as excedentes da
8ª diária ou da 44ª semanal, o critério mais benéfico a cada semana, divisor
220, bem como os minutos faltantes para completar o intervalo intrajornada
mínimo de 1h para as jornadas superiores a 6h e de 15min para as jornadas até
esse limite, assim como as horas laboradas dentro do intervalo entrejornadas de
11h, a contar do término da jornada anterior, acrescidas dos adicionais
praticados pela ré, assegurado o mínimo de 50%. Deferem-se, ainda, as horas
laboradas em domingos e feriados, sem folga compensatória na mesma semana,
acrescidas do adicional de 100%. Deferem-se os reflexos em repousos semanais e
feriados e, com estes, em aviso prévio, férias mais um terço, natalinas e,
após, FGTS (11,2%).
Dever-se-ão abater, mês a mês, os valores já pagos ao título
e idênticos reflexos quitados, consoante já comprovados nos autos. Neste
sentido, a matéria já está pacificada no âmbito da SDI-1 do Tribunal Superior
do Trabalho, in verbis:
RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º
11.496/2007. ACÓRDÃO TURMÁRIO PUBLICADO EM 13/12/2007. COMPENSAÇÃO DOS VALORES
PAGOS A TÍTULO DE HORAS EXTRAS. LIMITE. 1. Discute-se na hipótese se a
compensação dos valores deferidos a título de horas extras com os valores pagos
sob o mesmo título deve ser apurada no período compreendido pelo mesmo mês a
que se referem ou sobre a totalidade dos pagamentos. 2. Essa douta SBDI-1 tem,
reiteradamente, se firmado no sentido de que o artigo 459 da CLT, ao limitar em
um mês o tempo para a realização do pagamento dos salários, atraiu a mesma
periodicidade para as demais verbas que têm natureza salarial. Logo, a
compensação das horas extras pagas com aquelas efetivamente realizadas deve ser
realizada dentro do próprio mês a que se referem, tendo em vista que é idêntico
o fato gerador de seu pagamento e, ainda, por constituírem as horas extras
parcelas de natureza salarial, não havendo amparo legal para que eventual saldo
das referidas horas seja compensado nos meses subsequentes. Precedentes: E-RR -
7561/2004-003-09-00, Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ - 15/8/2008;
E-RR-7447/2004-005-09-00, Rel. Min. Brito Pereira, DJ 05/09/2008. 3. Recurso de
embargos parcialmente conhecido e desprovido. Processo: E-RR -
6583100-59.2002.5.09.0900 Data de Julgamento: 13/11/2008, Relator Ministro:
Guilherme Augusto Caputo Bastos, Subseção I Especializada em Dissídios
Individuais, Data de Divulgação: DEJT 20/03/2009.
Quanto ao critério de apuração dos cartões de ponto, apenas
para se evitarem dissídios na liquidação do julgado, já que a matéria tem
disciplina legal, esclarece-se que a apuração deve observar a correspondência
dos cartões de ponto com os dias a que tais anotações efetivamente se referem,
independentemente do mês de referência do cartão. Feito isto, deve ainda ser
observado que as horas extras se constituem em salário e, portanto, devem ser
pagas no prazo do art. 459, § 1º, da CLT. Assim, para apuração das extras
devidas em cada mês deve-se considerar o período do primeiro ao último dia
desse mês.
F – Multa convencional
Assevera o autor que a ré descumpriu a cláusula 14 do ACT,
razão pela qual deve ser condenada ao pagamento de multa convencional.
A cláusula em comento impõe a obrigação de controle de
jornada e produtividade dos trabalhadores que laboram em área externa (fl. 41).
Tendo em vista que foi reconhecida a fraude dos cartões de
ponto em relação aos horários de saída e intervalo intrajornada, verifica-se o
descumprimento dos instrumentos normativos da categoria, que dispõem sobre o
controle de jornada.
Assim, a ré deverá pagar ao autor multa convencional no valor
de 10% do salário normativo de admissão da categoria, conforme previsto na cláusula
25 do ACT de fls. 38/44, corrigido.G – Rescisão contratual
Postula o autor a conversão da demissão em dispensa
imotivada, em razão da ausência de homologação sindical. Pleiteia, ainda,
verbas rescisórias e multas dos arts. 467 e 477 da CLT.
A defesa nega a existência de vício de vontade na demissão do
autor, sem justificar a ausência da homologação sindical.
Na espécie, o TRCT de fls. 347/348 está totalmente apócrifo,
sendo incontroverso que o obreiro não teve qualquer assistência na rescisão contratual.
Neste caso, o que se discute não é se o autor se demitiu ou não, o que é
incontroverso, mas sim se é válida tal iniciativa.
Consiste em requisito formal de validade do ato de demissão
pelo empregado com mais de um ano de serviço, na forma do art. 477, § 1o, da
CLT, a assistência sindical ou do Ministério do Trabalho.
O descumprimento desse requisito implica, em princípio, na
conversão da demissão em dispensa sem justa causa. Neste sentido é o
entendimento da jurisprudência do e. TST:
RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. PEDIDO DE
DEMISSÃO NÃO HOMOLOGADO PERANTE O SINDICATO. CONTRATO DE TRABALHO SUPERIOR A UM
ANO DE VIGÊNCIA. NULIDADE. CONVERSÃO DA DEMISSÃO EM DISPENSA SEM JUSTA CAUSA. A
jurisprudência majoritária no âmbito desta Corte Superior firmou-se no sentido
de que o requisito previsto no art. 477, § 1º, da CLT configura norma cogente,
impondo um dever e não mera faculdade à disposição das partes. Desse modo, em
caso de pedido de demissão firmado por empregado cujo contrato laboral tem
vigência superior a um ano, a assistência do sindicato da categoria ou de
autoridade do Ministério do Trabalho é formalidade essencial e imprescindível,
sem a qual o ato jurídico não se perfaz, gerando a presunção de que a dispensa
tenha ocorrido sem justa causa. Recurso de embargos conhecido e não provido.
E-RR - 367-57.2010.5.03.0004, Relator: Augusto César Leite de Carvalho,
Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 10/08/2012.
