Sociólogo diz que sociedade está
‘enfeitiçada’ pela mídia: ‘Só as versões são realidade’
Laymert: “Edward
Snowden e Julian Assange entenderam que o poder está na informação que está
oculta” | Foto:
(Wilson Dias/Agência Brasil)
(Wilson Dias/Agência Brasil)
Eduardo Maretti
Da RBA
Da RBA
Em debate realizado
pelo Fórum 21 nesta quinta-feira (12), na série “Seminários para o Avanço
Social”, o sociólogo Laymert Garcia dos Santos, da Unicamp, e doutor em
Ciências da Informação pela Universidade de Paris VII, afirmou que a realidade
atual, com o monopólio da informação pela mídia tradicional, é “desesperadora”.
Para ele, a sociedade está “enfeitiçada” pela manipulação. “Só as versões se
tornam realidade, ao ponto de as pessoas não saberem mais o que é real e o que
não é.”
Segundo Laymert,
exemplo esclarecedor a respeito é a operação midiática de transformar a
presidenta Dilma Rousseff no objeto de ataques sistemáticos e culpada de tudo o
que de ruim acontece ou pode acontecer no país. A operação, lembra, começou na
Copa do Mundo de 2014. “Trinta ou quarenta mil pessoas na Avenida Paulista
(manifestação da esquerda em 13 de março de 2015) debaixo de chuva não é
notícia. Porque para os meios de comunicação é preciso manter no ar a ideia do
golpe. É preciso manter no ar permanentemente alguma coisa.”
O sociólogo lembra
que o início da deslegitimação de Dilma, na Copa, partiu do camarote do Banco
Itaú no estádio, onde estava a colunista Sonia Racy. “Não foi à toa que foi
escolhido esse local.” Na ocasião da abertura da Copa, no Itaquerão, em São
Paulo, o blogueiro Luiz Carlos Azenha registrou em seu blog: “Uma importante
colunista social do Estadão, sentada no camarote do Banco Itaú, gritou a plenos
pulmões – aparentemente entusiasmada – ‘Ei, Dilma, VTNC’”.
Diante da
sistemática ofensiva do oligopólio de comunicação, “não existe mais” cobertura
(jornalística), no sentido de processar informações reais. “A mídia é parte
ativa na criação de versões e ficções sobre o que acontece. O que é de fato
real soçobra.”
Entre os veículos
de comunicação que fazem parte da campanha contra o governo petista de Dilma
Rousseff, Laymert considera a Folha de S. Paulo o mais sofisticado e eficiente
na construção do discurso da negatividade. “A Folha é a mais elaborada, porque
eles estão há mais de 30 anos elaborando o discurso do ressentimento. Sempre,
em qualquer momento em que há uma positividade, o discurso é negativo. Se a
notícia é boa, existe o recurso: ‘mas…’”
A operação que se
desenvolveu nos últimos meses para proteger o presidente da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que poderia ser o condutor do impeachment
desejado pela direita do país, para o sociólogo, é absurda. “Ele (Cunha) está
apodrecendo todos os dias e não cai. Como é possível construir essas redes de
proteção? Os ladrões estão gritando ‘pega ladrão’ para quem não é ladrão.”
O grande problema,
para Laymert, é que “o outro lado não consiga responder”. Segundo a análise,
“estamos vivendo um fenômeno complicado para o qual a esquerda não tem
respostas”. Ele diz que desde os anos 1980 observa a dificuldade da esquerda em
compreender a questão midiática. Um dos principais erros de líderes petistas
foi acreditar que, quando o PT chegasse ao poder, haveria uma “troca de sinal” e
os meios de comunicação passariam a ser mais benevolentes com os esquerdistas.
Mas o que se viu foi o contrário. “Uma vez no poder, a esquerda tem uma atitude
ao mesmo tempo de submissão e fascínio pelos meios de comunicação.”
Snowden e Assange
Laymert acredita
que nem mesmo setores da mídia de esquerda, como os chamados “blogueiros
sujos”, entendem o processo midiático atual. “Os ‘blogueiros sujos’ não
entendem, embora estejam mais perto de entender, que a política hoje não é mais
a política, mas a tecnopolítica. Quem entendeu isso foram homens como Julian
Assange (do Wikileaks) e Edward Snowden”, disse o professor da Unicamp.
Ex-funcionário da agência de inteligência americana, a NSA, Snowden tornou
público que o governo dos Estados Unidos opera um sistema de vigilância que
abrange cidadãos e governos em todos os lugares do mundo que lhe interessem.
“Há uma dimensão
totalitária quanto à linguagem e a instrumentalização da linguagem política.
Não vejo como a esquerda possa reagir diante dessa ofensiva totalitária da
mídia”, diz Laymert. “Snowden e Assange entenderam que o poder está na
informação. Mais do que isso, entenderam que, ao contrário do Facebook, que
fornece mais do mesmo e satisfaz o narcisismo das pessoas, o que importa é a
informação que não se vê, que está oculta. No mundo atual, a informação real é
a que não é exposta.”
O último debate da
série promovida pelo Fórum 21 será realizado nesta sexta-feira (13), às 9h, na
Assembleia Legislativa, com o tema “Impeachment e golpe”, com a participação do
ex-candidato ao governo de São Paulo pelo Psol, em 2014, Gilberto Maringoni.
Tags: Governo, Laymert Garcia
dos Santos, mídia, sociedade
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