1)- Saúde do Trabalhador. ‘O perito se considera acima da lei’
por Redação Sindicato dos Bancários
A condução da perícia médica no INSS nem sempre é feita com o devido respeito que deve ser dado ao segurado. Para falar sobre o assunto, O Piquete Bancário entrevistou Luiz Salvador, advogado trabalhista e previdenciarista em Curitiba.
Como o senhor analisa o cumprimento da legislação para a saúde e segurança do trabalho no Brasil?
Do ponto de vista formal, as normas se apresentam como satisfatórias. Mas, infelizmente não são aplicadas. O acidente de trabalho se transformou em ótimo negócio a todos aqueles que acreditam na impunidade e no desaparelhamento do estado para fiscalizar.
Investir em segurança para que? O lucro vem a qualquer custo, nem que isso custe vidas. O Governo criou a nova fórmula do FAP, mexendo no bolso de acordo com o fator de morbidade empresarial, e a perícia médica subnotifica o acidente. O perito em uma ponta é perito do INSS e na outra ponta, faz trabalhos em convênios médicos com estas empresas, quando não está atuando junto à justiça do trabalho como perito oficial.
Quando não tem jeito de subnotificar os acidentes como nos casos de uma amputação, por exemplo, trabalham para amenizar os valores das indenizações.
Uma Lei Federal disciplina a formatação da perícia médica. O senhor considera tal legislação suficiente?
Não basta o aspecto formal. Não há observância/cumprimento. O perito sabe que foram dados a ele poderes indiscutíveis. Ele que manda e se considera acima da lei. Quando questionado, responde que seu ato administrativo se reveste no princípio da legalidade e da veracidade.
Sala de perícia do INSS, com raras exceções, é reconhecido popularmente como local de tortura emocional. O segurado não é respeitado, porque como temos denunciado é uma autarquia viciada, sem princípios éticos e morais, infelizmente, dando-se prevalência não ao social, à dignidade da pessoa humana, mas ao interesse patrimonialístico, do lucro a qualquer custo.
Em muitos casos, o trabalhador não se recuperou e tem de voltar ao trabalho. Como agir?
O segurado é evidentemente a parte mais fraca nesta relação. Segundo o chefe da agencia do INSS/Timóteo-MG, quase 99,9% dos recursos administrativos que o segurado tem direito são negados.
O caminho mais confiável é de imediato a via judicial, requerendo de forma fundamentada e consubstanciada em documentos, o restabelecimento do benefício através de liminar. Não sendo concedida, entrar com agravo de instrumento em até 10 dias da data da certificação. A perícia médica judicial tem sido um dos caminhos mais curtos para se restabelecer o benefício.
Quais as propostas para melhorar os serviços de perícia?
A primeira delas seria, sem sombra de dúvidas, a qualificação/especialização dos peritos. A segunda, que eles sejam avaliados por uma comissão formada pela sociedade e, não pelos próprios peritos como ocorre atualmente. Terceiro, fazer um rodízio com os chefes das agências. Salvo exceções, o INSS conta em seus quadros com profissionais que usam seus cargos para benefícios pessoais, trabalhando ao mesmo tempo, dentro das empresas, como perito do INSS e por último até como perito judicial.
O ideal é a implantação de fiscalização e controle de todos esses atos, sendo submetidos esses profissionais a uma política de avaliação de desempenho a ser implantada, através de uma comissão multidisciplinar indicada por representação da sociedade, incluindo as entidades sindicais.
Uma tomada de consciência, em especial das entidades sindicais, como um todo, para atuar em todos esses desmandos, incluindo os peritos que contrariando o código de ética médica, concedessem alta médica a segurado ainda portador de incapacitação, como tem ocorrido casos em que tais profissionais devem ser processados, civil e criminalmente, contribuindo para a moralização do sistema viciado.
Quais os direitos do trabalhador que passa por uma perícia médica?
O segurado merece respeito. O INSS não tem assegurado que o trabalhador seja periciado por um profissional especializado no tipo de sequela/adoecimento.