Considera-se que tal requisito de validade até pode,
secundariamente, ser suprido judicialmente. Mas isso dependeria de prova, a
cargo do empregador, não apenas da manifestação obreira, mas das condições em
que se deu essa manifestação. Por haver descumprido o requisito legal,
inverte-se a presunção de legitimidade do ato, que passa a ser presumidamente
inválido, cabendo ao réu produzir prova suficiente da idoneidade da
manifestação de vontade obreira.
Não havendo tal prova, converte-se a demissão em despedida
sem justo motivo, sendo devidas, portanto, as seguintes verbas rescisórias, que
ora se deferem:
a) aviso prévio indenizado de 30 dias;
b) 4/12 avos de gratificação natalina, já observada a projeção do aviso prévio;
c) férias proporcionais à razão de 7/12 (nos limites do pedido), acrescidas de
1/3; d) FGTS (11,2%) sobre as verbas dos itens anteriores e multa de 40% sobre
o total dos depósitos devidos; e) multa do art. 477, § 8º da CLT, no valor de
um salário mensal do autor.
b) Do valor pago ao autor (R$ 594,70,
fl. 351) deverá ser descontada a importância correspondente a saldo de
salários, gratificações e salário família (fls. 347/348), e o valor
remanescente deverá ser abatido das verbas ora deferidas.
c) Não há que se falar em férias
vencidas, visto que os cartões de ponto demonstram o gozo de dois períodos de
férias nos meses de novembro/2009 e novembro/2010 (fls. 197/198 e 211/212).
Tampouco há verbas rescisórias incontroversas reconhecidas
nesta demanda, sendo incabível a aplicação da multa do art. 467 da CLT.
Deverá a ré emitir as guias para saque do FGTS, com a
comunicação da chave de movimentação, e CD e SD para requerimento do seguro
desemprego, em cinco dias, sob pena de pagar indenização substitutiva.
H – Indenização por danos morais
Postula o autor indenização por danos morais, alegando ter
sido vítima, reiteradas vezes, de humilhações, terror psicológico e agressões
físicas ocorridas em reuniões destinadas a cobrança de metas.
Em depoimento, o obreiro sustenta (fl. 522):
“(...) que o supervisor do depoente na maior parte do período
foi Marcos Paulo; que todo final de mês Marcos Paulo ficava cobrando as metas
dizendo que se não batesse a meta iria ser colocado na reserva ou que havia
fila de gente esperando para exercer o cargo, dizia 'você é fraco', no sentido
de não ter potencial para exercer a função; que chegou a trabalhar dois meses
com o supervisor Everton Lagos, mas com ele não havia esse problema; que houve
um gerente chamado Thaylan, por volta de 2010, não sabendo precisar, que,
chegando numa reunião, disse para todos os vendedores que como não haviam
atingido a meta eram todos uns merdas; (...) que o supervisor Marcos Paulo
sempre se comportou da mesma maneira durante todo o período em que trabalhou
com ele, sendo que todos os vendedores tinha reclamação quanto a ele.”
A despeito da veemente negativa da ré, os fatos alegados pelo
autor são comprovados pela prova testemunhal:
Testemunha Márcio Vicente da Silva (fls. 523/524): “que trabalhou
para ré de 2002 a 2011 como vendedor; que os últimos supervisores do depoente
foram Ricardo Bruni e Délcio; que não trabalhou na mesma equipe que o
supervisor Marcos Paulo; que a conduta dos supervisores era muito agressiva
porque sempre tentavam cumprir as metas mas às vezes as metas eram muito altas
e eram tratados de forma agressiva ou com muita firmeza; que não podiam dizer
que a meta estava difícil porque senão eram tratados de fracassados ou
derrotados e que não vestiam a camisa da empresa; que todos os supervisores
cobravam intensamente as metas, embora alguns tinham característica de levantar
a voz ou bater na mesa e outros falavam baixo, dizendo 'não volte sem bater a
meta, se vira'; que também ouvia xingamentos, como fracassado, derrotado, 'vou
botar a menina do telemarketing para trabalhar em seu lugar'; que chegou a ser
chamado de 'merda' pelo supervisor Maurício; (...) que o gerente Thaylan tinha
o mesmo comportamento agressivo dos supervisores; que chegava na reunião
matinal com o relatório das metas e batia nele e dizia 'que isso é uma meta
fraca, que vocês são fracos em não cumpri-la'; que ele se dirigia a toda a
equipe de vendedores; (...) que Thaylan foi gerente por volta de 2007 ou 2008,
não sabendo precisar; que Marcos Paulo foi supervisor do autor; que presenciava
as conversas de Marcos Paulo com sua equipe porque as mesas ficavam próximas
umas das outras e se alguém se exaltasse conseguia presenciar; que uma coisa
que viu foi uma vez que o autor saiu da reunião comentando com colegas e Marcos
Paulo veio e disse 'se for falar, que venha falar na minha cara'; que houve uma
exaltação entre ambos e quase saíram às vias de fato; além disso, somente
presenciou os comportamentos já mencionados relativos a cobrança de metas.”
Testemunha Daniel Paulo Rodrigues (fls. 524/525): “que
trabalha para a ré desde 2003, inicialmente como vendedor, passando a
supervisor de marketing em 2011 e a supervisor de vendas em janeiro de 2012;
que trabalhou na mesma equipe do supervisor Marcos Paulo, estando subordinado a
ele; que antes de 2004 e 2005, ocorria bastante de participar de corredor
polonês na empresa; que também havia o trote, que jogavam em cima de uma mesa e
faziam várias brincadeiras sem graça, como tirar a roupa, jogar álcool nas
partes íntimas e bater com uma varinha no pé; que metade ou menos das pessoas
que trabalhavam nessa época continuam trabalhando hoje na empresa; que as
mesmas pessoas que eram vítimas do trotes acabavam participando dos trotes dos
outros; que o depoente teve diversas vezes nas duas posições; que depois desse
período melhorou bastante o ambiente de trabalho, havendo acabado o contato
físico; que nas reuniões matinais que participou com o gerente Thaylan não
presenciou xingamentos de parte deste, mas não sabe se ocorreu em outras
reuniões; que também não sabe dizer se isso ocorreu em relação ao supervisor
Maurício; que não se recorda de nenhum caso de agressão verbal que tenha
ocorrido de 2008 para cá; perguntado o depoente quanto à afirmação de Marcos
Paulo de que o gerente Thaylan e o supervisor Maurício teriam xingado Márcio
Vicente de 'merda', como consta do depoimento deste no processo 4393/2011-022,
o depoente respondeu que não presenciou esse fato; (...) que Thaylan foi
gerente por volta de 2008 e 2009, não sabendo precisar; (...) que tinha bom
relacionamento com Marcos Paulo; que Marcos Paulo, quando precisava cobrar da
sua equipe, era um pouco excessivo, no sentido de ser firme; que o depoente
nunca foi chamado de fraco ou fracassado nem presenciou Marcos Paulo falando
isso; que considera excessivo, por exemplo, no retorno das vendas Marcos Paulo
dizer 'por que não conseguiu? Não foi atrás? Não trabalhou?'; que já viu Marcos
Paulo se exaltando, mas com um vendedor específico, não sabendo qual foi; que
se o vendedor não produzisse o esperado por 2 ou 3 meses poderia ser
substituído na rota ou colocado na reserva; que existe um leitor no palmtop que
lê uma etiqueta de código de barras em todos os pontos de venda que o vendedor
entra."
