Estudo mostra
que o Aquífero Guarani está contaminado por agrotóxicos
O Aquífero Guarani, manancial subterrâneo de onde sai 100%
da água que abastece Ribeirão Preto, cidade do nordeste paulista localizada a
313 quilômetros da capital paulista, está ameaçado por herbicidas.
A conclusão vem de um estudo realizado a partir de um
monitoramento do Departamento de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Daerp) em
parceria com um grupo de pesquisadores, que encontrou duas amostras de água de
um poço artesiano na zona leste da cidade com traços de diurom e haxazinona,
componentes de defensivo utilizado na cultura da cana-de-açúcar.
No período, foram investigados cem poços do Daerp com
amostras colhidas a cada 15 dias. As concentrações do produto encontradas no
local foram de 0,2 picograma por litro – ou um trilionésimo de grama. O índice
fica muito abaixo do considerado perigoso para o consumo humano na Europa, que
é de 0,5 miligrama (milésimo de grama) por litro, mas, ainda assim, preocupa os
pesquisadores, que analisam como possível uma contaminação ainda maior.
No Brasil, não há níveis considerados inseguros para as
substâncias. Ainda assim, a presença do herbicida na zona leste – onde o
aquífero é menos profundo – acende a luz amarela para especialistas. Segundo
Cristina Paschoalato, professora da Unaerp que coordenou a pesquisa, o
resultado deve servir de alerta. “Não significa que a água está contaminada,
mas é preciso evitar a aplicação de herbicidas e pesticidas em áreas de recarga
do aquífero”, disse ela.
O monitoramento também encontrou sinais dos mesmos produtos
no Rio Pardo, considerado como alternativa para captação de água para a região
no longo prazo. “Isso mostra que, se a situação não for resolvida e a prevenção
feita de forma adequada, Ribeirão Preto pode sofrer perversamente, já que a
opção de abastecimento também será inviável se houver a contaminação”.
Aquífero ameaçado
O Sistema Aquífero Guarani, que faz parte da Bacia
Geológica Sedimentar do Paraná, cobre uma superfície de 1,2 milhão de
quilômetros quadrados, sendo 839., 8 mil no Brasil, 225,5 mil quilômetros na
Argentina, 71,7 mil no Paraguai e 58,5 mil no Uruguai. Com uma reserva de água
estimada em 46 mil quilômetros quadrados, a população atual em sua área de
ocorrência está em quase 30 milhões de habitantes, dos quais 600 mil em
Ribeirão Preto.
A água do SAG é de excelente qualidade em diversos locais,
principalmente nas áreas de afloramento e próximo a elas, onde é remota a
possibilidade de enriquecimento da água em sais e em outros compostos químicos.
É justamente o caso de Ribeirão, conhecida nacionalmente pela qualidade de sua
água.
Para o engenheiro químico Paulo Finotti, presidente da
Sociedade de Defesa Regional do Meio Ambiente (Soderma), Ribeirão corre o risco
de inviabilizar o uso da água do aquífero in natura. “A zona leste registra
plantações de cana em áreas coladas com lagos de água do aquífero. É um
processo de muitos anos, mas esses defensivos fatalmente chegarão ao aquífero,
o que poderá inviabilizar o consumo se nada for feito”, explica.
Já para Marcos Massoli, especialista que integrou o grupo
local de estudos sobre o aquífero, a construção de casas e condomínios na
cidade, liberada através de um projeto de lei do ex-vereador Silvio Martins
(PMDB) em 2005, é extremamente prejudicial à saúde do aquífero. “Prejudica
muito a impermeabilidade, o que atinge em cheio o Aquífero”, diz.
Captação
Outro problema que pode colocar em risco o abastecimento de
água de Ribeirão no médio prazo é a extração exagerada de água do manancial
subterrâneo. Se o mesmo ritmo de extração for mantido, o uso da água do
Aquífero Guarani pode se tornar inviável nos próximos 50 anos em Ribeirão
Preto.
A alternativa, além de reduzir a captação, pode ser
investir em estruturas de captação das águas de córregos e rios que, além de
não terem a mesma qualidade, precisam de investimentos significativamente
maiores para serem tratadas e tornadas potáveis. A perspectiva já é considerada
pelos estudiosos do chamado Projeto Guarani, que envolveu quatro países com
território sobre o reservatório subterrâneo. O cálculo final foi entregue no
fim do ano.
O mapeamento mostrou que a velocidade do fluxo de água
absorvida pela reserva é mais lenta do que se supunha. Pelas contas dos
especialistas, a cidade extrai 4% mais do que poderia do manancial. A média de
consumo diário de água em Ribeirão é de 400 litros por habitante, bem acima dos
250 litros da média nacional. Por hora, a cidade tira do aquífero 16 mil litros
de água. Vale lembrar que a maior parcela de água doce do mundo, algo em torno
de 70%, está localizada, em forma de gelo, nas calotas polares e em regiões
montanhosas.
Outros 29% estão em mananciais subterrâneos, enquanto rios
e lagos não concentram sequer 1% do total. Entretanto, em se tratando da água
potável, aproximadamente 98% se encontram no subsolo, sendo o Aquífero Guarani
a maior delas. A alternativa para não desperdiçar esses recursos é investir em
reflorestamento para garantir a recarga do aquífero, diz o secretário-geral do
projeto, Luiz Amore.
EcoDebate,
19/05/2011
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