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Não vou ficar
preso ao passado, diz presidente colombiano
Em entrevista à BBC, Juan Manuel
Santos voltou a destacar a importância de se estabelecer a paz com as Farc
Santos disse que reeleição é prova de que a maioria
na Colômbia quer continuação do processo de paz
Foto: AP
Um dia após sua reeleição como
presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos recebeu a BBC Mundo. Sua satisfação
era visível, assim como seu cansaço.
Vinha de uma entrevista coletiva no
qual reafirmou que o êxito do processo de paz com a guerrilha das Farc será
prioridade de seu segundo mandato.
Santos usou também o tom conciliador
que começou a empregar desde o seu discurso de vitória, quando convidou seu
rival Oscar Iván Zuluaga e todos os seus partidários a trabalharem juntos para
a paz na Colômbia - uma grande diferença em relação à campanha eleitoral.
Veja abaixo a entrevista.
BBC Mundo: Como o sr. vê a sua vitória? As coisas mudaram
muito entre o primeiro e o segundo turno e as personalidades de esquerda
parecem ter sido importantes. Foi uma vitória de Juan Manuel Santos ou uma
vitória do 'sonho da paz' (slogan da campanha de Santos)?
Santos: Dos dois. Mas acredito que o mandato que recebemos
foi um mandato muito claro: a Colômbia tem que continuar em seu processo de paz
e terminá-lo com êxito e continuar com as políticas que temos adiantado nas
áreas de economia e progresso social. Em ambos (os temas) acredito que
recebemos um sinal claro de "continuem aí" porque é disso que o povo
colombiano precisa: paz com progresso social.
BBC Mundo: Pode-se ver a vitória como uma aprovação ao
seu governo, quando, na verdade, o que parece ter inclinado a balança a seu
favor foi um tema específico - o processo de paz?
Santos: Cada um tem uma interpretação diferente. O
que nós interpretamos é que, quando começamos a dar muito mais informação sobre
nossos resultados na área social, em matéria de educação, em matéria de luta
contra a pobreza, em matéria de geração de emprego, nos demos conta de que
mudar de caminho, mudar de capitão neste momento, não era mais desejável. E por
isso (a população) nos deu seu apoio.
BBC Mundo: Ajude-me a entender um pouco a Colômbia
politicamente. Quando o sr. foi eleito há quatro anos, uma das primeiras
pessoas a celebrar foi o presidente Álvaro Uribe. Ontem, ele agredeceu aos
eleitores e representantes da esquerda. O que mudou mais nestes quatro anos: a
Colômbia, o sr. ou Uribe?
Santos: Veja, há quatro anos eu disse que iria
continuar com a segurança democrática, mas que teríamos que sair do tema da
segurança porque este país precisava dar muita importância à parte social. E
por isso chamei de "prosperidade democrática". Disse: "vamos passar
de segurança democrática à prosperidade democrática, sem descuidar do tema de
segurança".
Meu governo tem sido o mais duro com
os grupos às margens da lei, muito mais que os governos anteriores. Mas sim,
nós ampliamos o leque de temas na agenda para que a parte social, a luta contra
a pobreza, a geração de emprego, a formalização da economia, tenham cada vez
mais importância.
O que aconteceu? O uribismo ficou
preso ao passado, ficou preso somente à segurança democrática. E eu não estava
disposto a ficar preso ao passado. Este país tem que avançar e tem avançado,
muito positivamente.
Você vê os resultados: nós somos
atualmente uma das estrelas econômicas e, do ponto de vista do desempenho
social, eu creio que também tem sido positivo. E por isso houve essa mudança no
espectro político: porque alguns ficaram presos ao passado e eu não estou
disposto a ficar preso ao passado. Acredito que é preciso seguir rumo ao
futuro.
BBC Mundo: E como a Colômbia mudou? O sr. acredita que o
país está mais tolerante ou mais dividido?
Santos: Veja, a Colômbia hoje é uma democracia muito
mais forte, é uma democracia com muito mais reconhecimento internacional, é uma
democracia muito mais respeitada e é uma democracia muito mais eficiente.
Veja os indicadores econômicos e teremos
a economia mais sólida da nossa história, a economia mais dinâmica de toda a
América Latina, a economia que está produzindo resultados sociais como nenhuma
outra economia da América Latina. E está começando pela primeira vez a reduzir
a diferença, porque nós éramos - e ainda somos - um país muito desigual,
extremamente desigual. Eu acredito que hoje somos, sem dúvida, um país muito
melhor do que éramos há quatro anos.
Infelizmente, há uma polarização em
torno da questão da paz, mas acredito que, na medida em que possamos convencer
os que estão ou votaram contra essa paz - eu diria que por desinformação, por
dar atenção a essa propaganda suja que foi feita durante meses, eu diria que
anos, contra o processo de paz - à medida que explicamos os benefícios da paz,
e que não estamos negociando aspectos fundamentais da nossa institucionalidade
- porque não estamos negociando -, do nosso modelo econômico, eles vão entender
e apoiar esse processo de paz.
Te digo hoje o que vai acontecer: em
pouco tempo você verá o país inteiro apoiando este processo de paz.
BBC Mundo: E o sr. acredita que esta "propaganda
suja" vai desaparecer?
Santos: Não, mas na medida em que formos mais eficientes
em falar sobre os benefícios da paz, as pessoas vão se convencer de que vale a
pena, sim.
BBC Mundo: E como o sr. vê o papel do ex-presidente
Uribe? O sr. acredita que ele será, junto com a bancada dele, uma pedra no
sapato para os interesses do seu governo ou somente ao processo de paz?
Santos: O que eu espero é que façam oposição, porque
isso é bom para qualquer democracia, para qualquer governo, mas que a façam
jogando limpo, que a façam com as verdades e com os dados reais em mãos, não
com mentiras. Se fizerem isso, sairemos todos ganhando.
BBC Mundo: O sr. se sente mais livre agora do que em seu
primeiro mandato? Sem dever nada a Uribe, com os partidos de esquerda que o
apoiaram anunciando que seguem se considerando oposição, sem ter que calcular
pensando na reeleição...
Santos: Eu sempre me senti livre. Nunca deixei de
fazer o que acredito ser conveniente e necessário para o meu país. Se você
considerar os resultados destes quatro anos de governo, perceberá que foi um
governo muito eficiente, com resultados que muitas vezes não imaginamos serem
possíveis, e eu, claro, vou continuar perseguindo estes objetivos.
Primeiro, o da paz. Mas também o do
progresso social, redução das desigualdades... Isso é o que qualquer governante
responsável deve buscar. E para fazê-lo precisa-se buscar as coalizões no
Congresso que permitam a continuidade de uma agenda reformista. Não havia um
governo tão reformista nos últimos não sei quantos anos, cem anos.
BBC Mundo: E o que acontecerá se o processo de paz
fracassar? O quanto a Colômbia retrocederá?
Santos: Seria muito triste não aproveitar esta única
e última oportunidade. Mas continuaríamos vivendo como nos últimos 50 anos: um
país que avança, mas que mantém uma guerra absurda, cujo custo também é
absurdo.
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