Dos depoimentos transcritos infere-se o terror psicológico
sofrido pelo autor em razão da cobrança excessiva de metas, as quais eram
constantemente alteradas, como já salientado, frustrando reiteradamente a
perspectiva do trabalhador de ter seu trabalho como realizado, ou seja, como
cumprida a sua obrigação, dando sentido ao esforço laborativo despendido.
Contudo, na situação dos autos, não se trata só de cobranças excessivas, mas
também por realizadas com métodos absolutamente inadequados e desrespeitosos.
Conforme afirmado pelas testemunhas, o não batimento das metas implicava em
ameaças de “ser substituído na rota ou colocado na reserva”, além xingamentos e
humilhações.
Esta não é a primeira vez que se constatam situações de grave
violação da dignidade das pessoas no ambiente de trabalho da ré. Longe disso,
são diversas e reiteradas as situações pelas quais a ré vem sendo há vários
anos condenada pela Justiça do Trabalho de todo o país em decorrência de
práticas degradantes e ofensivas, como ridicularizações, trotes, submeter os
trabalhadores a humilhações, a participar de atos obscenos e toda uma
diversidade de ações notadamente ligadas a sua área de vendas, que evidenciam
que havia uma política deliberada e organizada da empresa, que tinha tais
métodos como eficientes para promover a sua atividade econômica.
A imposição excessiva de metas, como verificado na espécie,
implica em exigir do trabalhador serviços superiores às suas forças, o que é
vedado pelo art. 483, I, da CLT, bem como pela NR-17, do MTE. A confrontação
dos procedimentos adotados pela ré com o item 17.6.2 da NR-17, fulcrada no art.
200 da CLT, explicitada pelo Manual de Aplicação da NR-17, do MTE, evidenciam o
caráter degradante dos excessos cometidos pela ré, mesmo após a cessação das
práticas mais acintosas de castigos e humilhações físicas. A imposição
excessiva de metas de produção sem consideração das condições variáveis de sua
consecução tem efeitos altamente deletérios para os trabalhadores:
17.6.2. A organização
do trabalho, para efeito desta NR, deve levar em consideração, no mínimo:
a) as normas de
produção:
São todas as normas, escritas ou não, explícitas ou
implícitas, que o trabalhador deve seguir para realizar a tarefa. (...) A
descrição das normas de produção é muito importante para se entender as
dificuldades do trabalhador, pois, quase sempre, a sua explicitação permite
evidenciar as normas contraditórias da tarefa. (...) Os profissionais de
segurança das empresas têm larga experiência em constatar quantas vezes o
trabalhador deixa de cumprir normas de segurança para conseguir atingir metas
de produção. Ou seja, prioriza-se a produção em detrimento da segurança. O pior
é que, se tudo vai bem, todos acham que a transgressão é normal e desejável.
Quando ocorre o acidente, o serviço de segurança não hesita em rotular a causa
do acidente como o famigerado “ato inseguro” pois o trabalhador conscientemente
deixou de cumprir as regras de segurança. O problema é que não se pergunta por
que ele fez a transgressão.
Não queremos com isso dizer que o trabalho não deve ter
normas, mas sim que estas normas têm de ser coerentes entre si. Aliás, a falta
de normas também é ansiogênica para o trabalhador que tem de criar os modos de
atingir os objetivos da tarefa. Os modernos sistemas de gestão “por objetivos”
se limitam a fixar as metas de produção e deixam o trabalhador se desdobrar
para atingi-las. Para um bancário, por exemplo, é fixado um número de seguros a
vender e ele, dentre várias outras tarefas, é o responsável para desenvolver as
estratégias para conquistar o cliente. Igualmente, as redes de lanchonetes
estabelecem as cotas de vendas dos diversos sanduíches. O atendente tem de
fazer um grande esforço para convencer o cliente a consumir um produto que está
preste a perder a validade. Caso o produto tenha de ser descartado por já não
atender ao padrão de qualidade, é contado ponto negativo no desempenho.
Convenhamos, deve-se fazer um esforço hercúleo para atingir uma meta cuja
realização não depende apenas de si próprio. O atendente precisa convencer o
cliente a mudar sua escolha inicial e pedir o produto que é preciso vender.
No caso dos autos, a prova demonstra que as práticas
utilizadas pela ré para compelir os vendedores a produzir mais e mais, ainda
que modificadas em relação aos relatos mais antigos, continuam se baseando em
humilhações e terror psicológico, para alcançar metas inadequadas e cobradas em
excesso. A alteração sucessiva das metas, acompanhadas da constante ameaça, das
cobranças desrespeitosas pelos supervisores e gerente e mesmo de ofensas
verbais, são medidas que se apoiam na memória recente dos trabalhadores da ré
em relação a práticas de uma violência descomunal antes vivenciada diretamente,
mas cuja lembrança agora apenas reforça “pequenas” violências simbólicas
praticadas cotidianamente pelos supervisores como estratégia de vendas.
