Foto: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho
'Terceirização
equivale a desigualdade', diz ministro do TST
Para juiz iniciativa fere
inclusive a Constituição. Professor da USP vê 'faces do século XIX' em
terceirização da própria instituição.
A reportagem é de Vitor Nuzzi
e publicada por Rede Brasil Atual – RBA, 07-11-2014.
Ao citar raízes históricas e
legais do desequilíbrio social no Brasil, o ministro Luiz Philippe Vieira de
Mello Filho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), criticou as
iniciativas de ampliar a terceirização, vendo inclusive afrontas à
Constituição. "Terceirização, para mim, equivale a uma palavra:
desigualdade", afirmou, durante seminário promovido por um escritório de
advocacia (LBS) em São Paulo.
O magistrado citou o artigo 3º da
Carta de 1988, que define como um dos objetivos da República "construir
uma sociedade livre, justa e solidária", para acrescentar que "uma
Constituição não pode ser entendida como mera declaração", mas como
resultado de uma decisão política, com uma proposta a ser perseguida.
O objetivo do encontro era
discutir a terceirização nas chamadas atividades-fim das empresas, questão que
tem sido sistematicamente barrada no TST e que chegou ao Supremo
Tribunal Federal (STF), causando preocupação no movimento sindical. Para
o ministro, há um estigma em relação à questão social que atinge inclusive o
Judiciário trabalhista. "De 43 (ano de promulgação da CLT) até hoje, o
estigma de ser um diploma anarquista propagou-se e gerou um estigma para a
própria Justiça do Trabalho. É difícil convencer que existe o Direito do
Trabalho para quem não milita nele." O juiz faz referência a críticas
contra a CLT "porque trazia a codificação do Direito social".
Além de perda de direitos, o
magistrado afirma que a terceirização provoca "perda da identidade
profissional do trabalhador". E Melo Filho dá como exemplo
terceirizados do próprio TST. "Eles não olham para nós, não têm
sentimento de identificação", diz. Para o juiz, terceirizar também
representa tirar da empresa "o que lhe é essencial, o risco".
Essa análise havia sido feita,
minutos antes, pelo professor Calixto Salomão Filho, da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo (USP). "Empresa implica risco.
O risco é exatamente o elemento que justifica a remuneração", afirmou.
"Ao contrário do que parece, a terceirização é extremamente deletéria
(para a empresa). A terceirizada se torna uma grande gestora de mão de obra,
casca sem realidade empresarial própria, contrata, descontrata." Para ele,
terceirizar significa perder o controle sobre a atividade-fim e sobre a
produção, desorganizando a empresa.
Assim como o juiz, o professor
também cita exemplos entre os próprios terceirizados da instituição. "Aqui
se sente na pele o que é a degradação do trabalho. Parecem faces do século 19,
lhes garanto que é muito impactante." Para ele, a empresa moderna deve
"se abrir" e reconhecer os vários interesses envolvidos, como os dos
funcionários e das comunidades onde atuam. E cita a legislação alemã, que prevê
participação dos trabalhadores nos conselhos de supervisão, com mais poderes
que os conselhos de administração no Brasil.
O ministro do TST cita
diferenças salariais entre bancários e funcionários de call center no
setor. E afirma que de 1995 a 2008 morreram 257 trabalhadores em decorrência de
acidentes na Petrobras, sendo 81% terceirizados. "E dizem que isso
é melhoria das condições sociais", ironiza. Ele também identifica os
contratos de terceirização como grande foco de corrupção na administração
pública. Na sua palestra, ele fez referência ainda ao jurista Fábio Konder
Comparato: "Quatro séculos de escravidão são difíceis de ser afastados
da ideias de uma sociedade".
A secretária de Relações do
Trabalho da CUT, Maria das Graças Costa, manifestou preocupação com a
análise da questão pelo STF. Mas ao citar iniciativas legais sobre
terceirização, como o Projeto de Lei 4.330, na Câmara, e o PLS 87, no Senado,
também vê problemas com a nova composição do Congresso, mais conservadora.
"É um ambiente muito difícil para fazer esse debate."
Melo Filho informou que o ministro Luiz
Fux, do Supremo, já se comprometeu a realizar uma audiência pública.
"Ouvimos também de alguns ministros, e isso é grave, que essa questão da
terceirização é corporativa." Para ele, talvez fosse necessário buscar uma
nova alternativa no Parlamento. "A democracia tem um aspecto muito
importante, que é o dia seguinte. O projeto (4.330) é ruim, parte de premissas
erradas. O que eles querem mesmo é se afastar do risco e da
responsabilidade." Em relação ao STF, o ministro afirmou que sua
expectativa "é que, obviamente, não se usurpe a competência do Tribunal
Superior do Trabalho".
Link: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/537212-terceirizacao-equivale-a-desigualdade-diz-ministro-do-tst
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