No geral, o segurado leva para o ato pericial uma infinidade de relatórios e exames, apontando o gravame, mas nem sempre tais documentos são analisados pelos peritos ou mesmo muitas vezes tais resultados nem podem mesmo ser compreendidos, pela falta de especialização do perito.
A dignidade do trabalhador, segurado, acaba sendo violada e não respeitado o direito constitucional garantido, o da ampla defesa e ao contraditório.
De modo geral, quais as principais queixas dos trabalhadores?
A lei protege todo segurado ao recebimento do benefício auxílio-doença, enquanto permanecer a sequela incapacitante. Mas, no geral o segurado já sabe, que o INSS, por uma visão cartesiana e patrimonialista, somente concederá o benefício de lei a alguns, média de 40%.
O restante é dispensado, sem o benefício, como resultado da política de choque de gestão para redução de custos, justamente por falta de fiscalização.
Além disso, observa-se as práticas costumeiras de mercado e o uso das repudiadas subnotificações acidentárias que acabam onerando a previdência, com os custos de auxílio-doença, quando o benefício a ser concedido seria o acidentário, com fonte de custeio específico, proveniente do SAT.
Assim, o sentimento dos segurados é pela existência de uma modalidade de “carta marcada” no sistema do DATAPREV. E são os próprios peritos que muitas vezes, informam ao segurado que não foi ele que negou o benefício, mas, sim, o sistema SABI, que controla todo tipo de concessão de benefício/alta médica.
Há ações civis públicas em dez Estados do país para pedir o fim da alta programada. Porque ela está sendo criticada?
A perícia médica do INSS ao praticar as repudiadas “altas programadas”, acaba atendendo a um interesse patrimonial das empresas para que estes trabalhadores sejam retornados ao trabalho, permitindo-se sejam sumariamente demitidos. A alta programada é um procedimento pernicioso não só contra o segurado que necessita do benefício, mas toda a sociedade que adoece junto. A perícia médica através da alta programada advinha que um segurado portador de amputação de um braço, estará apto em 90 dias, por exemplo, (ver manual de diretrizes de apoio à decisão médico-pericial em ortopedia e traumatologia – MPAS – março de 2008).
Nossa legislação infortunística é uma das melhores do mundo, todavia, sem efetividade. De todos sabido que cabe ao empregador assegurar a todo seu empregado, meio ambiente laboral equilibrado, livre de risco de acidente e ou de adoecimento ocupacional. Todavia, por falta de fiscalização, e com cultura equivocada, patrimonialista, deixam de investir em prevenção, contribuindo para que o Brasil detenha o título de “campeão mundial em acidentes de trabalho”, razão porque temos defendido a adoção no Brasil do Direito Penal Trabalhista, para criminalização desses desrespeitos/abusos, como já ocorre em diversos países, inclusive na Espanha.
* Publicado originalmente pelo Sindicato dos Bancários e retirado do site Adital.
(Adital)
2)- Fórum de magistrados trabalhistas propõe diretrizes e
enunciados sobre pericia judicial
(Fonte: TRT 10ª. Região)
30/05/2014
“Perícias judiciais sobre nexo causal em acidentes de trabalho
devem vistoriar local e posto de trabalho, analisar organização laboral e
verificar dados epidemiológicos, e o perito deve ter conhecimento técnico ou
científico exigível ao caso concreto. As frases
resumem dois dos 13 enunciados propostos por cem magistrados
trabalhistas de todo o país reunidos
no I Fórum sobre Perícias na Justiça do Trabalho, que aconteceu no final de 2013.
Considerada um instrumento importante para embasar decisões de
magistrados, a perícia judicial foi tema do fórum, realizado na ambiente de
aprendizado virtual da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de
Magistrados do Trabalho (ENAMAT). O encontro, um desdobramento do Programa
Trabalho Seguro, teve como
resultado a publicação de diretrizes e propostas de enunciados sobre o tema,
disponíveis no site da escola.