Neste caso, ao avaliar o ambiente de trabalho no período do
autor, não se pode fechar os olhos para o pano de fundo do passado recente das
práticas abjetas narradas pela testemunha patronal:
“que antes de 2004 e 2005, ocorria bastante de participar de
corredor polonês na empresa; que também havia o trote, que jogavam em cima de
uma mesa e faziam várias brincadeiras sem graça, como tirar a roupa, jogar
álcool nas partes íntimas e bater com uma varinha no pé; que metade ou menos
das pessoas que trabalhavam nessa época continuam trabalhando hoje na empresa;
que as mesmas pessoas que eram vítimas do trotes acabavam participando dos
trotes dos outros; que o depoente teve diversas vezes nas duas posições; que
depois desse período melhorou bastante o ambiente de trabalho, havendo acabado
o contato físico;”
O mesmo quadro é identificado pela testemunha patronal Marcos
Paulo, o supervisor do autor, ouvida em 30/08/2012 no processo 4393-2011, cuja
cópia da ata é juntada pela ré (fl. 531) e relata a cultura de vendas baseada
na violência, antes e atualmente:
“(...) 04) que o gerente Tailand e o supervisor Maurício
xingavam o reclamante de “merda”, porém não lembro o motivo disto; 05) que
presenciou o ocorrido em duas situações, acreditando que tenha sido em 2009;
06) que, quando da entrada do reclamante na reclamada ele foi amarrado, passou
por corredor polonês, fato comum entre os vendedores relacionados a meta ou
brincadeira entre eles; 07) que acredita que isso ocorreu até 2005; 08) que não
se recorda de o reclamante ter se queixado desses fatos;”
Para que se chegue à realização de práticas como essas, é
necessário um ambiente de trabalho já bastante degradado, de forma tal que a
óbvia ignonímia não resulte em reação à altura, tanto de parte daqueles que são
vítimas, quanto dos demais que são submetidos a conviver ou participar dessas
práticas. Quando a violência é mantida ao longo do tempo, vai se tornando
rotina e cria as condições para que cada vez mais violações sejam toleradas e
consideradas "normais" e as vezes sequer percebidas como tais pelas
pessoas que as inflingem e mesmo as que as sofrem.
Em um segundo momento, a suspensão das manifestações de
violência mais grotescas já pode dar lugar a formas um pouco mais “sutis”, mas
não menos insidiosas de menoscabo, mas que continuam a veicular a mesma cultura
de desrespeito, que pretende arrancar resultados dos vendedores a qualquer
custo.
É fato notório que em inúmeras demandas a ré já foi condenada
a pagar indenização por dano moral em face de práticas de assédio moral, o que
revela a ineficácia dessas condenações para obstar uma cultura organizacional
que precisa ser modificada urgentemente. Mesmo após a celebração do TAC com o
MPT continuaram as práticas de violência. Isso ocorre, porque o acirramento da
racionalidade meramente econômica pode levar, como levou, ao proporcional
menosprezo dos valores próprios à dignidade das pessoas que trabalham, uma vez
que são consideradas meros instrumentos da obtenção de lucro.
É impressionante como a racionalização da produção
capitalista, ou seja, a instrumentalização de tudo e todos em prol da
eficiência ótima da atividade empresarial, leva pessoas normais a agirem
malignamente, mesmo por motivos banais. Não se trata de imputar aos gerentes da
ré a inteira responsabilidade pela ignonímia, mas de perceber como a
organização do trabalho pode levar a práticas que devoram as características
éticas mais fundamentais da condição humana. A lógica da rentabilidade máxima
como objetivo a ser alcançado a qualquer custo, tende ao descontrole e destrói
progressivamente as próprias fontes de produção de valor: a natureza e os seres
humanos. Ultrapassar quaisquer limites para atingir os resultados significa que
as pessoas são um mero instrumento subordinado à obtenção daqueles resultados
de rentabilidade negando a sua condição de sujeitos com dignidade. Na produção,
essa lógica pode se expressar em estruturas organizacionais que não só produzem
sofrimento nas pessoas que trabalham, acabam por funcionalizar o sofrimento à
produção, incorporando-o às estratégias organizacionais.
Estruturas organizacionais impessoais têm grande poder (e
responsabilidade) na produção e reprodução de práticas que levam pessoas de bem
a se comportarem de maneira maligna. Essa origem alheia à estrutura da
personalidade dos agentes, que foi objeto de reflexão quanto ao engajamento de
pessoas de bem na colaboração com o nazismo e que volta a ser percebida nas
atrocidades cometidas recentemente contra prisioneiros no Iraque, se faz
presente em condutas empresariais que parecem fatos isolados mas que ocultam
sua origem sistemática.
Em rápida consulta exclusivamente aos arquivos do E. Regional
Paranaense, verifica-se que as práticas de violência psicológica sofridas pelo
autor ocorreram após diversas condenações da ré ao pagamento de indenização por
danos morais, transitadas em julgado. Cita-se, por exemplo, o processo
1301-2005-024, transitado em julgado em 09/05/2006, no qual houve a condenação
no valor de R$ 30.000,00:
4. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL
O Juízo de primeiro grau condenou a Ré ao pagamento de
indenização no importe de R$ 30.000,00. Concluiu, com fulcro na prova
testemunhal, pela existência de dano moral.
A Ré postula a exclusão da condenação. Alega que o Autor nem
sempre cumpria as metas estipuladas e que não há prova robusta da prática de
ato ilícito. Por cautela, pleiteia a redução do valor arbitrado, por
considerá-lo excessivo.
Sem razão.
As três testemunhas arroladas pelo Autor foram uníssonas em
afirmar que o supervisor era rude com os vendedores. A título de exemplo,
cita-se o depoimento da testemunha Carlos:
[...] 11) o supervisor Luciano era rude, chamava os
vendedores de ignorantes, burros, isto quando as metas do dia não eram
cumpridas; 12) o supervisor Luciano xingou o reclamante, mas o depoente não se
recorda as palavras; 13) o supervisor Luciano chegou a rasgar o uniforme do
reclamante, porque estava desgastado; [...] (fl. 115).
Ora, em face da harmonia observada, as declarações prestadas
pelas testemunhas de indicação do Autor prevalecem sobre o depoimento da
testemunha arrolada pela Ré. Ademais, deve-se levar em conta o fato de que o
Juiz que presidiu a audiência de instrução (fl. 114) foi quem proferiu a
sentença (fl. 124) e estava em contato imediato com a prova oral. Assim,
merecem ser prestigiadas as impressões do juiz que proferiu a sentença, o qual
concluiu pela prevalência das declarações das testemunhas do demandante.
