''Devemos dizer não ao modelo baseado no capital e
na produção.'' O discurso do Papa Francisco em Turim
Publicamos abaixo amplos trechos do
discurso do Papa Francisco aos desempregados, trabalhadores e
empresários proferidos nesse domingo, em Turim, na Itália.
O texto foi publicado no jornal La
Stampa, 22-06-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Saúdo a todos vocês, trabalhadores,
empresários, autoridades, jovens e famílias presentes neste encontro e lhes
agradeço pelos seus discursos, do qual surge o senso de responsabilidade diante
dos problemas causados pela crise econômica e por terem testemunhado que a fé
no Senhor e a unidade da família lhes são de grande ajuda e apoio.
A minha visita a Turim inicia
com vocês. E, acima de tudo, expresso a minha proximidade aos jovens
desempregados, aos beneficiários e às pessoas em trabalho precário; mas também
aos empresários, aos artesãos e a todos os trabalhadores dos vários setores, em
particular aos que sofrem mais para seguir em frente.
O trabalho não é necessário apenas
para a economia, mas para a pessoa humana, para a sua dignidade, para a sua
cidadania e também para a inclusão social. Turim é historicamente um
polo de atração do trabalho, mas hoje está fortemente afetada pela crise: o
trabalho falta, aumentaram as desigualdades econômicas e sociais, muitas
pessoas empobreceram e têm problemas com a casa, a saúde, a educação e outros
bens primários.
A imigração aumenta a competição, mas
os imigrantes não devem ser culpabilizados, porque eles são vítimas da
iniquidade, dessa economia que descarta e das guerras. Faz chorar ver o
espetáculo destes dias, em que seres humanos são tratados como mercadorias!
Nessa situação, somos chamados a
reafirmar o "não" a uma economia do descarte, que pede para nos
resignarmos à exclusão daqueles que vivem em pobreza absoluta – em Turim,
cerca de um décimo da população. Excluem-se as crianças (natalidade zero!),
excluem-se os idosos e agora excluem-se os jovens (mais de 40% de jovens
desempregados)! Quem não produz é excluído, do modo "usa e joga
fora".
Somos chamados a reafirmar o
"não" à idolatria do dinheiro, que leva a entrar a todo o custo no
número dos poucos que, apesar da crise, enriquecem, sem cuidar dos muitos que
empobrecem, às vezes até a fome.
Somos chamados a dizer
"não" à corrupção, tão difundida que parece ser uma atitude, um
comportamento normal. Mas não em palavras, com os fatos. "Não" aos
conluios mafiosos, às fraudes, aos suborno e coisas desse tipo.
E só assim, unindo as forças, podemos
dizer "não" à iniquidade que gera violência. Dom Bosco nos
ensina que o melhor método é o preventivo: o conflito social também deve ser
evitado, e isso se faz com a justiça.
Nessa situação, que não é só
turinense, italiana, é global e complexa, não se pode apenas esperar a
"retomada" – "esperemos a retomada...". O trabalho é
fundamental – a Constituição italiana declara isso desde o início –, e é
necessário que a sociedade inteira, em todas as suas componentes, colabore para
que ele exista para todos e seja um trabalho digno do homem e da mulher. Isso
requer um modelo econômico que não seja organizado em função do capital e da
produção, mas em função do bem comum.
E, a propósito das mulheres – você (a
trabalhadora que havia discursado) falou disso –, os seus direitos devem ser
protegidos com força, porque as mulheres, que também carregam o maior peso no
cuidado da casa, dos filhos e dos idosos, ainda são discriminadas, também no
trabalho.
É um desafio muito comprometedor, que
deve ser enfrentado com solidariedade e olhar amplo. E Turim é chamada a
ser, mais uma vez, protagonista de uma nova era de desenvolvimento econômico e
social, com a sua tradição manufatureira e artesanal – pensemos, no relato
bíblico, que Deus fez justamente o artesão... Vocês são chamados a isto:
manufatureira e artesanal – e, ao mesmo tempo, com a pesquisa e a inovação.
Por isso, é preciso investir com
coragem na formação, tentando inverter a tendência que viu cair nos últimos
tempos o nível médio de instrução e muitos jovens abandonarem a escola. Você
(ainda a trabalhadora) ia para a escola à noite, para poder ir em frente...
Hoje, eu gostaria de unir a minha voz
à de muitos trabalhadores e empresários para pedir que possa ser implementado
também um "pacto social e geracional". [...]
Gostei muito que vocês três falaram
da família, dos filhos e dos avós. Não se esqueçam dessa riqueza! Os filhos são
a promessa a ser levada adiante: esse trabalho que vocês assinalaram, que vocês
receberam dos seus antepassados. E os idosos são a riqueza da memória.
Uma crise não pode ser superada, nós
não podemos sair da crise sem os jovens, os meninos, os filhos e os avós. Força
para o futuro e memória do passado que nos indica aonde se deve ir. Não ignorem
isso, por favor. Os filhos e os avós são a riqueza e a promessa de um povo.
Em Turim e no seu território,
ainda existem notáveis potencialidades para se investir para a criação de
trabalho: a assistência é necessária, mas não basta: é preciso promoção, que
regenere a confiança no futuro. Aqui estão algumas coisas principais que eu
gostaria de lhes dizer.
Acrescento uma palavra que eu não
gostaria que fosse retórica, por favor: coragem! Isso não significa: paciência,
resignem-se. Não, não, não significa isso. Mas, ao contrário, significa: ousem,
sejam corajosos, vão em frente, sejam criativos, sejam "artesãos"
todos os dias, artesãos do futuro! Com a força daquela esperança que o Senhor
nos dá e nunca desilude. Mas que também precisa do nosso trabalho.
Por isso, eu rezo e acompanho vocês
com todo o coração. O Senhor abençoe a todos vocês, e Nossa Senhora os proteja.
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