O primeiro documento propõe sugestões de diretrizes para a
avaliação e a elaboração da prova pericial em questões referentes ao meio
ambiente, segurança e saúde do trabalho. Essas diretrizes levam em consideração
que a prova pericial, além de fundamentar as decisões judiciais, tem vocação
para orientar a prevenção de danos à saúde. Isso porque, ao conhecer agentes
que contribuíram para ocorrência de acidentes, o resultado da pericia judicial
podeapontar medidas para a readequação do meio ambiente onde também operam
outros trabalhadores suscetíveis aos mesmos gravames.
Os magistrados também redigiram 13 propostas de enunciados sobre
perícias judiciais em acidentes de trabalho e doenças ocupacionais.”
PROPOSTAS DE ENUNCIADOS SOBRE
PERÍCIAS JUDICIAIS EM ACIDENTE DO TRABALHO
E DOENÇAS OCUPACIONAIS
1. PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO DO
MAGISTRADO. ATUAÇÃO COLABORATIVA. Tendo em vista os termos do artigo 225 da
Constituição Federal, que impõe ao Poder Público e à coletividade a defesa do
meio ambiente e a sua preservação para as gerações presentes e futuras, assim
como o caráter público do processo judicial, deve o magistrado trabalhista
tomar todas as medidas necessárias para informar os órgãos administrativos
participantes do sistema de saúde e segurança do trabalho e o Ministério
Público de decisões judiciais proferidas envolvendo o descumprimento das normas
de saúde e segurança do trabalho, para que estes órgãos possam tomar as medidas
cabíveis conforme suas competências.
2. PERÍCIA EM ACIDENTES DE
TRABALHO E DOENÇAS OCUPACIONAIS. VISTORIA NO LOCAL E NO POSTO DE TRABALHO. ANÁLISE
DA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO.
I - Nas perícias para avaliação
do nexo causal em acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, é necessária
a vistoria no local e no posto de trabalho, a análise da organização do
trabalho, a verificação dos dados epidemiológicos, os agentes de risco aos
quais se encontram submetido o
trabalhador, consoante
estabelece a Resolução nº 1.488/1998 do Conselho Federal de Medicina e demais
resoluções dos conselhos profissionais.
II – Consideram-se agentes de
risco decorrentes da organização do trabalho, também, horas extras
habituais, ritmo intenso,
metas abusivas, trabalho penoso, pagamento por produtividade, trabalho noturno,
trabalho em turno de revezamento, pressão psicológica, monotonia, dentre
outros.
III -A omissão do perito em
vistoriar o local e o posto de trabalho atrai a aplicação do art. 437 do CPC,
podendo ensejar a realização de segunda perícia, nos termos do art. 438 do CPC.
3. PATOLOGIA OCUPACIONAL.
PERÍCIA. PROFISSIONAL COMPETENTE. NEXO CAUSAL E DIAGNÓSTICOS POR PROFISSIONAIS
DA ÁREA DA SAÚDE. POSSIBILIDADE.
I - A perícia deve ser
realizada por profissional que detenha conhecimento técnico ou científico
exigível ao caso concreto (art. 145, do CPC). II - Os diversos profissionais da
área da saúde, tem competência para realizar distintos diagnósticos, cada um em
sua esfera de atuação, bem como para estabelecer o nexo causal.
4. AÇÕES INDENIZATÓRIAS. AÇÕES
DISTINTAS. As ações indenizatórias decorrentes de acidentes de trabalho e
doenças ocupacionais poderão ser, preferencialmente, processadas e julgadas em
ações distintas, para permitir o adequado tratamento da lide.
5. DANO COLETIVO. EFEITOS
METAINDIVIDUAIS DAS LESÕES DERIVADAS DE ACIDENTES DE TRABALHO E DOENÇAS
OCUPACIONAIS. AUDIÊNCIA PÚBLICA.