Logo, entendo que restou comprovada a existência de dano
moral. Quanto ao valor arbitrado, este não se mostra excessivo, mormente em
face do caráter educativo da medida.
Mantenho.
TRT-PR-01301-2005-024-09-00-4-ACO-11784-2006-publ-28-04-2006,
Relator JOSÉ APARECIDO DOS SANTOS
No processo 10573-2004-010, a ré foi condenada a pagar
indenização de R$ 22.949,10, decisão que transitou em julgado em 06/11/2006:
2. Dano moral - valor da indenização
Pretende o reclamante acrescer o valor da indenização do dano
moral fixado pela MM. Juíza de origem para R$ 114.745,50 (50 vezes a última
remuneração do autor de R$ 2.294,91).
A MM. Juíza de origem concluiu com base na prova oral que a
reclamada causou dano moral ao reclamante, ao permitir que fossem feitas
"brincadeiras" com o autor que representava punição ao empregado que
não atingisse metas de vendas. O autor em depoimento pessoal afirmou que o
gerente de vendas Jorge submetia a equipe de vendas a situações vexatórias que
consistiam de se vestir de mulher, desfilar, além de terem em suas mesas um
abacaxi ou revistas homossexuais. O preposto confirmou que havia
"brincadeiras" entre os vendedores e, às vezes, com a participação
dos gerentes. As testemunhas ouvidas também confirmaram que havia
"brincadeiras" com participação da equipe de vendas, sendo que a
testemunha indicada pelo autor disse que tinha de usar nariz de palhaço,
desfile enrolado em uma faixa e outros adereços, e a testemunha indicada pela
reclamada afirmou que o gerente externava palavras de baixo calão para toda a
equipe quando não atingiam as metas, sendo que o gerente e o supervisor
organizavam as chacotas descritas das quais não era possível furtar-se (fls.
93/96).
Diante disso, a MM. Juíza de origem entendeu que houve dano
moral, pois as "brincadeiras" noticiadas pelo autor e testemunhas
feriram a honra do empregado e sua dignidade, exorbitando a reclamada em seu
poder de comando. Fixou a indenização no valor de R$ 22.949,10, correspondente
a 10 vezes a remuneração do autor (R$ 2.294,91).
Quanto ao valor da indenização por dano moral, segundo lição
de João Oreste Dalazen, deve-se: "1) compreender que o dano moral em si é
incomensurável; 2) considerar a gravidade objetiva do dano; 3) levar em conta a
intensidade do sofrimento da vítima; 4) considerar a personalidade
(antecedente, grau de culpa, índole, etc.) e o maior ou menor poder econômico
do ofensor; 5) não desprezar a conjuntura econômica do país; 6) pautar-se pela
razoabilidade e eqüidade na estipulação, evitando-se, de um lado, um valor
exagerado e exorbitante, a ponto de levar a uma situação de enriquecimento sem
causa, ou à especulação, ou conduzir à ruína financeira o ofensor; de outro,
evitando-se um valor tão baixo que seja irrisório e desprezível, a ponto de não
cumprir a função inibitória." (in Aspectos do dano moral trabalhista,
Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, v. 65, n. 1, p. 69-84
out./dez. 1999).
Considerando a gravidade do dano, a capacidade econômica da
reclamada, que se trata de empresa de grande porte, o princípio da
razoabilidade e tendo como norte o fato de que o dano moral é acima de tudo
incomensurável, entendo que o valor de R$ 22.949,10 representa importância
capaz de dar satisfação ao autor pelo dano moral que sofreu na reclamada.
Mantenho.
TRT-PR-10573-2004-010-09-00-1-ACO-21977-2006-publ-28-07-2006,
Relatora ENEIDA CORNEL
Ainda que tivessem cessado os atos de violência já
verificados largamente em outros processos, e reiterados pela testemunha
patronal, a prova destes autos demonstra que foram mantidas outras práticas
que, não se pode perder de vista disso, se associam à memória das pessoas já
traumatizadas pela violência anterior. A partir daí, os mesmos fins de
submissão já podem ser atingidos com métodos mais “civilizados” de subjugação,
como as alterações constantes dos critérios de pagamento de comissões,
violência simbólica verbal pelos supervisores “exaltando o tom”, usando
pequenas ofensas ou ameças ou punições para colocação dos vendedores na
reserva, o que a prova dos autos demonstra que continua ocorrendo.
A psicodinâmica do trabalho estudou de perto as relações
entre o trabalho e o sofrimento e mostra como a banalização da violência e do
sofrimento no trabalho é engendrada pela luta cotidiana em conseguir conviver
com práticas nefastas, até o ponto de, como estratégia de defesa contra a
insanidade mental, perceber tais práticas como normais, consentir com elas e
inclusive delas participar. Veja-se a observação do psiquiatra francês
Christophe Dejours, em revelador estudo a respeito:
As motivações subjetivas do consentimento (isto é, derivadas
do sujeito psíquico) têm aqui um papel que considero decisivo, se não
determinante. Pelo menos é isso que mostram as pesquisas sobre o sofrimento no
trabalho de que falaremos mais adiante. É por intermédio do sofrimento no
trabalho que se forma o consentimento para participar do sistema. E quando
funciona, o sistema gera, por sua vez, um sofrimento crescente entre os que
trabalham. (...)
A normalidade é interpretada como o resultado de uma
composição entre o sofrimento e a luta (individual e coletiva) contra o
sofrimento no trabalho. Portanto, a normalidade não implica ausência de
sofrimento, muito pelo contrário. Pode-se propor um conceito de 'normalidade
sofrente', sendo pois a normalidade não o efeito passivo de um condicionamento
social, de algum conformismo ou de uma 'normalização' pejorativa e desprezível,
obtida pela 'interiorização' da dominação social, e sim o resultado alcançado
na dura luta contra a desestabilização psíquica provocada pelas pressões do
trabalho.
Nos ambientes de trabalho atuais, verifica-se, de forma
espantosa, como o vício é convertido em virtude e a capacidade gerencial é
tanto mais valorizada quanto maior for a disponibilidade em ameaçar, exigir
mais e mais esforço sem limites, em submeter os operadores a qualquer custo,
inclusive com a manipulação do medo e do sofrimento. Quem não participa é
também punido ou considerado “fraco” ou seja, sem virilidade.
"Mede-se exatamente a virilidade pela violência que se é
capaz de cometer contra outrem, especialmente contra os que são dominados (...)
abster-se dessas práticas é prova de fraqueza, de covardia, de baixeza, de
falta de solidariedade".
A luta contra a desestabilização emocional decorrente o
sofrimento experimentado pessoalmente e do sofrimento ético vivenciado quando
se impinge um sofrimento injusto a outrem funciona como uma armadilha que leva
à insensibilização e tolerância para com as causas do sofrimento, gerando mais
violência e sofrimento. Portanto, frise-se, a ausência de reação moral dos
sujeitos não é um sinal da irrelevância dessas práticas de violência, mas é,
sim, o resultado de um grau ainda mais avançado de deterioração moral das
relações interpessoais no ambiente de trabalho, produzido pela estratégia
organizacional.
A Juíza do Trabalho Márcia Novaes Guedes, em Terror
Psicológico no Trabalho, relata sintomas sociais no ambiente de trabalho
bastante similares àqueles verificados nas situações acima identificadas:
"A permissividade reinante num ambiente psicologicamente
doente, acaba por moldar um caráter médio sofrível, com baixo padrão de
moralidade, alargando a porta para a banalização da maldade e a tolerância para
com atitudes absolutamente reprováveis."
Outro tópico já clássico das práticas de terror é que, após
modificada a situação hegemônica em que elas se davam, como quando ocorre a
queda de regimes totalitários ou, na situação dos autos, com a determinação de
cessarem as práticas mais violentas, isso não significa que as coisas voltam ao
estado anterior. Ao revés, as estratégias a partir daí são aquelas conhecidas
como de “apagamento dos vestígios”, em que se pretende negar a violência ou
justificá-la num dado contexto, sustentando que, agora, tudo voltou à
normalidade.
É esse a questão envolvida naquilo que hoje se chama de
justiça de transição, subseqüente ao término de processos estruturais de
violência e que tomou as páginas dos jornais com as denominadas comissões da
verdade dos países que passaram de períodos ditatoriais a regimes democráticos.
O ponto chave que interessa, aí, é que sem reconstruir as relações
intersubjetivas entre as pessoas que viveram a violência – o que depende do
resgate da verdade – a violência não cessa. Embora cessem determinadas práticas
mais aberrantes, a violência sistemática segue dentro das pessoas que tendem a
continuar a reproduzi-la, ainda que sob outras formas. Isso explica as
referências das testemunhas ao fato dos supervisores ficarem “exaltados” nas
reuniões, pelo não cumprimento das metas.
A manipulação da ameaça como estratégia gerencial que se
utiliza do medo e do sofrimento no ambiente de trabalho é, como descreveu
Dejours, um dos mais perversos e freqüentes instrumentos na administração de
empresas de alta competitividade. Como relatam as testemunhas, a luta pelos
pontos na disputa pelo mercado de bebidas era o grande mote de toda a pressão e
práticas degradantes dos diversos gerentes da ré. Os gerentes, diz Dejours
"por sua própria experiência e medo, eles sabem que, usando da ameaça de
demissão eles podem intensificar o trabalho dos operadores bem mais do que se
acreditava ser possível."
E as referências à substituição dos integrantes da equipe de
vendas, que não atingidos os objetivos, são destituídos de qualquer dignidade,
expostos a humilharem-se para que fique claro que são meros instrumentos desses
objetivos, ou quando “colocados na reserva” ou são alterados constantemente os
critérios de metas a serem alcançadas, em franca alteração das condições contratuais,
são características desse processo. Trata-se de formas de violência distintas
daquelas aberrações já vistas, mas que integram o mesmo processo. Agora já não
é mais necessário recorrer à violência física, aos “trotes” ou às
lamentavelmente clássicas “dancinhas”, reiteradamente utilizados pela ré em
todo o país, como narrado em um sem-número de processos judiciais. A submissão
já está dentro das pessoas.
Com efeito, a descrição das práticas de terror no ambiente de
trabalho é de significativa semelhança, sempre envolvendo boa parte das
características também encontradas na situação dos autos, denotando seu caráter
sistemático.
Do ponto de vista do direito, em um sistema que tem por
fundamento a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho e da livre
iniciativa (CF, art. 1o, III e IV), sendo objetivo fundamental a construção de
uma sociedade livre, justa e solidária (CF, art. 3o, I) e assegurado o direito
fundamental ao trabalho (CF, art. 6º), é curial que tal espécie de prática deve
ser coibida, não se admitindo que a atividade econômica se sobreponha a tais
valores e objetivos fundamentais (CF, art. 170). E o primeiro passo para a
reversão do processo de banalização das práticas de injustiça nas relações de
trabalho está em admitir o sofrimento e o medo que elas produzem, rompendo o
silêncio, inclusive mediante o processo judicial. Neste ponto, o processo
judicial se qualifica como útil instrumento de elaboração que permite reverter
a "normalização" da injustiça contribuindo para resgatar os sentidos
de humanidade devorados pela racionalização.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, assegura a
reparação da ofensa ao patrimônio moral da pessoa, soterrando as dúvidas até
então vigentes na doutrina:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação;
Evidentemente, também o empregador, que responde pelos atos
de seus prepostos (art. 931 do Código Civil), está obrigado a respeitar a
inviolabilidade moral do empregado. Na lição de Délio Maranhão "as
obrigações acessórias do empregador, e que estão previstas na lei, se referem,
de um modo geral à prevenção dos danos que o empregado possa sofrer tanto
física como moralmente pela execução do trabalho; à assistência e indenização
quando tais danos ocorrerem;(...)" (grifei). "E, acima de tudo,"
continua o Mestre, "tem o empregador a obrigação de respeitar a
personalidade moral do empregado na sua dignidade absoluta de pessoa
humana."
Caracterizado o dano moral, resultante de violação, pelo
empregador, de seus deveres de respeito à condição humana do empregado, a ser
indenizado, cumpre fixar quais os parâmetros à indenização por dano moral
postulada.