Havendo reiteração de demandas
judiciais que evidenciem a inadequação do meio ambiente do trabalho, nele
também entendido a organização do trabalho, com potencialidade de dano
coletiva, o órgão julgador poderá analisar a conveniência de realização de
audiência pública, com participação do Ministério Público do Trabalho.
6. AÇÕES DE ACIDENTES DE
TRABALHO. PROVA DOCUMENTAL. DETERMINAÇÃO DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS PELO
EMPREGADOR, INSS/SUS E MTE.
I - O órgão julgador poderá
determinar sejam apresentados documentos pelo empregador, INSS/SUS e MTE,
conforme especificidades do pedido e observado o anexo I, sendo admitida a
inversão do ônus da prova, inclusive quanto aos encargos e despesas daí
decorrentes.
II - Os documentos a que se
refere o Enunciado acima, serão juntados pelo empregador ou entidade
depositária, conforme relação não exaustiva abaixo: pela empresa:
I -Programa de Prevenção de
Riscos Ambientais – PPRA, previstos na NR-9 da Portaria n 3214/78 do MTE; II -
Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT, previstos na NR-9 da
Portaria n 3214/78 do MTE; III -Programa de Controle Médico de Saúde
Ocupacional – PCMSO, nos termos da NR-7 da Portaria n. 3214/78, acompanhado dos
respectivos relatórios; IV- Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP; V - exames
médicos admissional, periódicos e demissional, de que tratam o art. 168 da CLT
e a NR-7 da Portaria 3214/78; VI -cópia do Livro de Registro de Fiscalizações
realizadas pelo MTE; VII -certificados de treinamento do autor da ação; VIII -
AET – Análise Ergonômica do Trabalho (NR 17); IX - CAT; X - Prontuário médico
(cópia integral); XI -Relação de afastamentos inferiores a 15 dias relativos
aos últimos 5 anos; XII - Cartão de ponto e recibos de férias do período da
contratualidade do autor da ação; XIII - Atas das CIPAS do período da
contratualidade.
Pelo INSS/SUS: I - FAP – Fator
Acidentário de Prevenção referente à empresa; II - Códigos de afastamento
referentes aos benefícios previdenciários concedidos ao autor; III - laudos
periciais produzidos; IV - CATs expedidas nos últimos cinco anos; V - Cópia
integral do procedimento administrativo de concessão de benefícios
previdenciários. Pelo MTE: I - autos de infração dos últimos 5 anos II – GFIP
(número de afastamentos da empresa)
7. DANOS MORAIS COLETIVOS.
INDENIZAÇÃO. FINALIDADES. DESTINAÇÃO. RECOMPOSIÇÃO E A PROTEÇÃO DAS COMUNIDADES
E BENS LESIONADOS. A indenização por danos morais coletivos em ações
envolvendo acidentes e meio ambiente de trabalho deve ser,
preferencialmente,revertida a medidas que contribuam para a recomposição e a
proteção das coletividades e bens lesionados, sob pena de desvirtuamento das
finalidades as quais se destina.
8. RESTABELECIMENTO DA SAÚDE,
REABILITAÇÃO PROFISSIONAL E READEQUAÇÃO DO AMBIENTE LABORAL. EXPEDIÇÃO DE
OFÍCIOS AO SUS, AO INSS E AO MTE. O magistrado deverá enviar ofícios aos
órgãos responsáveis pelo sistema legal de segurança e saúde do trabalhador,
para que seja garantida, integralmente, a dignidade da pessoa, o que inclui a
sua reabilitação à saúde e profissional, bem como a reordenação do ambiente do
trabalho, de modo a eliminar os agentes agressivos e, quando isto se revelar
inviável, a neutralizá-los, além de outras medidas.