Ora, numa situação como esta, em que se voltam a constatar
práticas de violência como tais no ambiente da ré, não se pode simplesmente
voltar a repetir os mesmos patamares de condenação antes praticados e que já se
revelaram ineficazes, rotinizando e mesmo precificando um sistema de gestão
baseado na violência. A ré continua tendo como estratégia básica de gestão de
vendas a manipulação do medo e da violência, ainda que não mais se utilize das
formas mais grosseiras de antes.
O histórico mostra que esta Justiça do Trabalho falhou, por
timidez, ao reiterar, ao longo de anos e anos, condenações acanhadas diante das
mesmas práticas bárbaras. Valores acanhados tornam o abuso economicamente
interessante para a empresa. O resultado é que se legitima a violação da
dignidade humana em nome da eficiência econômica, pois, nas palavras de Carlos
Eduardo Pianovski Ruzyk, "a violação será sempre mais eficiente e
competitiva que a prevenção".
Já sendo reiterada a condenação da ré pelo mesmo tipo de
práticas, ainda que decorrentes de fatos distintos, como se pôde verificar
nestes autos e nos outros processos antes mencionados, observa-se que há já a
instalação de uma cultura organizacional deteriorada em que proliferam práticas
nocivas como tais. Vale dizer, para a ré, o valor de uma condenação, além de
compensar o autor, deve também levá-la a adotar todas as medidas necessárias
não só para coibir tais excessos quando eles vêm à luz do processo judicial,
mas para reconstituir a sua cultura organizacional para que eles não mais
ocorram. Sem refazer as relações intersubjetivas no âmbito das relações de
trabalho da ré, o que depende de um longo e delicado trabalho de apuração da
verdade, de reabilitação das pessoas, de reconstrução de valores, os efeitos da
violência sistemática se perpetuarão.
Ou seja, é preciso não só que a condenação torne
desinteressante, do ponto de vista econômico, manter o mesmo tipo de práticas
gerenciais, a fim de evitar-se que novas vítimas ocorram. É preciso que levem
que a ré se mova a adotar uma ampla política de transformação da sua cultura
organizacional.
É dever do empregador, como de resto de todo contratante,
zelar de modo a não causar danos previsíveis à contraparte. Trata-se, o dever
de cuidado, um dever implícito – lateral, dizem os juscivilistas – de todos os
contratantes, expressão do princípio jurídico da boa-fé objetiva (CLT, art. 8º,
CCB, arts. 187 e 422). “Assim” - observa com precisão Eduardo Baracat, “decorre
do princípio da boa-fé objetiva, o dever de cuidado do empregador de não expor
a imagem do empregado a situações vexatórias ou humilhantes, que venham
denegrir sua imagem perante os colegas ou sociedade, sob pena de reparação de
dano moral”.
Diante disso, não se pode simplesmente repetir aquilo que já
foi feito. Tendo em conta os limites do pedido, considerando-se todos os
fundamentos mencionados e, bem assim, o elevado porte econômico da ré, uma das
maiores companhias de alimentos do mundo, fixa-se o valor da indenização
pecuniária por danos morais, convertendo-se o limite postulado, nesta data, em
R$ 62.200,00, atualizáveis a partir de então.
Outrossim, impõe-se reparação in natura, considerando-se que
as humilhações passadas pelo autor foram presenciadas por diversos outros
trabalhadores, afetando sua imagem e honra, de forma a recompô-la, assim como
em prol da reconstituição do ambiente de trabalho na ré. Deverá a ré, no prazo
de 8 dias, contados do trânsito em julgado, independentemente de intimação,
divulgar cópia da presente sentença, na sua íntegra e em tamanho original, em
local de ampla visibilidade para todos os trabalhadores, durante 90 dias, em
todas as unidades mantidas no Paraná, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00.
Por fim, havendo prova nestes e outros autos de que a ré
continua atuando de forma generalizada e sistemática mediante estratégias de
gestão de vendas baseadas na manipulação da violência moral, demonstrando que é
insuficiente apenas cessar as práticas de violência física e moral mais
grotestas, sendo indispensável promover, no âmbito da ré, empresa de grande
porte e abrangência nacional, uma profunda transformação de sua cultura
organizacional, oficie-se ao MPT, com cópia da presente sentença, para que
adote as providências cabíveis.
I – Honorários advocatícios
A parte autora não faz prova de estar assistida por seu
sindicato de classe, razão pela qual desatende aos requisitos dos arts. 14 e 16
da Lei 5.584/70, única hipótese de deferimento de honorários por mera sucumbência
no processo do trabalho, em que segue vigendo o jus postulandi das partes.
Por outro lado, a regra legal da reparabilidade integral,
inserta nos artigos 389 e 944 do Código Civil, impõe que a reparação decorrente
de responsabilidade contratual ou extracontratual deve alcançar toda a extensão
do dano e não apenas o montante da obrigação inadimplida. Daí decorre que não
podem ser excluídos da reparação os gastos que a parte eventualmente tenha para
demandar em juízo e fazer valer o direito obstado pela contraparte. E, ainda
que a parte autora não esteja obrigada a constituir advogado para demandar, é
inegável que esse auxílio técnico é relevante para uma adequada recomposição do
dano sofrido. A não obrigatoriedade legal do advogado em nada afasta que a
necessidade de sua utilização possa ser incluída no montante da reparação.
Para compreender essa separação, basta ter-se em conta, em
raciocínio a fortiori, o fato singelo de que alguém que teve a vidraça de sua
casa quebrada por ato ilícito de outrem tem o direito a reparação
correspondente não só ao valor do vidro, mas também ao valor do serviço de
reparação, ainda que qualquer pessoa com alguma habilidade seja capaz de
realizar, ela própria, com certo esforço, a retirada dos estilhaços e a fixação
do novo vidro. Embora ela própria possa realizar o trabalho, ela tem o direito
de contratar o serviço em condições normais de mercado e ser ressarcida pelo
ofensor. No que respeita à necessidade do advogado, mesmo considerando o
direito da parte de dispensá-lo, sua importância para o exercício normal do
direito suprimido é induvidosamente mais relevante que aquela do profissional
vidraceiro, do hipotético exemplo cogitado, não se podendo reputar como algo
supérfluo ou desnecessário à reparação do dano, ainda que haja o direito à
postulação direta.