9. PARÂMETROS PARA QUANTIFICAÇÃO
DA PERDA DA CAPACIDADE LABORATIVA. CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE
FUNCIONALIDADE, INCAPACIDADE E SAÚDE – CIF, ELABORADA PELA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL
DE SAÚDE. Decreto-Lei nº 352, de 23 de outubro de 2007, do Ministério do
Trabalho e da Solidariedade Social de Portugal. Direito Comparado. A
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) e o
Decreto-Lei nº 352, de 23 de outubro de 2007, do Ministério do Trabalho e da
Solidariedade Social de Portugal são plenamente compatíveis com os princípios
norteadores do direito laboral.
10.CONCAUSALIDADE. MULTIPLICIDADE
DE CAUSAS.
I – o agravo à saúde que se
origina de múltiplos fatores não deixa de ser enquadrado como patologia
ocupacional se o exercício da atividade laborativa houver contribuído, direta,
mas não decisivamente, para a sua origem ou agravamento, nos termos do art. 21,
I da Lei nº 8.213/91.
II – A identificação de
enfermidade de natureza não-ocupacional e/ou degenerativa não deve limitar a
investigação do perito na busca pela existência de outros fatores concomitantes
de natureza ocupacional que possam ter contribuído.
11. ACIDENTE DO TRABALHO.
SUPERAÇÃO DO ATO INSEGURO. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO INSEGURA DE TRABALHO.
A análise da ocorrência de
acidente laboral deve ter enfoque na multiplicidade de elementos próprios da
condição de trabalho, relacionadas à exposição do trabalhador a riscos
laborais, restando superada a visão tradicional do ato inseguro em face da
alteração da NR 1 com a nova redação dada ao item 1.7, alínea “b”, pela
Portaria nº 84, de 04 de março de 2009, da Secretaria de Inspeção do Trabalho
do MTE.
12. NEXO TÉCNICO EPIDEMILÓGICO.
IMPLICAÇÃO. LIMITES.
I – O perito deverá relatar se o
fato de o agravo à saúde ou a incapacidade possui natureza acidentária diante
da constatação do Nexo Técnico Epidemiológico – NTEP entre o trabalho e o
agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa (CNAE) e a entidade
motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças –
CID, nos termos do art. 21-A da Lei nº 8.213/91 com a redação da Lei nº
11.430/06 e Decreto n° 6.042/07.
II – A perícia judicial poderá
negar a existência de nexo técnico epidemiológico quando dispuser de
informações ou elementos circunstanciados e contemporâneos ao exercício da
atividade que evidenciem a inexistência do nexo técnico entre o agravo à saúde
a as condições de trabalho, nos termos da Lei nº 11.430/06 e art. 6º da IN nº
31/2008 do INSS, consignando a devida motivação técnica adequada para a não
aplicação do NTEP.
III – A fundamentação a ser
utilizada pelo perito para avaliação do nexo causal e da incapacidade deverá
pautar-se em critérios técnicos adequados, notadamente a IN nº 98/2008.
13. PERÍCIA. SAÚDE MENTAL.
ANÁLISE DO CONTEXTO SÓCIOECONÔMICO-FAMILIAR.
I -Considerando que a definição
de saúde pela Organização Mundial de Saúde envolve o completo bem-estar físico,
mental e social, inclusive, no caso específico da saúde mental, o art. 2o,
caput, e, parágrafo único, inciso II, da Lei n. 10.216/2001, estabelece que nos
atendimentos atinentes à saúde mental deve-se englobar o plexo
sócio-econômico-familiar como forma de garantir o tratamento com humanidade e
respeito dignidade do paciente, deve o expert, quando da realização de perícia
judicial envolvendo adoecimento mental, realizar ampla investigação do periciado,
inclusive considerando o contexto de inserção na família, no trabalho e na
comunidade, considerados os riscos referentes à organização do trabalho
previsto na NR 17.6.2.
II – Em razão das peculiaridades
que envolvem a perícia judicial referente ao adoecimento mental, especialmente
no que se refere a análise percuciente do contexto sócio-econômico-familiar na
qual está inserido o periciado, torna-se legítimo o requerimento pelo senhor
perito de ampliação do prazo concedido para elaboração do Laudo Pericial,
ficando a critério do magistrado, dentro da análise do caso concreto, fixação
de prazo que harmonize a efetividade da produção probatória e o princípio
constitucional da razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, da
Constituição Federal).
DIRETRIZES
SOBRE PROVA PERICIAL EM ACIDENTES DO TRABALHO E DOENÇAS OCUPACIONAIS
Propõe sugestões de diretrizes
para a avaliação e a elaboração da prova pericial em questões referentes
ao meio ambiente, segurança e saúde do trabalho.
CONSIDERANDO que a efetividade
dos direitos sociais, dentre eles a do direito à saúde, na forma prevista pelo
artigo 6º da Constituição Federal, e dos direitos de solidariedade, em
que se destaca o direito ao meio ambiente saudável, na forma preconizada pelos
arts. 7º, inciso XXII, e 225 da Constituição Federal, impõem ao Estado o
dever de utilizar os mecanismos que lhe são próprios para coibir a
nocividade à saúde daquele que depende de sua força de trabalho para o
seu sustento;
CONSIDERANDO que a prova
pericial, no contexto em que a jurisdição constitui atividade essencial
do Poder Judiciário e desdobramento instrumental do binômio Justiça e Saúde,
desponta como mecanismo de dimensão reparatória e preventiva a viabilizar uma
prestação jurisdicional efetiva, na dicção do art. 5º inciso XXXV da
Constituição Federal, para fins de tutela de valores essenciais à vida,
referentes à incolumidade física, mental e psíquica do trabalhador, à sua
saúde e ao meio ambiente
do trabalho saudável, exigindo a
atuação vívida do magistrado na sua realização e avaliação;
CONSIDERANDO que a prova
pericial, a par de fundamentar as decisões judiciais, tem igualmente vocação
para orientar a prevenção de danos à saúde, porquanto é apta a indicar a
existência dos agentes que contribuíram para a ocorrência do acidente ou para a
eclosão da doença e, desta forma, apontar medidas para a readaptação isenta de
riscos e para a readequação do meio ambiente onde também operam outros
trabalhadores suscetíveis aos mesmos gravames;
CONSIDERANDO que o extenso e
complexo arcabouço normativo, de caráter multidisciplinar, aplicável na
produção da prova pericial, torna pertinente a capacitação dos operadores do
direito do trabalho em torno das metodologias nele previstas;
CONSIDERANDO os termos do art.
21-A, da Lei n° 8.213/91, do Decreto nº 6.042/07, das Instruções Normativas
98/2003 e 31/2008 do Instituto Nacional de Serviço Social –INSS, da Instrução
Normativa nº 88/2010 do Ministério do Trabalho e Emprego –MTE, da Resolução nº
1488/98 do Conselho Federal de Medicina – CFM, da Resolução nº 8/12 do Conselho
Federal de Psicologia –CFP;
CONSIDERANDO a preponderância de
perícias judiciais versando sobre acidentes típicos, distúrbios osteomusculares
e transtornos mentais;
CONSIDERANDO as pesquisas e
estudos realizados pelo Comitê Gestor Nacional do Programa Trabalho Seguro,
constituído nos termos da Resolução nº 96, de 23 de março de 2012 do Conselho
Superior da Justiça do Trabalho;
CONSIDERANDO a pertinência do
debate em torno do valor atribuído aos honorários periciais e da sua forma de
pagamento, porquanto questões referentes à destinação orçamentária e aos óbices
processuais relacionados ao adiantamento dos honorários processuais constituem
sérios entraves para a viabilização da própria perícia, quadro que vem
concorrendo para afastar do âmbito de atuação da Justiça do Trabalho muitos
profissionais qualificados para a realização desse imprescindível mister;
O Comitê Gestor Nacional do
Programa Trabalho Seguro:
S U G E R E:CAPÍTULO I – DO PERITO
SEÇÃO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º - Nas perícias em matéria
de acidente do trabalho e doenças ocupacionais deverão ser nomeados peritos que
atendam as normas legais e ético-profissionais para análise do objeto de prova,
tais como médicos, psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas
ocupacionais, engenheiros, dentre outros, sem prejuízo da nomeação de mais de
um profissional, ainda que não se trate de perícia complexa, nos moldes do art.