É preciso ter-se claro que tal direito à reparação integral
não se confunde com os honorários decorrentes de sucumbência, que, segundo a
jurisprudência dominante, não são aplicáveis ao processo do trabalho. Num caso,
tem-se a necessidade de demonstração de uma despesa concreta da parte, que seja
decorrente do descumprimento da obrigação legal ou contratual, donde se
autoriza a indenização, como direito da parte. No outro, tem-se a condenação
automática em honorários, pela mera sucumbência, como um direito do causídico
que atuou.
Na situação dos autos, a parte autora colaciona contrato de
honorários que leva à demonstração da existência concreta de diminuição
patrimonial em decorrência da demanda, a ser indenizada, demonstrando ao Juízo
o montante que efetivamente será arcado pelo empregado para custeio de
advogado, de modo concreto. Tal providência é necessária para demonstrar a
necessidade de reparação para além da obrigação (lato senso) principal e dos
consectários legais, bem como para assegurar qual o montante que efetivamente
virá a ser cobrado do trabalhador.
Diante disso, defere-se a indenização correspondente aos
honorários advocatícios contratados pelo autor, no valor estipulado às fls.
28/29.
J – Retenções previdenciárias e fiscais
Com a Emenda Constitucional nº 20, passa a Justiça do
Trabalho a ter competência para exigir o recolhimento da contribuição
previdenciária incidente sobre as parcelas salariais decorrentes da execução, o
que implica em competência, decorrente da mudança do texto constitucional, para
definir o montante dos valores a serem recolhidos pelo empregado e pelo
empregador no que se refere às parcelas constantes da fundamentação.
Assim, autoriza-se seja retida, apenas no momento de
pagamento ao credor, a quantia cabível a este no que se refere à contribuição
previdenciária incidente sobre os valores salariais ora deferidos, consoante se
apurar em liquidação de sentença, respeitado o limite máximo de contribuição.
Igualmente deverá o empregador comprovar nos autos, após o trânsito em julgado
da sentença de liquidação, a contribuição previdenciária que lhe cabe.
No que diz respeito à retenção de Imposto de Renda, com o
julgamento do RE 196.517-PR, em 14.11.00, Rel. Min. Marco Aurélio, o Supremo
Tribunal Federal entendeu ser da competência da Justiça do Trabalho definir a
incidência ou não do Imposto de Renda, além da Contribuição Previdenciária,
sobre cada parcela objeto de condenação em sentença trabalhista. Diante disso,
ficando pacificada a controvérsia pelo STF, inclusive quanto ao julgamento das
controvérsias relativas à quantificação e incidência do tributo, altera-se o
entendimento anterior, para acolher-se o posicionamento pacificado na
jurisprudência.
Dessarte, autoriza-se a retenção do imposto de renda sobre as
parcelas cabíveis, observados os limites de isenção mensalmente verificáveis de
acordo com os meses de referência dos débitos da ré. Para tanto, dever-se-á
recolher o imposto de renda devido de acordo com o disciplinado no art. 12-A da
Lei 7.713/88, com a redação dada pela Medida Provisória 497/2010, convertida na
Lei 12.350/2010, que dispõe:
Art. 12-A. Os rendimentos do trabalho e os provenientes de
aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma,
pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, quando correspondentes a anos-calendários anteriores ao do
recebimento, serão tributados exclusivamente na fonte, no mês do recebimento ou
crédito, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês.
§ 1º O imposto será retido pela pessoa física ou jurídica
obrigada ao pagamento ou pela instituição financeira depositária do crédito e
calculado sobre o montante dos rendimentos pagos, mediante a utilização de
tabela progressiva resultante da multiplicação da quantidade de meses a que se
refiram os rendimentos pelos valores constantes da tabela progressiva mensal
correspondente ao mês do recebimento ou crédito.
§ 2º Poderão ser excluídas as despesas, relativas ao montante
dos rendimentos tributáveis, com ação judicial necessárias ao seu recebimento,
inclusive de advogados, se tiverem sido pagas pelo contribuinte, sem
indenização.
§ 3º A base de cálculo será determinada mediante a dedução
das seguintes despesas relativas ao montante dos rendimentos tributáveis:
I - importâncias pagas em dinheiro a título de pensão
alimentícia em face das normas do Direito de Família, quando em cumprimento de
decisão judicial, de acordo homologado judicialmente ou de separação ou
divórcio consensual realizado por escritura pública; e
II - contribuições para a Previdência Social da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Com isso, fica assegurado o respeito ao limite de isenção
tributária, que decorre do direito fundamental à imunidade tributária do mínimo
existencial.
III – DISPOSITIVO
Isto posto, decide, o Juízo da 3ª Vara do Trabalho de
Paranaguá, acolher em parte o pedido, para condenar a ré, COMPANHIA DE BEBIDAS
DAS AMÉRICAS - AMBEV, a pagar ao autor, CARLOS LEAL NUNES NETO, consoante se
apurar em liquidação de sentença, observados os critérios e limites da
fundamentação, que integra este dispositivo para todos os efeitos, as seguintes
verbas: a) horas extras e reflexos; b) multa convencional; c) verbas deferidas
no item G da fundamentação; d) indenização por danos morais; e) indenização dos
honorários advocatícios. Deverá a ré emitir as guias para saque do FGTS e
requerimento do seguro desemprego, conforme fundamentação, sob pena de pagar
indenização substitutiva. Impõe-se à ré obrigação de fazer, nos termos do item
J da fundamentação. Juros e correção monetária na forma da lei, observado,
quanto a esta, o vencimento da obrigação, antecipando-se para o mês da
prestação de serviços quando houver prova de pagamento dentro do próprio mês
trabalhado, utilizando-se as tabelas divulgadas pela assessoria econômica do
TRT da 9ª Região (FADT). Custas pela ré, no importe de R$ 3.000,00, calculadas
sobre R$ 150.000,00 valor arbitrado à condenação. Observe-se o constante da
fundamentação quanto à contribuição previdenciária e imposto de renda.
Oficie-se ao MPT, como determinado no item J, independentemente de trânsito em
julgado. Publicada em audiência. Cientes as partes. Nada mais.
LEONARDO VIEIRA WANDELLI
Juiz do Trabalho
Uilliam Frederic D’ Lopes Carvalho
Assistente de Gabinete do Juiz
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