431-B do Código de Processo Civil.
SEÇÃO II
CAPACITAÇÃO EM PROVA PERICIAL EM
ACIDENTE DO TRABALHO E
DOENÇA OCUPACIONAL
Art. 2º - Deverão ser
viabilizados, quando possível, cursos e outros meios de aperfeiçoamento para
peritos, servidores e magistrados da Justiça do Trabalho.
Art. 3º – A nomeação de peritos em
processos judiciais priorizará, sempre que possível, os profissionais que
participem dos cursos e outros meios de aperfeiçoamento oferecidos pelos órgãos
da Justiça do Trabalho ou entidade parceiras.
CAPÍTULO II - DA PROVA PERICIAL
SEÇÃO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 4° A fundamentação a ser
utilizada pelo perito para avaliação do nexo causal e da incapacidade deverá
pautar-se em critérios técnicos adequados, devendo levar em consideração,
especialmente, em relação aos:
a) acidentes típicos, a Instrução
Normativa nº 88/2010 e o Guia de Análise – Acidentes de Trabalho, ambos do
Ministério do Trabalho e Emprego;
b) distúrbios osteomusculares, a
Instrução Normativa nº 98/2003 do INSS e as normas regulamentadoras do MTE,
notadamente a NR 17 e seu Manual de Aplicação;
c) transtornos mentais, o Manual
de Procedimento para Serviços de Saúde do Ministério da Saúde e a Enciclopédia
da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Art. 5° O perito deverá mencionar
no laudo pericial apresentado ao juízo se o agravo à saúde ou a incapacidade
possuem natureza acidentária diante da constatação do nexo técnico
epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a
atividade econômica preponderante da empresa segundo a Classificação Nacional
de Atividades Econômicas – CNAE e a entidade motivadora da incapacidade
elencada na Classificação Internacional de Doenças – CID, com referências nos
termos do art. 21-A da Lei 8.213/91, conforme a redação da Lei nº 11.430/06 e
Decreto n° 6.042/07.
Parágrafo único - A perícia
poderá deixar de considerar o nexo técnico epidemiológico quando dispuser de
informações ou elementos circunstanciados e contemporâneos ao exercício da
atividade que evidenciem a inexistência de nexo técnico entre o agravo à saúde
a as condições de trabalho, tomando como referência os termos da Lei nº
11.430/06 e art. 6º da IN nº 31/2008 do INSS.
Art. 6° Em seu relatório, o
perito apresentará conclusões técnicas pertinentes à sua investigação que
possam subsidiar o Juiz, nos limites legais de sua atuação profissional, sem
adentrar no mérito das decisões, que são exclusivas às atribuições dos
magistrados.
SEÇÃO II DA INVESTIGAÇÃO PERICIAL
Art. 7º A perícia judicial
realizada nas ações indenizatórias ajuizadas perante a Justiça do Trabalho
contemplará, para a avaliação do nexo causal entre os agravos à saúde e as
condições de trabalho, além do exame clínico físico e mental e dos exames
complementares, quando necessários:
I - a história clínica e
ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;
II - o estudo do local de
trabalho;
III - o estudo da organização do
trabalho;
IV - os dados epidemiológicos;
V - a literatura técnica
específica atualizada;
VI - a ocorrência de quadro
clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas à saúde;
VII - a identificação dos riscos
existentes no meio ambiente do trabalho;
VIII - o depoimento e a
experiência dos trabalhadores;
IX - os conhecimentos e as
práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da
saúde;
X - A capacitação dos
trabalhadores ou outros aspectos de gestão de segurança e saúde do
trabalho que influenciaram a ocorrência do evento.
XI - relatar se havia medidas de
prevenção que poderiam ter evitado a agressão e/ou lesão ao trabalhador, bem
como as medidas de proteção que poderiam ter reduzido as suas consequências;
Parágrafo único. Havendo
necessidade de realização de exames complementares, o perito poderá
solicitá-los, nos termos do artigo 429 do Código de Processo Civil. Art. 8°
Para fins de investigação das causa dos acidentes de trabalho típicos e das
doenças ocupacionais, devem ser analisados os fatores subjacentes e latentes,
nos termos da Instrução Normativa nº 88/2010 e o Guia de Análise – Acidentes de
Trabalho, ambos do Ministério do Trabalho e Emprego.
§ 1° - Entende-se como fatores
imediatos as razões óbvias da ocorrência de um evento adverso, evidenciadas na
proximidade das consequências;
§ 2° - Por fatores subjacentes
compreendem-se razões sistêmicas ou organizacionais menos evidentes, porém
necessárias para que ocorra um evento adverso;
§ 3° - Por fatores latentes,
têm-se as condições iniciadoras que possibilitam o surgimento de todos os
outros fatores relacionados ao evento adverso. Frequentemente são remotas no
tempo e no que se refere à hierarquia dos envolvidos, quando consideradas em
relação ao evento. Geralmente envolvem concepção, gestão, planejamento ou
organização.
Art. 9° A omissão do perito em
proceder à vistoria do local de trabalho, a avaliação e descrição da
organização do trabalho, das incapacidades e funcionalidades, dentre outras
matérias constantes das normas regulamentadoras e dos documentos técnicos
aplicáveis, notadamente os termos da NR 17 e do seu Manual de Aplicação em se
tratando de doenças osteomusculares, poderá acarretar a designação de segunda
perícia, nos termos do art. 337 e seguintes do CPC.
Art. 10 - Durante a análise de
acidentes, as informações prestadas pelas partes devem ser cotejadas com as
demais circunstâncias que envolvem o evento, sempre que estiverem presentes,
isolada ou conjuntamente, as seguintes situações:
I - ausência de testemunhas;
II -falta de preservação do local
da ocorrência;
III - ocorrência em locais onde
não existam postos de trabalho fixos, tais como estradas e áreas rurais;
IV - participação determinante de
fatores socioambientais, tais como violência urbana ou fenômenos meteorológicos.
SEÇÃO III
DA AVALIAÇÃO DA PROVA PERICIAL EM
MATÉRIA DE ACIDENTE DO TRABALHO E DOENÇA OCUPACIONAL
Art. 11 - Considera-se agravo à
saúde: a lesão, a doença, o transtorno de saúde, o distúrbio, a disfunção ou a
síndrome de evolução aguda, subaguda ou crônica, de natureza clínica ou
subclínica, inclusive morte, independentemente do tempo de latência.
Art. 12 - Na avaliação da
incapacidade poderão ser utilizados, de forma conjugada, a Classificação
Internacional de Doenças (CID-10) e outros documentos nacionais ou
internacionais de reconhecida idoneidade e qualificação técnico-científica para
este fim, devendo o perito definir se a incapacidade é parcial ou total,
permanente ou provisória.
Parágrafo Único - Se o perito
constatar a presença de fator não ocupacional, deverá detalhar o grau o
intensidade da contribuição desta para a incapacidade laboral.
CAPÍTULO II
DAS PROVIDÊNCIAS DECORRENTES DAS
PROVAS PERICIAIS
Art. 13 Caso pertinente, o
magistrado poderá enviar ofícios aos órgãos responsáveis pelo sistema legal de
segurança e saúde do trabalhador, para que seja garantida, integralmente, a
dignidade da pessoa, o que inclui a sua reabilitação física e profissional, bem
como o reordenação do ambiente do trabalho, de modo a eliminar os agentes
agressivos e, quando isto se revelar inviável, a neutralizá-los, além de outras
medidas.
Brasília, 25 de fevereiro de 2014.
Comitê Gestor Nacional do
Programa Trabalho Seguro
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